Título: Concessão de 18 usinas vence em 2015
Autor: Rittner , Daniel
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2008, Brasil, p. A4

À semelhança das hidrelétricas de Jupiá e Ilha Solteira, da Cesp, o ano de 2015 é literalmente o fim da linha para 18 usinas geradoras, 37 distribuidoras e 73 mil quilômetros de linhas de transmissão de energia elétrica, quando vence a primeira grande leva de concessões de serviços de utilidade pública que, pelas regras atuais, não podem ser renovadas. Segundo fontes do setor privado e do governo, sem mudanças na lei, essas concessões deverão voltar à União e ir para licitação.

São 16.686 megawatts de usinas hidrelétricas pertencentes à Cesp e a subsidiárias do sistema Eletrobrás, além de uma térmica da Chesf, com potência de 766 MW. Ao todo, isso equivale a quase 20% do parque gerador brasileiro. No segmento de transmissão, expiram em julho de 2015 as concessões de linhas que representam mais de 84% do sistema interligado nacional. Na área de distribuição, 41 das 64 empresas têm concessões vencendo entre abril de 2014 e abril de 2017 - entre elas a mineira Cemig, a paranaense Copel e a Companhia Energética de Brasília (CEB). Ontem, o governo renovou a concessão da usina Porto Primavera, da Cesp.

A data ainda parece distante, mas pode ter repercussões no curto prazo. "Para investir, precisamos de financiamento de longo prazo. Há bancos que só nos dão crédito até o fim da concessão e outros que exigem garantias adicionais para depois de 2015", diz o presidente da CEB, José Jorge, que já discutiu o problema com o Ministério de Minas e Energia e com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

"Na incerteza se vai haver renovação ou não, a tendência de qualquer concessionário é relaxar um pouco no investimento, com o risco de prejudicar a qualidade de prestação do serviço público", observa o diretor-geral da agência reguladora, Jerson Kelman. "A situação legal, como está hoje, exigirá fiscalização muito maior da Aneel a partir de 2010."

A discussão remete à lei 9.074, de 1995, promulgada em meio à privatização do setor elétrico. As empresas desestatizadas - essencialmente no segmento de distribuição - foram arrematadas em leilões por companhias privadas, que fizeram um pagamento pelo direito de explorar o serviço público. Para essas empresas, as concessões foram "zeradas" e dadas por 30 anos, com possibilidade de renovação. Isso vale também para novas usinas de geração. No caso de distribuidoras que não foram privatizadas, a concessão (já existente) foi prorrogada por 20 anos - e não pode ser mais estendida. Por isso existe essa concentração de vencimentos em 2015.

"Não há pânico no setor", afirma a economista e advogada Elena Landau, que acredita numa solução por parte do governo federal, "em prol da boa qualidade dos serviços de utilidade pública". Mas ela ressalta que "2015 é logo ali" para empresas de infra-estrutura e vê a necessidade de "regras urgentes de renovação e de reversão das concessões, para dar maior segurança aos investidores".

Landau, que era diretora do BNDES em 1995, quando a Lei de Concessões foi promulgada, lembra que na época havia uma perspectiva de privatização do setor elétrico. Esse modelo ficou no meio do caminho e levou à convivência de regimes contratuais diferentes. "Hoje a visão predominante é que seria necessária uma mudança legislativa para as diversas formas de concessão que nós temos", conclui.

Na avaliação do governo paulista, que pretende vender a Cesp em leilão na próxima quarta-feira, o fim de dezenas de concessões em 2015 mostra que o problema da estatal de São Paulo não é isolado, mas do setor elétrico como um todo.

As usinas de Jupiá e Ilha Solteira, que respondem por dois terços da capacidade de geração da Cesp, têm suas concessões vencendo em 2015, sem possibilidade de renovação pelas regras atuais. Apesar da percepção de uma parte do mercado de que elas serão prorrogadas mais adiante, isso cria uma dificuldade prática ao vencedor do leilão para a estruturação financeira de projetos, obtenção de crédito e oferta de ações como garantia a empreendimentos.

A área mais sensível é a de distribuição, em que os investimentos são muito pulverizados ao longo do tempo de concessão e pode haver menos tempo para amortização dos recursos aplicados. É um segmento diferente da geração, em que os investimentos são feitos basicamente no início da concessão, quando se constrói o empreendimento. Se retomar a concessão, o governo deverá promover nova licitação, segundo as regras vigentes. O que a lei não diz é se a licitação deve ou não ser onerosa para a nova concessionária. Há necessidade, porém, de indenização pelo Estado de todos os investimentos não-amortizados.

Para Elena Landau, que é consultora da Associação Brasileira das Concessionárias de Energia (ABCE), "ninguém quer direito adquirido (de prorrogar a concessão), só que não haja esse tipo de proibição". Como o pedido de renovação de uma concessão deve ser encaminhado à Aneel, no máximo, 36 meses antes de expirar, a data-limite para enfrentar o problema é 2012. O presidente do Instituto Acende Brasil, Cláudio Sales, que reúne investidores privados do setor elétrico, pede transparência. "Qualquer que seja a decisão, pedimos que ela seja tomada com transparência e isonomia", assinala o executivo.