Título: Waldomiro afeta imagem do PT e disputa pelo poder
Autor: Maria Lúcia Delgado e Juliano Basile
Fonte: Valor Econômico, 11/02/2005, Política, p. A6

O governo e o PT continuam a minimizar os efeitos políticos do caso Waldomiro Diniz, mas a denúncia de corrupção envolvendo o ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil, que estourou no carnaval de 2004 e completa um ano neste domingo, ainda provoca incômodo em aliados, fornece munição aos oposicionistas, e revela debates inconclusos, como a legalização do jogo do bicho no país, a definição de critérios transparentes sobre a liberação de emendas parlamentares, e a dificuldade de estabelecer rígidos códigos de conduta para servidores que ocupam os chamados "cargos comissionados, ou de confiança". Ao anunciar ontem o calendário das atividades do partido em seu 25º aniversário, o presidente do PT, José Genoino Neto, disse que o assunto hoje é ignorado dentro do partido mas reforçou uma atitude de cautela desde então. "Não temos o patrimônio da perfeição, mas não hesitamos em tomar as medidas concretas diante do caso concreto", disse o dirigente. Sob reserva, contudo, integrantes do governo federal avaliam que o caso deixou seqüelas. "O grande estrago do governo nesses dois anos foi o caso Waldomiro. Não pelo que produziu em si, mas pela fragilização do José Dirceu", confessou ao Valor um integrante da cúpula governista. "O episódio nos tirou umas cem prefeituras no mínimo. O PFL e o PSDB souberam sangrar o governo. Ficamos atordoados uns três, quatro meses", disse o deputado Carlito Merss (PT-SC), da Comissão Mista de Orçamento. A principal função de Waldomiro era acompanhar a liberação de emendas parlamentares. O enfraquecimento político do ministro-chefe da Casa Civil foi uma das conseqüências imediatas do caso. Waldomiro Diniz era subordinado de Dirceu e velho conhecido do PT. Para a oposição, além de abalar temporariamente o poder do ministro e forçar uma mudança drástica na articulação política, o caso Waldomiro destruiu a aura ética do governo petista, que não mediu esforços para impedir a instalação de uma CPI no Congresso. "É como um pai conservador que constatou a perda de virgindade da filha. Houve uma queda da autoridade moral do PT. O maior dano para o governo foi de imagem", disse o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio Neto (AM). A denúncia que abalou o governo, divulgada pela revista "Época", era uma fita de vídeo mostrando encontro entre o bicheiro Carlos Cachoeira e o ex-subchefe da Casa Civil. Waldomiro, que na ocasião presidia a Loterj (estatal responsável pelas loterias no Rio de Janeiro), pedia propina ao bicheiro - para campanhas eleitorais e si próprio - e, em troca, facilitaria a participação de Cachoeira numa concorrência pública. Dirceu não se manifestou sobre o caso, ao ser procurado pelo Valor. "O governo fez a sua parte, fez o que devia ter feito", limitou-se a comentar o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, que assumiu dias antes de estourar o escândalo e passou a ser o chefe imediato de Waldomiro. Em nota, a Casa Civil enumerou uma série de providências tomadas pelo governo após o escândalo. Waldomiro, que foi exonerado do cargo no dia 13 de fevereiro passado, a pedido do próprio, responde atualmente a dezenas de processos na Justiça, inclusive por improbidade administrativa. O governo lembra que instalou comissão de sindicância para investigar a atuação de seu funcionário. O relatório da comissão concluiu que há indícios de que Waldomiro valeu-se do cargo em proveito próprio. Esse trabalho fundamentou a ação da Advocacia-Geral da União (AGU). Waldomiro, como funcionário do Planalto, insinuou que poderia interferir na renegociação de um contrato com a GTech junto à Caixa Econômica Federal. A GTech é uma empresa que fornece tecnologia para sistemas de loterias. Para a AGU, Waldomiro feriu a Lei de Improbidade e o Código de Conduta Ética dos Agentes Públicos. Se condenado, pode ter suspensos os direitos políticos por um período de três a cinco anos, pagar multa e ficar impedido de contratar com o Poder Público ou de receber incentivos fiscais, caso monte uma empresa ou se torne sócio majoritário de um negócio. Existem outras duas ações contra Waldomiro na Justiça Federal de Brasília, movidas pelo Ministério Público. Ambas aguardam a conclusão de inquérito pela Polícia Federal. No Rio, o Ministério Público Estadual ingressou com 20 ações por improbidade administrativa contra a Loterj, seus dirigentes, e mais 43 entidades. Para o servidor Amarildo Baesso, que na época presidiu a Comissão de Sindicância, a investigação cumpriu seu papel. "Não cabia à comissão investigar a vida do Waldomiro Diniz. Investigamos os atos do servidor. Neste sentido, acho que foi um trabalho exaustivo que apontou tudo o que aconteceu. Os desdobramentos dependem de outras áreas do governo", concluiu. O advogado de Waldomiro Diniz, Luiz Guilherme não retornou a ligação da reportagem. O ex-servidor também evita a imprensa. Parlamentares que tiveram contato próximo a Waldomiro Diniz dizem que há meses não têm notícias dele. Em Brasília, Waldomiro evita repórteres e não dá declarações. O episódio levou o governo a tentar, abruptamente, fechar todas as casas de bingo do país por medida provisória. Rejeitada no Senado, a MP foi arquivada. "A única coisa que aconteceu foi o solavanco no tamanho do poder exercido por José Dirceu. O governo não aplicou punições exemplares, não adotou medidas drásticas, não deu o exemplo. Só uma CPI teria aberto as entranhas do Palácio do Planalto e mostrado tudo de ruim", criticou o líder do PFL no Senado, José Agripino Maia (RN). Para o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), o caso Waldomiro selou a perda da ética pelo PT. "A CPI é direito universal e sagrado das minorias", disse. A oposição conseguiu as assinaturas para instalar a CPI, mas o governo não indicou os membros. O caso está sob análise do Supremo Tribunal Federal. (Colaborou César Felício, de São Paulo)