Título: Supremo arquiva ação contra Mendes
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Fonte: Valor Econômico, 14/03/2008, Política, p. A10

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) arquivaram, ontem, duas ações de improbidade proposta por procuradores do Distrito Federal contra o futuro presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes. Eles concluíram, por oito votos a um, que ministro do STF não pode ser processado na 1ª instância da Justiça.

As ações referiam-se ao período em que Mendes foi advogado-geral da União. Ele ocupou o cargo durante o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, entre 2000 e meados de 2002, e notabilizou-se pelo combate a ações movidas por procuradores da 1ª instância contra autoridades do primeiro escalão do governo.

Ao final de seu período na AGU, o próprio Gilmar Mendes foi vítima de ações dos mesmos procuradores que denunciavam essas autoridades. Numa ação, eles contestaram o fato de o então advogado-geral não ter prestado informações a respeito da contratação de servidores. Na outra, o procurador Luiz Francisco de Souza, que ficou conhecido por entrar com sucessivas ações contra integrantes do governo FHC, acusou Mendes de enriquecimento ilícito pela suposta liberação de servidores para assistir aulas no Instituto Brasiliense de Direito Público, do qual era sócio.

Ontem, o STF julgou as duas ações e arquivou-as. A maioria do STF firmou a posição de que os ministros do Supremo só podem ser processados no próprio Supremo e no Senado. "Se, pela Constituição, o ministro do STF só pode ser processado por crime comum por esta Corte e por crime de responsabilidade pelo Senado, não é concebível que ilícito de menor gravidade em cujas sanções está a perda do cargo possa se atribuir a competência de outros órgãos", afirmou o ministro Cezar Peluso. Para ele, seria "o máximo do contra-senso" permitir que um ministro do STF fosse julgado por outras instâncias da Justiça. "Isso seria a desestruturação de todo o sistema."

O ministro Carlos Ayres Britto também enfatizou que a Constituição prevê competências distintas para os tribunais de 2ª instância, para o Superior Tribunal de Justiça e para o Supremo. A jurisdição é, segundo ele, hierarquizada. "Submeter um ministro do Supremo a um juiz de Vara subverte esta lógica."

O ministro Marco Aurélio Mello ficou vencido na votação. Ele argumentou contra o foro privilegiado para autoridades, inclusive quando se tratar de ministros do STF. "Entendo que a extensão da prerrogativa de foro como um retrocesso, e não como um avanço no campo democrático", disse Mello. "Ainda pretendo ouvir dias em que os ares republicanos serão mais sentidos, partindo-se para a equalização de tratamento", completou, criticando o foro privilegiado.

O julgamento reforçou o precedente de que a Lei de Improbidade Administrativa não pode ser utilizada contra ministro de Estado. Essa posição foi firmada em junho do ano passado, quando o STF anulou a condenação pela 1ª instância do ex-ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg. Na ocasião, o STF considerou que os supostos crimes de improbidade de autoridades devem ser processados pelo próprio tribunal.

Gilmar Mendes assumirá a Presidência do STF em 23 de abril. Ele substituirá a ministra Ellen Gracie para um mandato de dois anos no comando do Supremo. Cezar Peluso será o vice-presidente. Ambos foram eleitos anteontem pelos demais ministros do STF, num pleito meramente formal, já que a eleição da Presidência segue critérios de antiguidade na Corte. (JB)