Título: Multiplicação dos fundos
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 19/03/2008, EU & Investimentos, p. D1

O número de fundos de investimento no Brasil apresenta crescimento explosivo nos últimos meses. Segundo dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão que regula e fiscaliza o setor, são quase 8 mil as carteiras registradas atualmente. No mês passado, houve um crescimento de 26% em relação a fevereiro de 2007. O crescimento é puxado principalmente pela criação de fundos exclusivos, de apenas um cotista ou de um grupo com interesses em comum. Os dados mostram ainda que, apesar da expansão, os fundos de investimento não se tornam mais populares. Pelo contrário. O número de cotistas apresenta crescimento mais comedido, de 11,2 milhões em fevereiro de 2007 para 11,5 milhões este ano. Lembrando apenas que uma pessoa pode ser cotista em mais de um fundo.

A categoria que puxou esse avanço é a de Fundos de Investimento em Cotas (FICs) de multimercado, que cresceu de 1.850 fundos há dois anos para 3.424 em fevereiro, segundo a CVM. É nessa categoria que se encaixam os fundos exclusivos, com liberdade para aplicar em cotas de qualquer outra carteira, explica William Eid Júnior, chefe do Centro de Estudos em Finanças da FGV-SP. São produtos criados por private banks e "family offices" (escritórios de gestão de grandes fortunas), que oferecem a investidores milionários o serviço de distribuição entre diversos gestores. "Se eu tenho muito dinheiro, vou querer uma estratégia exclusiva", afirma Eid.

Em média, de acordo com dados da autarquia, esses FICs de multimercado têm 132 cotistas. Número que fica muito abaixo da média de 10 mil cotistas por FIC de ações, de 6,6 mil por FIC referenciado (onde se encontram os DI) e de 4,9 mil por FIC de renda fixa. Além de haver muitos fundos exclusivos, os FICs multimercado abertos costumam ter menos investidores, mas de maior renda, comenta Eid. "São fundos com características de gestão mais específicas, criados para quem investe muitos milhares de reais."

Para Paulo Corchaki, responsável pela mesa de investimentos do private do Itaú, os fundos exclusivos cresceram principalmente por conta da expansão da riqueza das pessoas físicas. O crescimento da economia e as aberturas de capital (IPOs) de empresas, que levaram muito dinheiro para os sócios, criaram mais milionários. Corchaki diz que, quando chegou ao Itaú, em junho de 2006, eram cerca de 150 os fundos exclusivos do private e que, hoje, esse número extrapola a marca de 400. Lá, essas carteiras são formadas para gerir patrimônio a partir de R$ 10 milhões, mas há quem aceite carteira menor, de R$ 5 milhões.

A estrutura de fundo exclusivo é algo peculiar do mercado brasileiro, porque oferece ao detentor benefícios tributários. Até o início deste ano, apenas o cotista de um FIC próprio podia migrar de um investimento para outro sem ter de bancar a CPMF. Hoje, embora, o tributo tenha caído, o aplicador ainda tem o benefício de poder interromper uma aplicação e saltar para outra sem ter de pagar sobre os ganhos o imposto de renda pela regressiva, que considera o prazo da aplicação. Os FICs não pagam imposto em suas aplicações em outros fundos. Apenas o investidor, quando saca do FIC, é tributado.

Para Marcelo Giufrida, vice-presidente da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), o setor de fundos brasileiros está agora em um hiato, devido à turbulência do mercado financeiro. Os IPOs, por exemplo, que impulsionavam o número de milionários, secaram. Corchaki, do Itaú, também liga diretamente a continuidade da expansão do número de fundos à continuidade de geração de riqueza do país. Se houver interrupção mais longa nesse cenário, poderá haver arrefecimento no ritmo de criação de novos fundos.

Em patrimônio, os FICs multimercados, com R$ 230 bilhões, passaram a representar parcela maior do setor de fundos do que os FICs de renda fixa no setor, segundo dados da CVM.

Dados do site Fortuna também evidenciam essa expansão dos fundos multimercado exclusivos. Segundo Marcelo D'Agosto, diretor do site, apenas 1.388 fundos têm mais de R$ 200 milhões de patrimônio. Outras 3.998 carteiras têm menos de R$ 25 milhões. São carteiras individuais ou coletivas ineficientes porque os custos de um fundo podem ser elevados demais nesse patrimônio baixo para se distribuir entre poucos cotistas, diz D'Agosto. "Em fundo de investimento, escala é fundamental para aumentar a eficiência da carteira coletiva", explica o sócio do Fortuna (veja mais abaixo).

A expansão dos fundos exclusivos, no entanto, levanta uma questão teórica no mercado: se os fundos realmente cumprem seu papel, de oferecer mais eficiência de aplicação à pessoa com menos recursos disponíveis.

Além dos fundos exclusivos, puxou também a criação de fundos no país o surgimento de novas gestoras de recursos. Os fundos de investimento financeiros da categoria multimercado, por exemplo - que recebem aporte dos FICs ou diretamente do aplicador -, pularam de pouco mais de 1.000 em 2005 para 1.393 em fevereiro. Nesse caso, é mais provável que sejam novas estratégias disponíveis para o aplicador brasileiro.

Também tiveram crescimento expressivo recentemente os fundos de ações. Apesar de a Bovespa ter atravessado cinco anos com retorno surpreendentes e praticamente nenhum revés, foi apenas nos últimos meses que o número de carteiras cresceu, de 499, há dois anos, para 742 em fevereiro. Neste caso, nota-se também um crescimento no número de cotistas em ações, de 1,9 milhão, para 2,7 milhões.