Título: O valor da transparência
Autor: Pavini , Angelo
Fonte: Valor Econômico, 13/03/2008, EU & Investimentos, p. D1

Quanto maior a transparência da empresa, menos ela gasta para se financiar e melhor para o investidor. Mas qual é o impacto efetivo dessas práticas no custo de capital das companhias brasileiras? Para responder a essa pergunta, dois professores criaram um índice de transparência que avaliou as empresas do Índice Bovespa de 1998 a 2005, com 47 perguntas relacionadas à forma como a empresa prestava informações em seus balanços, relatórios enviados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e à Bovespa e em seus sites. No total, foram 272 observações, uma média de cerca de 50 por ano analisado. O trabalho levou dois anos e concluiu que, a cada ponto que a empresa avança nesse índice, há uma redução de 0,14 ponto percentual em seu custo de capital.

Melhor para a empresa e para o investidor, que terá uma companhia mais segura para investir, avalia um dos organizadores da pesquisa, o professor Alexsandro Broedel Lopes, da Universidade de São Paulo e da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi). Ele e a professora Roberta Carvalho de Alencar, da Fucape Business School, do Espírito Santo, dividiram as perguntas do índice seis categorias. A primeira, sobre se a empresa prestava as informações gerais, como os mercados onde atua, o que produz e vende. "E por incrível que pareça, há empresas que nem isso mencionam em seus relatórios", diz Broedel.

O segundo item foi a relação da empresa com empregados e administradores, que também mostrou deficiências. "Há empresas que não informam quantos funcionários têm ou quanto pagam para seus executivos", afirma o professor. O terceiro grupo, das informações não-financeiras, diz respeito a visões sobre o segmento de atuação da empresa, fatia de mercado e receita por produtos.

No quarto item, entraram as projeções para a empresa e para o setor, o chamado "guidance". "Este é o pior indicador, poucas empresas brasileiras informam quanto esperam de vendas, crescimento do mercado, fluxo de caixa e até investimentos a serem feitos", revela Broedel. O quinto item analisado foi se a empresa discutia e analisava os dados financeiros, explicando, por exemplo, por que o lucro líquido aumentou de um ano para o outro. E o sexto incluiu outras informações, como o retorno sobre os ativos, o fluxo de caixa (que passou a ser obrigatório agora) e o retorno sobre o patrimônio.

Broedel destaca a evolução das empresas em termos de transparência ao longo dos anos. A média geral, por exemplo, passa de 24% em 1998 para 54% em 2005. "Isso equivaleria a dizer que, se as perguntas do questionário fossem uma prova valendo de zero a dez, as empresas teriam tirado nota 5,4", diz. Olhando por itens, o índice relativo à análise das informações publicadas no balanço, por exemplo, era de apenas 9% e, em 2005, atingiu 50%. Já as projeções saíram de zero para 10%. O dado mais informado são as informações gerais, com 86%.

O trabalho mostrou também que empresas com menor cobertura de analistas de bancos e corretoras ganham mais quando investem na transparência. Para esse grupo, passar mais informações detalhadas em sites, balanços e relatórios reduz o custo de capital em 0,26 ponto percentual, quase o dobro da média geral. Para as empresas com maior cobertura de analistas, o impacto da transparência é menor, 0,09 ponto percentual. "A saída dessas empresas menos populares entre os analistas é por conta própria aumentar as informações e melhorar sua avaliação de risco", diz Broedel.

A pesquisa mostrou ainda que o efeito da transparência no custo é menor nas companhias que negociam papéis no exterior. Empresas com American Depositary Receipts (ADRs), ou recibos de ações, tem um impacto de 0,02 ponto percentual em seu custo para cada ponto percentual de melhora no índice. Isso ocorre porque essas empresas, por atenderem à legislação americana, mais rigorosa em termos de exigências de informações, já possuem um elevado grau de transparência.

Apesar da melhora geral, o professor diz que ainda estamos distantes do nível de transparência de outros países como Estados Unidos e Inglaterra. "Fizemos algumas simulações com empresas americanas e a média de transparência ficou perto dos 70% ou mais", diz.

Ele destaca que este é o primeiro índice de transparência no Brasil que mede não só a quantidade de informações dadas, mas sua qualidade. "E todos os dados são voluntários, ou seja, os pesquisadores pegam o que a empresa divulga apenas, sem levar em conta as informações obrigatórias."

Outra observação de Broedel é que as empresas que possuem uma administração profissionalizada, com conselho bem estruturado e independente, são as que mais informações prestam ao mercado. O peso de ter um conselho para o índice de transparência é maior até do que o fato de a empresa ter ADRs.

Com a harmonização das normas contábeis brasileiras às internacionais (o International Financial Report Standards, ou IFRS) a ser adotada pelas empresas, essa transparência deve aumentar, o que pode significar um custo menor para as companhias locais, acredita Broedel. As empresas terão de publicar os dados do exercício de 2010 já no novo padrão. "Existe um benefício econômico real em relação à transparência, especialmente para quem não tem cobertura de analistas", diz.

Para o investidor, Broedel destaca que as empresas com maior transparência têm maiores oportunidades de crescimento, por pagarem menos para se financiar no mercado.