Título: Lula pede medidas para conter alta do real
Autor: Safatle , Claudia
Fonte: Valor Econômico, 11/03/2008, Brasil, p. A3

Preocupado com a trajetória das transações correntes do balanço de pagamentos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva autorizou, e a área econômica está montando, um conjunto de medidas que podem ser divulgadas ainda esta semana para conter a valorização da taxa de câmbio e, com isso, tentar reduzir a velocidade com que a importação cresce e, ao mesmo tempo, reduzir custos do exportador.

Na mesa de discussão do Ministério da Fazenda e do Banco Central estão um leque de alternativas, e entre elas algumas das mais cotadas são: acabar com a exigência de cobertura cambial das exportações; repor a tributação sobre os investidores estrangeiros que aplicam em títulos da dívida pública, desde 2006 isentos do Imposto de Renda de 15%; e fazer nova rodada de limpeza nas regras do mercado de câmbio, pelas quais, para fechar um contrato de câmbio de importação, por exemplo, a empresa tem que passar por um banco, e isso tem um custo.

O governo poderá simplesmente restabelecer o IR de 15% ou taxar o investidor externo com o IOF na operação de câmbio. Isso ainda não está decidido. Em 2006, o Banco Central reduziu a exigência de cobertura cambial de 100% para 70% das exportações, deixando que o exportador mantivesse 30% das receitas de exportação fora do país. A idéia, agora, é eliminar essa exigência que vem da época de Getúlio Vargas (desde 1933), permitindo às empresas manter os dólares fora do país, evitando, assim, que as receitas do comércio exterior ingressem no mercado e ajudem a valorizar cada dia mais o real frente ao dólar.

Também em 2006 o governo isentou os investidores estrangeiros da cobrança, no ato do resgate, de 15% de IR sobre ganhos de capital decorrentes das aplicações em títulos da dívida pública. Com esse incentivo, o estoque de dívida nas mãos de estrangeiros saiu de cerca de R$ 7 bilhões, em 2006, para R$ 57,691 bilhões em dezembro de 2007, conforme dados oficiais. Hoje, 4,71% da dívida interna está nas mãos de não-residentes.

Essas iniciativas vêm sendo discutidas no governo e começaram a tomar forma na reunião que Lula teve semana passada com os economistas Luiz Gonzaga Belluzzo e o ex-ministro Delfim Netto, o senador do PT paulista, Aloizio Mercadante, além do ministro da Fazenda, Guido Mantega e do presidente do BC, Henrique Meirelles.

Na ocasião, Lula presenciou debate sobre os riscos que o crescimento de mais de 5% ao ano, associado à valorização da taxa de câmbio, podem trazer para a dinâmica das contas externas. Ouviu alerta dos economistas de que ele poderá conduzir sua sucessão, em 2010, em meio a um processo de crescente déficit em conta corrente, reeditando a vulnerabilidade externa que o país viveu nas últimas décadas e que estava praticamente equacionada na sua gestão.

Não há garantia de que tais medidas produzam os efeitos que o governo deseja no câmbio e no comércio exterior. Um dos argumentos para aprovar a isenção dos estrangeiros nas aplicações em títulos públicos era que os não-residentes já aplicavam em derivativos, mediante contratos 'off-shore', oferecidos pelos bancos, em títulos brasileiros. Como os bancos não pagavam o IR de 15% sobre essa carteira, repartiam a vantagem tributária com os clientes.

A permissão para que os exportadores deixem seus dólares fora do país é uma medida de simplificação e de redução de custos bem-vinda, mas não é certo que os empresários que exportam vão deixar o dinheiro fora do país, perdendo os ganhos que podem ter com as taxas de juros internas ainda bastante elevadas.

São, porém, medidas que sinalizam que o governo está preocupado e que pretende impor algum risco aos investidores que buscam os ganhos de arbitragem, até que os juros possam cair para patamares mais próximos das taxas internacionais.