Título: PIB de 2007 consolida ciclo sustentado
Autor: Lamucci,Sergio ;Bouças , Cibelle
Fonte: Valor Econômico, 13/03/2008, Brasil, p. A12

O bom desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) no ano passado confirma a sustentabilidade do ciclo de crescimento iniciado em 2004. Com forte alta do investimento e do consumo das famílias, a economia cresce com mais distribuição de renda, amparada pela solidez das contas externas e por uma situação fiscal bem mais favorável, dois fatores ausentes no período de 1993 a 1997, que levaram à interrupção abrupta do ciclo no ano seguinte. Para completar, o cenário externo foi extremamente positivo nos últimos cinco anos, jogando para a estratosfera os preços das commodities exportadas pelo Brasil. Entre 2004 e 2007, o país cresceu a uma média de 4,53%, com o PIB per capita avançando 3,05% no período.

Para o economista Celso Toledo, o desempenho recente indica que o país entrou numa fase em que o PIB deve crescer a taxas mais elevadas, e com oscilações menores do que no passado. A opinião é compartilhada por Ernani Torres, superintendente da área de planejamento e acompanhamento econômico do BNDES. Ele observa que a economia cresce sem interrupções há 24 trimestres, a trajetória mais longa desde a década de 70. "Investimentos em infra-estrutura e áreas básicas e a expansão do consumo dão ao país condições de crescer de 5% a 6% ao ano nos próximos quatro anos", afirma Torres. Ele também acredita que o avanço dos investimentos em formação de capital fixo garantirão a expansão do setor produtivo, impedindo uma pressão inflacionária mais forte no curto prazo. "O que vejo é um ciclo de crescimento mais forte e mais estruturado."

A expansão do investimento a taxas robustas - 13,4% em 2007 e 10% em 2006- é um sinal positivo, por indicar que está em curso a ampliação da capacidade produtiva, destaca o economista Bráulio Borges, da LCA Consultores.

Toledo também destaca a alta do investimento, atribuindo esse desempenho a uma série de mudanças iniciadas no começo da década anterior: a abertura da economia no início dos anos 90, a estabilização promovida pelo Real, a adoção do câmbio flutuante em 1999 e o fim do temor de que um governo do PT levasse a uma ruptura na política econômica.

Como pano de fundo nos últimos anos, uma economia global inacreditavelmente pujante, que permitiu ao país superar a vulnerabilidade externa e reverter os desequilíbrios graves em conta corrente (a balança comercial, a de serviços e as transferências unilaterais). "O investimento forte hoje é reflexo de tudo isso", diz Toledo, lembrando que a economia se tornou mais estável, as perspectivas de crescimento melhoraram e as contas externas são mais sólidas.

Para Borges, da LCA, a mudança fundamental ocorreu em 1999, com a adoção do tripé formado pelo câmbio flutuante, o regime de metas de inflação e os superávits fiscais voltados para estancar a expansão da dívida pública. "Em meados dos anos 90, o país não tinha nada disso. O câmbio era fixo, a vulnerabilidade externa era elevadíssima e havia uma frouxidão fiscal, um arranjo insustentável."

"O Brasil apresentava um déficit nas transações correntes de US$ 20 bilhões a US$ 30 bilhões por ano. O equilíbrio fiscal era precário e o regime de câmbio fixo não ajudava muito. Hoje, com outros fundamentos, há condições de o país repetir ou até elevar o crescimento do PIB", afirma Salomão Quadros, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

De 1993 a 1995, o investimento cresceu a taxas robustas. Em 1994, a expansão chegou a 14,3%, mas em cima de uma base muito fraca. Entre 1990 e 1992, no governo Collor, a formação bruta de capital fixo (FBCF, que mede o investimento na construção civil e em máquinas e equipamentos) caiu 23,8%. Desta vez, o ciclo parece mais sustentável, e tudo indica que a FBCF deve crescer muito também em 2008. "A diferença do ciclo atual para os anteriores é que agora há uma convergência de investimento, crescimento do consumo e balança comercial. Nos ciclos anteriores, sempre faltou um aspecto, tornando-os mais vulneráveis", afirma Fernando Montero, economista-chefe da Convenção Corretora.

Borges também destaca o consumo das famílias, que subiu 6,5% em 2007. É menos que os 8,6% de 1995, no auge do Plano Real, mas ainda assim um ritmo expressivo. O economista observa que o aumento de renda e emprego, somado à consolidação da estabilidade, tem feito as operações de empréstimos e financiamentos crescerem mais de 20% ao ano. Ainda que se possa discutir o efeito fiscal de medidas como o aumento do salário mínimo, elas tiveram impacto indiscutível na melhora da distribuição de renda e no consumo.

Com isso, a demanda doméstica avança com força. No ano passado, ela foi responsável por 6,9 pontos percentuais do crescimento de 5,4% do PIB - o setor externo contribuiu negativamente com 1,4 ponto, uma vez que as importações crescem acima das exportações. Em 1995, o setor externo "roubou" 3 pontos de alta do PIB, num momento em que o rombo nas contas externas aumentava muito. Naquele ano, o PIB cresceu 4,2%, com a demanda doméstica respondendo por 7,2 pontos percentuais dessa expansão. Torres, do BNDES, também destaca o fato de o consumo das famílias e os investimentos se expandirem mais rapidamente, puxando o crescimento do PIB nos últimos anos. "O país tem condições de manter um ritmo de crescimento de 5% a 6% ao ano", diz. Para 2008, o BNDES estima crescimento do PIB de 5,5%.

Para o ex-presidente do Banco Central (BC) Gustavo Loyola, sócio da Tendências Consultoria Integrada, uma diferença fundamental entre o ciclo atual e o de meados dos anos 90 é o cenário externo. "O país se beneficiou de um período de forte crescimento global, com preços das commodities elevados e baixa inflação", afirma. Ele aponta uma série de medidas tomadas desde os anos 90, como a abertura da economia, a estabilização, as privatizações e a manutenção de uma politica econômica responsável para explicar o atual ciclo de crescimento.