Título: Linha de capital de giro cresce 47%
Autor: Travaglini , Fernando
Fonte: Valor Econômico, 24/03/2008, Finanças, p. C1

A principal ferramenta de relacionamento entre bancos e empresas, o crédito para capital de giro, superou a casa dos R$ 100 bilhões de saldo em janeiro deste ano. A linha foi a que mais cresceu, atingindo avanço de 47% nos últimos 12 meses. Os prazos também cresceram e algumas operações mais longas já atingem dez anos. Por enquanto, nem mesmo a apreensão com a crise americana foi capaz de refrear a demanda pela linha.

"À medida que há investimento, as empresas, na seqüência, precisam financiar o giro", afirma Ademir Cossiello, diretor-executivo do Bradesco. "Com o aquecimento do consumo é preciso financiar a produção e depois, novamente, o estoque".

Esse ciclo tem sido cada vez mais financiado pelos bancos. No ano passado, as instituições financeiras liberaram, em média, R$ 12,5 bilhões por mês para as empresas.

Ao longo da semana passada, no entanto, novos resultados negativos de bancos americanos reacenderam os temores com relação à economia dos Estados Unidos e elevaram os juros futuros aqui no Brasil.

As taxas que são referência para os bancos brasileiros balizarem os juros cobrados dos clientes finais pularam de 11,92% no fim de fevereiro para 12,54% na quarta-feira (swaps longos de 360 dias).

A pressão, que ocorre desde o ano passado, já provocou subida dos juros do crédito. As taxas do capital de juros subiram de 27,9% ao ano em dezembro para 29,4% ao ano em janeiro. Além disso, os bancos já prevêem alta da taxa Selic. Nem mesmo esse cenário reduziu a perspectiva de crescimento do crédito na opinião dos bancos, como mostrou pesquisa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

"O ambiente é de mais cautela, mas, por enquanto, o impacto da crise no Brasil será parcial e pouca magnitude", afirma Nicola Tingas, economista-chefe da entidade. Os bancos acreditam que as carteiras de crédito devam crescer 21,82% neste ano. Na pesquisa de fevereiro, a previsão era de avanço de 20,92%.

O diretor do Bradesco disse ainda que o banco não sentiu redução da procura por crédito. "Ainda não tem reflexo nas propostas, nem na área de contratação. Não se verifica redução nos volumes", afirma Cossiello.

Apesar da perspectiva positiva, alguns bancos já estão mais cautelosos na concessão, segundo Miguel de Oliveira, diretor da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).

"Os bancos estão mais seletivos. A inadimplência não subiu, mas eles estão se precavendo. Começam a selecionar melhor clientes". Nesse processo, os primeiros a serem afetados são as empresas de pequeno e médio porte, com menos ofertas ou juros mais elevados.

Mas como os prazos também estão cada vez mais longos, parte dessa elevação de custos fica diluída, causando pouco impacto na demanda. No ano passado, o prazo médio passou de um ano (369 dias, em janeiro de 2007), para um ano e três meses (482 dias) em janeiro deste ano. As linhas mais longas são usadas para operações estruturadas, como aquisições, por exemplo, em que a engenharia da liberação exige uma composição de diversos fluxos diferentes de acordo com a necessidade. Mas grandes empresas já operam capital de giro tradicional de seis anos.

Um dos motores desse crescimento do capital de giro tem sido a sofisticação das garantias utilizadas e que permitiram maior segurança aos bancos, afirma Henrique Vianna, diretor do HSBC, como a substituição dos recebíveis de cheques (pré-datados) pelos de cartão de crédito. Por conta disso, mesmo com o crescimento, a inadimplência continua em queda, de 2,8% em janeiro de 2007 para 1,6% neste ano.

Luiz Gustavo Braz Laje, diretor de crédito do Banco do Brasil afirma que cada vez mais as empresas usam as linhas adequadas para realizar investimentos e o capital de giro é destinado, de fato, para financiar o ciclo produtivo. No BB, os desembolsos para investimentos cresceram 33%, afirma. São linhas de repasse do BNDES, do Proger Urbano Empresarial, que usa recursos de fundos como o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e do FCO, fundo constitucional do Centro-Oeste. O total atingiu R$ 10,7 bilhões.

Já o capital de giro no banco atingiu saldo R$ 16 bilhões nas linhas para grandes empresas e R$ 9,1 bilhões para linhas de pequenas e médias empresas. "Essa é uma tendência. Cada vez mais demanda por operações de longo prazo seja de giro ou investimento", disse.

Maercio Soncini, vice-presidente executivo de Negócios de Atacado e Tesouraria do Banco Fibra explica que as linhas em reais continuam com bastante procura, mesmo com certa elevação dos custos. "Demanda de crédito continua forte aqui no Brasil", afirmou.

Ele lembra, no entanto, que linhas de financiamento de exportação ficaram mais caras e escassas. "De fato, o que já se observa é impacto em trade finance (linhas para exportação) que até três semanas vinha bem. Antes, a resposta a uma demanda ocorria no mesmo dia e agora tem de procurar linha. E está mais caro".