Título: Tarifa de importação gera divisão entre ministérios
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 08/01/2008, Brasil, p. A5

Samuel Pinheiro Guimarães, secretário-geral do Itamaraty: medida entra em conflito com Mercosul e OMC O Ministério da Fazenda atropelou os outros órgãos do governo integrantes da Câmara de Comércio Exterior (Camex) e desrespeitou as regras do Mercosul e acordos do país na Organização Mundial do Comércio (OMC) no pacote de medidas anunciado na semana passada, ao determinar a mudança unilateral nas tarifas de importação de produtos como bebidas, plástico, borracha, têxteis e confecções. O alerta foi levado ao próprio ministério e ao Palácio do Planalto pelos ministérios das Relações Exteriores e do Desenvolvimento, que pediram a revisão da medida.

Na MP 413, o governo determinou a substituição das atuais tarifas de importação em 11 diferentes tipos de produtos por uma alíquota específica de R$ 10,00 por quilo ou unidade de medida da mercadoria. Com a alteração, contrariou a orientação dos negociadores brasileiros na OMC, além de romper acordos firmados pelo país - o Brasil comprometeu-se a aplicar no máximo 35% como alíquota do imposto de importação.

Em casos como tecidos e vinho, a aplicação da tarifa específica de R$ 10,00 representaria o equivalente a tarifas percentuais de até 750% e 1.400 %, respectivamente, como noticiou ontem o Valor. Além de ultrapassar o limite fixado pelo país na OMC para tarifas de importação, a medida ignorou os vínculos do Brasil com os sócios do Mercosul, comprometidos em manter a Tarifa Externa Comum (TEC) - o que exige negociar as exceções à lista comum de alíquotas de imposto de importação.

Com os ministros de Relações Exteriores e Desenvolvimento em viagem, coube aos secretários-executivos dos ministérios levantarem, no governo, as restrições à medida anunciada sem a consulta à Camex - órgão do governo encarregado das definições na área de comércio exterior.

Na sexta-feira, o secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, enviou ao Planalto uma "informação" notificando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva que a tarifa específica ditada pela Fazenda contraria os compromissos do Mercosul e está em conflito com as negociações na OMC. Ontem, o secretário-executivo do Desenvolvimento, Ivan Ramalho, reuniu-se com o Ministério da Fazenda.

A Receita Federal defende a medida, também reivindicada pelos empresários ameaçados pelo forte influxo de importações provenientes da China e outros países asiáticos. Segundo o secretário-adjunto da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, a medida serviria apenas como "salvaguarda" a ser usada por algum setor afetado por subfaturamento de importações.

O argumento é rejeitado no restante da Esplanada dos Ministérios, onde se lembra que há instrumentos internacionais já aprovados e aceitos para esse tipo de tarefa, como o Código de Valoração Aduaneira, o acordo antidumping, o Acordo de Subsídios e Direitos Compensatórios e o Acordo de Salvaguardas, previstos pela OMC e usados pelo Brasil.

Para os outros ministérios da Camex, a alternativa encontrada pela Receita, além de criar conflitos sérios com os sócios no Mercosul, enfraquece os negociadores brasileiros na OMC, porque está na "contramão" dos argumentos usados pelo Brasil nas negociações da Rodada Doha. Uma das principais bandeiras do G-20, grupo liderado pelo Brasil, é a transformação das tarifas específicas em tarifas ad valorem (percentuais sobre valor da importação), mais transparentes.