Título: Preço do vinho chileno sobe mas Brasil segue comprando
Autor: Malta , Cynthia
Fonte: Valor Econômico, 25/03/2008, Empresas, p. B6

Lecaros, da Santa Rita, que adota mecanização e rolhas iguais para seus vinhos O vinho chileno, que caiu no gosto de muitos brasileiros pela boa relação qualidade-preço, fica mais caro neste ano. A perversa combinação de peso forte em relação ao dólar, falta de energia barata e mão de obra e uvas mais caras, leva vinícolas chilenas a enxugar custos, apertar margens de lucro e subir o preço no atacado e no varejo. Mas o Brasil aumenta as compras no Chile, apostando que o consumidor acomoda o reajuste.

"O preço do vinho, em dólar, deve subir entre 5% e 7% neste ano", disse ao Valor Gerardo Arteaga, presidente da Corporação Chilena de Vinho (CVC), que reúne 400 empresas (produtores de uva e de vinho). Este aumento mantém a tendência de 2007, quando o preço subiu 7%, em média.

A Santa Rita, uma das quatro vinícolas do empresário Ricardo Claro, um dos mais poderosos do Chile, confirma o cenário de alta nos preços. Neste ano, diz o diretor de exportações da Santa Rita, Roberto Lecaros, a meta é exportar ao Brasil 30 mil caixas (com 12 garrafas cada uma) a um preço médio de US$ 40, no atacado. Em 2007 foram despachadas ao Brasil 20 mil caixas, a US$ 35 cada uma. O aumento, neste caso, é de 14%. O volume vendido ao Brasil ainda é pequeno em relação ao total de 1,3 milhão de caixas que a Santa Rita exporta, mas o consumo no Brasil vem crescendo a passos largos, colocando o país como o quinto maior comprador de vinho chileno no mundo.

Exportar tornou-se atividade fundamental para as vinícolas chilenas. Nos últimos 15 anos os chilenos organizaram-se, melhoraram a qualidade do produto e conseguiram até ultrapassar a Argentina como fornecedor mundial.

O mercado externo é o caminho natural diante do tamanho do mercado chileno, com 15 milhões de habitantes, e da mudança de hábito da população: o chileno que há quatro décadas bebida 50 litros de vinho por ano, bebe apenas 14 há oito anos. "O consumo da cerveja cresceu muito, em especial entre os jovens", diz Arteaga.

O mercado externo compra 70% da produção de vinho chileno, que foi de 850 milhões de litros em 2007, segundo dados da CCV. Essa aposta inevitável no exterior, no entanto, desenha um 2008 de contornos delicados, de despesas crescentes e margens apertadas.

O aumento dos custos de produção e, em especial, o câmbio, que não pára de subir, acompanhando os altos preços do cobre (principal produto exportado pelo Chile) vêm reduzindo os ganhos das vinícolas. Em 2002 um dólar custava 712 pesos, lembra Arteaga. Ontem, chegou a 454,70 pesos, segundo dados do banco central do Chile. Os custos de energia subiram - o gás que vinha da Argentina foi substituído pelo diesel. "E a mão de obra está três vezes mais cara", diz o presidente da CCV. Numa conta aproximada, observou, há seis anos gastava-se US$ 0,10 para produzir um quilo de uva. "Hoje gasta-se US$ 0,35."

Para agravar o cenário há ainda o risco da demanda nos Estados Unidos, que bebem cerca de 15% do vinho exportado pelo Chile, desacelerar neste ano. Para enxugar custos, vinícolas ampliam a mecanização e padronizam o que podem - um desafio para um setor que vende a imagem de produto elaborado artesanalmente.

"Custos maiores e câmbio nos obrigam a sermos mais eficientes. Procuramos reduzir o tempo da produção", diz Lecaros. Além de mecanizar a colheita dos vinhos de preço médio - isso não acontece com a linha mais sofisticada, Casa Real, cujas uvas são colhidas manualmente -, a Santa Rita está eliminando o uso de rolhas diferentes para seus vinhos. "Usar rolhas iguais para diversos tipos de garrafas torna o processo de produção mais rápido", diz Lecaros. Essa padronização é aplicada, por exemplo, na linha 120, a mais barata da Santa Rita, cuja garrafa custa entre R$ 25 e R$ 35 no varejo brasileiro.

A Grand Cru, importadora de vinhos e distribuidora da Santa Rita no Brasil, já está reajustando os preços dos produtos vindos do Chile. A garrafa da linha 120, mais popular, que custava R$ 29, agora está em R$ 32 nos supermercados. Os aumentos, que oscilam de 8% a 10%, também chegaram à linha mais sofisticada Casa Real. Uma garrafa desta, cabernet sauvignon/2004, é vendida agora por R$ 297. "Mas há demanda para absorver este reajuste", diz Ana de Andrade, diretora de marketing da Grand Cru. O plano, ousado, para 2008 é elevar a compra de vinhos chilenos em 50%. Além da Santa Rita, a Grand Cru tem contratos com as vinícolas Altair, Leyda e Tabali, pertencentes ao empresário Guillermo Luksic, o mais rico do Chile.

No grupo Pão de Açúcar a fatia do Chile no total de vinhos vendidos chega a 25% - há 10 anos era de 10%. O gerente de vinhos e destilados importados Rodrigo Adura diz que aumentará as importações entre 15% e 20% neste ano.

Na visão de Arteaga, da CCV, o futuro passa, obrigatoriamente, por um aumento de produtividade, investimento em sofisticação (o consumo de vinho barato no mundo vem caindo) e concentração da maior parte do negócio nas mãos de poucas empresas. Atualmente, 60% das exportações de vinho é feita por 10 empresas.

Possibilidades de fusões e aquisições, portanto, estão no ar. Uma que está pesquisando o mercado chileno é a britânica Diageo, líder mundial em uísque e vodca. "Estamos olhando o mercado chileno para produzir vinho. Podemos comprar uma vinícola ou contratar a produção", diz o presidente da Diageo no Brasil, Alexandre Louro. Uma das metas do CEO mundial Paul Walsh é fazer da Diageo a maior empresa de vinhos do mundo.