Título: Combate à aftosa na América do Sul será revisto
Autor: Bueno , Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 14/03/2008, Agronegócios, p. B20

Prevista para ser varrida da América do Sul no fim de 2009, a partir da implantação, em 1988, do Plano Hemisférico de Erradicação da Febre Aftosa (Phefa), a doença vai permanecer por mais alguns anos pairando como uma ameaça sobre os rebanhos de alguns países do continente. A situação é mais complicada na Venezuela e no Equador, onde a doença ainda é considerada endêmica, além da Bolívia, que registrou seus últimos cinco focos em fevereiro do ano passado.

A constatação é compartilhada por representantes de governos, dos pecuaristas e do Centro Pan-Americano de Febre Aftosa (Panaftosa), responsável pelo Phefa, que participaram na quinta-feira da abertura da 35ª reunião da Comissão Sul-Americana de Luta contra a Febre Aftosa (Cosalfa). Agora, um novo prazo poderá ser estipulado no encontro do comitê gestor do plano, dia 9 de junho, no Rio.

"Fica óbvio nas apresentações que não será possível [cumprir o cronograma]", disse o coordenador técnico da área de enfermidades vesiculares da Panaftosa, Victor Saraiva. Segundo ele, 95% do rebanho sul-americano de 340 milhões de bovinos está "sob controle", sem registro da doença nos últimos 12 meses, mas os demais enfrentam focos que "pingam" todos os anos. Somando-se a Bolívia e o Norte e Nordeste do Brasil, 15% da população animal local é contabilizada como "não-livre" da enfermidade.

Na Venezuela, que registrou cerca de 35 focos no ano passado, o presidente Hugo Chávez criou um fundo de US$ 123,7 milhões para bancar a imunização em 2008, explicou o presidente da Federação Bolivariana dos Pecuaristas e Agricultores do país (Fegaven), Balsamino Rivas. Mesmo assim, ele acredita que só em 2010 "algumas áreas" poderão ser declaradas livres sem vacinação.

Se o trabalho for mantido, Rivas prevê que em 2012 será possível erradicar a doença em quatro dos 23 Estados venezuelanos, que concentram dois terços do rebanho de 12 milhões de cabeças. Mas, para isto, considera indispensável o apoio da Panaftosa, da Organização Internacional de Saúde Animal (OIE) e de países como Brasil, Argentina, Uruguai e Colômbia.

A Bolívia eliminou os focos de 2007 em Santa Cruz de La Sierra e espera erradicar completamente a doença até o fim de 2009, mas o problema local é a instabilidade política. Com base nos relatórios de uma missão técnica de 2007, o representante regional para as Américas da OIE, Luís Barcos, disse que o sistema de vigilância sanitária do país está "aparentemente desestruturado e sem recursos".

A afirmação foi repudiada pelo diretor nacional do Serviço Nacional de Sanidade Agropecuária da Bolívia (Senasg), Rolando Sandoval, para quem a avaliação é "preocupante". Para ele, a missão da OIE foi prejudicada porque conflitos sociais que ocorreram à época no país impediram a visita dos técnicos ao departamento de Tarija.

Segundo Sandoval, os departamentos de Beni e Pando, na fronteira com o Brasil, que reúnem 3 milhões de bovinos do rebanho local de 6,7 milhões de cabeças, e de Itucarrale estão há mais de três anos sem registrar novos casos e esperam obter o reconhecimento da OIE como áreas livres com vacinação em maio. Outras regiões, como Potosí e Oruro, vão completar três anos sem focos.

Para Christian Sattori, dirigente da Confederação Pecuária da Bolívia, a situação do serviço sanitário põe em risco o status já alcançado. Ele alertou que as fontes de financiamento para a sanidade animal no país se esgotaram e que há "excessiva politização" do serviço sanitário.

O Brasil pretendia erradicar a doença em 2005, mas os focos daquele ano no Mato Grosso do Sul atrapalharam os planos. Agora a meta é eliminar a doença até o fim de 2009, disse o diretor do Departamento de Saúde Animal do Ministério da Agricultura, Jamil Gomes de Souza. Segundo ele, o trabalho será reforçado nas regiões Norte e Nordeste, que, embora tenham programas de vacinação "bastante adiantados", necessitam de uma melhor estruturação dos serviços veterinários. O país também espera, em maio, restabelecer na OIE a condição de livre de aftosa sem vacinação para os 11 Estados do circuito Centro-Oeste que perderam o status em 2005.