Título: Para Vale, China garante demanda por insumos
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/03/2008, Brasil, p. A9

Fabio Barbosa, da Vale: "Apesar das turbulências de curto prazo e alguns ajustes mais fortes no Ocidente, o outro lado do mundo deve continuar a crescer" Apesar da desaceleração da economia americana e da crise financeira internacional, a Vale, maior exportadora de minério de ferro, mantém uma visão positiva dos rumos da economia mundial e não pretende modificar o plano de investimento de US$ 59 bilhões para os próximos cinco anos.

Fabio Barbosa, diretor executivo de finanças da companhia, prevê que o atual ciclo de aumento da demanda e de alta dos preços do minério e das commodities metálicas está baseado em fundamentos de longo prazo, ancorado no crescimento da China. "Apesar das turbulências de curto prazo e alguns ajustes um pouco mais fortes que vamos observar no Ocidente, o outro lado do mundo deve continuar a crescer."

Em palestra no seminário promovido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Barbosa fez uma análise mais profunda sobre o ponto de vista da Vale. Explicou que os últimos cinco anos marcaram uma mudança estrutural no padrão de crescimento da economia global. Acelerado pela arrancada da demanda chinesa, a partir do segundo semestre de 2002, o PIB mundial cresceu em média 4,3% ao ano, entre 2003 e 2007, puxado por forte participação das economias emergentes.

Segundo dados do FMI, nos dez anos encerrados em 1998 a contribuição dos EUA para o PIB global foi de 24%, e das economias desenvolvidas (incluído EUA), de 57%, enquanto a dos países emergentes, de 43% (incluindo China) e da China, isoladamente, de 17%. No triênio 2005/2007, a economia americana reduziu sua contribuição ao PIB global para 13%, e das economias desenvolvidas, como um todo, encolheu para 33%, enquanto as emergentes ampliaram para 66%, e a China, sozinha, contribuiu com 25%.

O forte aumento da presença chinesa foi sustentado pela demanda interna e não pelas exportações. O governo chinês tem um programa de trazer para as cidades 300 milhões de pessoas nos próximos 15 anos, o que gerou mais investimentos em habitação e bens duráveis, entre outros, garantindo demanda firme para metais e aço. "A demanda por minerais e metais é crescente em função do maciço processo de urbanização chinês, com investimentos que respondem por 40% do PIB local. É como se estivesse sendo construída toda uma estrutura urbana para a Europa em 15 anos", disse Barbosa.

Para ele, é fundamental entender o que acontece na China, para entender o mercado de commodities metálicas. "Nosso cenário para o mercado de commodities não é otimista , ele é concreto, porque o crescimento chinês não está assentado numa plataforma de exportação para o mundo ocidental, que é onde haverá maior redução da taxa potencial de crescimento na atual crise. A demanda doméstica chinesa responde por 85% a 90% da taxa de crescimento do PIB local. É esse processo de mudança estrutural que altera até a forma de enxergar o mundo", avalia Barbosa.

As previsões da Vale indicam que o gigante asiático vai crescer este ano 10,4%, e depois reduzir gradualmente seu ritmo até atingir 8,6 % ao ano em 2012, apesar da desaceleração global. Esse cenário vai continuar favorecendo o setor de commodities metálicas. "Não estou dizendo que a China é invulnerável à crise americana, mas ela é relativamente menos sensível que os pequenos países asiáticos."

Segundo o executivo da Vale, a oferta mundial de minério e metais não está conseguindo acompanhar a demanda empurrada pela China, India e outros emergentes. Os investimentos em mineração estão mais caros e as mineradoras enfrentam falta de mão-de-obra e equipamentos para tocar projetos. Barbosa reconhece que o mercado de captações hoje está mais arisco e o capital mais caro. "Há uma clara redução da liquidez. Do ponto de vista do nosso plano de investimento, a estratégia é ver o que acontece no mercado financeiro e buscar acessar outros "pools" de recursos".

No fim de 2007, a Vale visitou instituições financeiras na Ásia e no Oriente Médio. Esta semana, recebeu a visita do fundo Qtar Investment Notorial. "Estamos buscando fontes alternativas para tocar projetos. Vamos crescer até 2012 cerca de 11% ao ano. Apesar dos ajustes no Ocidente, o mundo continuará crescendo no longo prazo".