Título: Expectativas de inflação irão dar a senha para alta da taxa Selic
Autor: Guimarães, Luiz Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 20/03/2008, Finanças, p. C2

A senha para a alta da taxa Selic será dada no dia em que as expectativas inflacionárias do mercado romperem o centro de 4,5% da meta de inflação para este ano e o próximo. Para os analistas, tanto os efeitos da crise americana quanto as divergências entre a Fazenda e o Banco Central sobre a política monetária não irão interferir na decisão que será tomada pelo Copom em sua próxima reunião, marcada para 16 de abril. Mesmo assim, ao contrário das últimas reuniões, esta será uma das mais difíceis.

A julgar pela divisão que já se manifesta no mercado, a decisão de manter a Selic em 11,25% ou aumentá-la não será fácil nem unânime. Mesmo entre os maiores bancos do país não há consenso. Enquanto o departamentos econômico do Bradesco projeta avanço, os economistas do Real e do Unibanco ainda crêem na estabilidade da taxa, e os do Santander e do Itaú prevêem alta de pelo menos um ponto ao longo do ano, sem que a rota ascendente tenha necessariamente início no próximo Copom.

A maior dissensão entre os participantes do mercado ocorre, contudo, entre a turma dos que fazem negócio no mercado futuro - os tesoureiros e os gestores, hoje predominantemente "altistas" em matéria de juros - e o pessoal de estudos e análises econômicos, em sua maioria ainda adeptos da estabilidade do juro básico.

Para a economista do ABN Amro Real, Zeina Latif, o BC já deixou claro que não irá aceitar desaforos. Mas o tempo está inegavelmente conspirando a seu favor. O tom mais duro da ata posterga a decisão de aperto enquanto ocorre a maturação dos investimentos e cessam os efeitos dos impulsos monetários já dados. O BC está monitorando com rigorosa atenção os riscos implícitos em uma travessia delicada para um segundo semestre mais confortável, mas não vai aceitar uma ancoragem frouxa das expectativas de inflação. "O dado-chave para se projetar as próximas decisões do BC é a expectativa de inflação do mercado. Enquanto estiverem bem fixadas abaixo do centro da meta, a tendência é de o Copom manter a Selic", diz Zeina Latif. A projeção do IPCA 12 meses à frente do último boletim Focus está em 4,29%. Só depois das expectativas inflacionárias se perfilam os outros fatores. A crise americana pesa de duas maneiras na inflação e, portanto, na decisão do Copom: preço de commodities e variação cambial. Por enquanto, nenhuma delas sugere a necessidade de elevação da taxa de juros. Para Zeina, nem a expansão do crédito nem a demanda aquecida teriam igualmente o poder de determinar um avanço da Selic. As pressões vindas do crédito já começaram a refluir porque os bancos notam uma elevação do custo do funding para os empréstimos. E a demanda dependerá do mercado de trabalho. Este mostra-se robusto, mas traça um cenário ainda não muito claro.

O diretor da NGO Câmbio, Sidnei Nehme, observa com ceticismo as discussões atuais sobre a pressão sobre os preços exercida pela demanda interna aquecida e a capacidade da indústria de poder atendê-la, o que seria uma forte razão para a elevação da taxa Selic. "Economistas ligados ao setor financeiro não economizam razões para que o Copom eleve o juro, enquanto que economistas mais independentes relutam em aceitar a hipótese já que as expectativas não abandonaram a rota trilhada pelo sistema de metas", diz ele. Para o economista, se a demanda não está perigosamente aquecida e se as commodities perdem o ímpeto de alta, a inflação futura estará ancorada na taxa de câmbio. E a apreciação desta não precisa do estímulo adicional que viria de uma nova alta da Selic. A simples queda do juro americano já amplia a entrada de capitais estrangeiros. Como a expectativa de taxa Selic do Boletim Focus para o fim do ano se manteve em 11,25% depois da ata do Copom, a retórica mais dura não selou o destino da próxima reunião. "Entendo que, em sua ata, o Copom não se comprometeu com a decisão que irá tomar em abril", diz Zeina Latif, do Banco Real.