Título: Crise pode forçar a elevação dos juros
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 19/03/2008, Finanças, p. C1

Se a crise externa se aprofundar, o Banco Central poderá ter de subir mais os juros básicos internos do que o 1 ponto percentual já previsto. A taxa Selic, hoje em 11,25% ao ano, poderia chegar a 13,25% no final de 2008. Essa é a visão de André Loes, economista-chefe do Santander, e de Tomás Málaga, economista-chefe do Banco Itaú. Os dois participaram de seminário ontem, em São Paulo.

Para Loes, os efeitos da crise externa no Brasil ainda são pequenos. Na sua visão, o Comitê de Política Monetária (Copom) deverá subir a Selic para 13,25% ao ano, mas por causa de fatores internos. "O nível de crescimento da economia brasileira dá sinais de que está mais forte do que o crescimento da oferta e o BC terá de subir os juros para acomodar esse descompasso, como indicou na última ata do Copom", acredita ele. O aumento dos juros, no seu entender, não necessariamente vai acontecer já na próxima reunião do Copom.

O economista-chefe do Santander lembra que a curva de juros futuros "empinou", com os títulos públicos de mais longo prazo sofrendo maior queda de preço com a saída dos investidores estrangeiros. Há também saídas de outros fluxos financeiros dos estrangeiros, mas nada que seja determinante para provocar desequilíbrio no balanço de pagamento, avalia. "Se as autoridades americanas conseguirem acalmar a situação de forma a evitar que ela se deteriore ainda mais ou que a crise se prolongue, a perda de riqueza dos ativos brasileiros será pontual", diz ele.

No entanto, se a crise reduzir demais o crescimento da economia da China, o principal consumidor de commodities no mundo, os preços desses produtos podem cair demais comprometendo as contas externas e desvalorizando o real de forma mais forte e permanente, com impacto na inflação dos produtos importados. Para isso acontecer, na sua visão, é necessário um impacto muito forte da crise no crescimento global, pois uma pequena queda nos preços dos commodities teria efeito limitado no Brasil. "O balanço de pagamentos brasileiro está tão sólido que é necessário um agravamento realmente severo da crise para ele se desestabilizar, o que parece pouco provável neste momento" ,diz Loes. O economista-chefe do Santander não acredita em um componente especulativo determinante no preço dos commodities.

Como forma de precaução, o governo deveria aproveitar este momento de crise para cortar gastos. "Reforço de política fiscal é sempre bom, mas isso é politicamente mais fácil de fazer em épocas de crise", diz.

Já o economista-chefe do Itaú, Tomás Málaga, acredita que os juros Selic devem terminar este ano em alta de 1 a 1,5 ponto percentual, em níveis de 12,25% a 12,75% ao ano. "A demanda está crescendo tão rápido que pode vir a pressionar os preço dos serviços", diz.

Para Málaga, no entanto, um tombo maior no preço dos commodities poderia provocar uma desvalorização do real mais forte, com o dólar superando R$ 1,80, o que levaria o BC a a subir a Selic em 2 pontos percentuais. Ele lembrou que só anteontem, com o mercado financeiro estressado, os preços do café e do açúcar chegaram a cair 10%. "Só um acompanhamento mais detalhado da crise vai determinar se os juros Selic terão de subir mais ou menos", diz.

Ele notou que ontem os mercados já haviam se acalmado antes da decisão do Fed, banco central americano, que cortou os juros básicos americanos em mais 0,75 ponto percentual, para 2,25% ao ano. "Os balanços do Lehman Brothers e do Goldman Sachs vieram melhores do que o esperado", afirma Málaga.

Para os economistas, se o BC subir os juros, existe o risco de investimentos especulativos fluírem para aproveitar a diferença entre taxas internas e externas que cresce, o que valorizaria o real. "Mas, essas posições mais especulativas são montadas em maior volume justamente em momentos de menor aversão ao risco", lembra Málaga. Há ainda os custos fiscais _ um maior custo de carregamento das reservas internacionais, de R$ 53 bilhões em 2007.