Título: Sem um final à vista, Bush defende a guerra no Iraque
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Fonte: Valor Econômico, 20/03/2008, Internacional, p. A13

Em discurso ontem no Pentágono, o presidente dos EUA, George W. Bush, defendeu a guerra no Iraque - que completa cinco anos hoje -, dizendo que a intervenção americana foi "muito bem-sucedida" e fez com que o "primeiro grande país árabe se levantasse contra [o líder da rede terrorista Al Qaeda] Osama Bin Laden".

A retórica de Bush se choca com a percepção de um público que mudou de opinião nesses cinco anos. Ainda sob o impacto dos ataques de 11 de setembro de 2001, os americanos apoiaram a chamada guerra preventiva, ou seja, atacar o Iraque antes de sofrer um eventual ataque. Washington dizia que o então ditador iraquiano Saddam Hussein tinha armas de destruição em massa - nunca encontradas.

Mas, após cinco anos do início das hostilidades, em 20 de março de 2003, a guerra no Iraque tornou-se impopular nos EUA. Na última pesquisa feita pela rede de TV CNN, só 32% dos entrevistados apóiam a guerra; 66% se opõem.

"O sucesso que vemos no Iraque é inegável", disse Bush. Pode ser que a situação tenha melhorada nos últimos meses, mas esses cinco anos conseguiram mesmo foi dar a maior demonstração pública dos limites do poderio americano - vista pela TVs nos países árabes e muçulmanos como uma versão moderna das Cruzadas. Estrategicamente, os EUA conseguiram acabar com o regime sunita iraquiano de Saddam e colocar no lugar um regime xiita próximo a Teerã. Certamente aumentar a área de influência do Irã não era essa a intenção dos americanos em 2003.

No Iraque, as sucessivas ondas de violência afugentaram a classe média - pelos menos a que teve condições de fugir. Segundo estimativas do Ministério da Saúde do país, 151 mil iraquianos foram mortos no conflito, de março de 2003 a junho de 2006. Isso não inclui os mortos na violência sectária desde então. Outras cinco milhões de pessoas viraram refugiadas. Isso vem criando uma instabilidade que, segundo muitos analistas, pode transformar o país numa nova versão do Afeganistão pós-soviético: um território dividido entre facções e "senhores da guerra".

A data redonda de cinco anos serviu também para iniciar nos EUA uma nova rodada de debates sobre o conflito e sobre uma possível retirada das tropas pelo novo presidente - atualmente há mais de 158 mil soldados americanos no Iraque. Bush classificou as discussões como "compreensíveis", mas insistiu que a manutenção das tropas dos EUA no Iraque é "crucial". Para ele, a resposta às críticas ao conflito é clara: "Retirar Saddam Hussein do poder foi a decisão certa, e essa é uma luta que os EUA podem e precisam ganhar".

Mas a pesquisa CNN revelou também que 61% dos entrevistados acham que o próximo presidente deveria retirar a maior parte das tropas dos EUA do Iraque logo no início do mandato.

Um dos principais argumentos dos que defendem a retirada das tropas é o alto número de americanos mortos em combates no país - quase 4 mil. Bush admite que as baixas foram um "preço alto", mas, segundo ele, "necessário". "Ninguém diria que essa guerra não custou um alto preço em vidas e em dinheiro, mas estes custos são necessários quando nós consideramos o custo de uma estratégia vitoriosa para os nossos inimigos no Iraque."

Dirigindo-se aos críticos do conflito -- como os pré-candidatos democratas à Presidência, Hillary Clinton e Barack Obama, Bush afirmou que eles "não podem mais argumentar que nós estamos perdendo no Iraque, então argumentam que a guerra custa muito".

Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia que foi diretor do conselho de assessores econômicos do governo de Bill Clinton, avalia que a guerra custará mais de US$ 3 trilhões aos EUA, em custos diretos e indiretos. Em 2003, Bush estimava um custo de no máximo US$ 50 bilhões - atualmente, os gastos já passaram de US$ 500 bilhões.

Os pré-candidatos democratas argumentam que o dinheiro poderia ter sido usado em programas sociais do governo, o que teria evitado o enorme déficit do governo Bush. Ontem, o senador Barack Obama disse que, se eleito, retiraria a maioria das tropas em até 16 meses após o início do mandato. De qualquer modo, mesmo por essa proposta mais ousada, o grosso das tropas continuaria no Iraque por pelo menos mais dois anos.