Título: BES dobra para 6,74% a fatia no capital votante do Bradesco
Autor: Maria Christina Carvalho
Fonte: Valor Econômico, 14/02/2005, Finanças, p. C1

O terceiro maior banco português em ativos, o Banco Espírito Santo (BES), dobrou a participação no capital votante do Bradesco para 6,74%. Foi o maior investimento estrangeiro no setor financeiro desde que o ABN AMRO dobrou a aposta no mercado brasileiro e comprou o Sudameris, em abril de 2003. Ao longo de 2003 e depois disso, vários bancos estrangeiros deixaram o Brasil. A saída mais recente foi a do BNL e do Commerzbank, que acabam de vender as participações minoritárias no Unibanco. A exceção foi o HSBC, que comprou duas financeiras no ano passado, mas gastou menos do que os R$ 555 milhões empregados pelo BES, segundo cálculos do ING, com base na cotação atual de mercado.

A participação dos bancos estrangeiros no patrimônio líquido do sistema financeiro, que era de 25,79% em 2000 e atingiu 33,67% em 2002 e caiu para 24,34% no ano seguinte, segundo o Banco Central (BC). Em setembro passado, já estava em 23,8%, se forem considerados apenas os 55 maiores bancos, que representam 98% sistema. O responsável pelas operações do BES no Brasil, Ricardo Espírito Santo, disse que o banco ampliou a posição no capital votante do Bradesco como um "investimento de longo prazo. Acreditamos muito no potencial de crescimento do Bradesco e do Brasil", afirmou. A nova posição não altera o poder do BES no Bradesco: Espírito Santo continua participando do conselho fiscal do banco brasileiro; e seu primo, Ricardo do Espírito Santo Salgado, presidente do banco em Portugal, tem assento no conselho administrativo. Para o analista de bancos do ING, Pedro Guimarães, o BES fez uma aposta dupla: "Se o Brasil cresce, o Bradesco é um dos bancos que mais sai ganhando. Além disso, fez uma boa opção de investimento caso haja alguma proposta de compra". O analista acredita que o Bradesco, por ser o maior banco privado, é a melhor opção de aquisição para o estrangeiro que quiser conquistar fatia relevante no mercado brasileiro. Espírito Santo afirmou, porém, que não conta com essa possibilidade. "Não acredito em transferência de controle nesse caso". O BES tinha 3,58% do capital ordinário e 2,71% das preferenciais do Bradesco, equivalentes a 3,14% do capital total. Agora, passou a 6,74% do capital votante e reduziu a 0,02% as preferenciais, mas aumentou ligeiramente para 3,39% a participação no capital total. Espírito Santo disse que a compra das ordinárias foi feita gradualmente ao longo do último trimestre de 2004. Ao mesmo tempo, o BES foi vendendo as preferenciais. "Podemos perder um pouco em liquidez, mas o valor econômico das ordinárias é melhor a longo prazo", explicou. Considerando o preço médio do papel naquela época, uma fonte de mercado calculou que o banco português gastou cerca de R$ 350 milhões em suas compras. Espírito Santo lembrou, porém, que, como houve troca da participação em preferenciais por ordinárias, o efeito líquido pode ter sido nulo ou até positivo. Na sexta-feira, por exemplo, as preferenciais eram cotadas R$ 74,70; e as ordinárias, a R$ 65,00. Agora, o BES passou a deter 16,061 milhões de ações ordinárias do Bradesco, que valiam pouco mais de R$ 1 bilhão pela cotação da sexta-feira; e 43,8 mil preferenciais, valendo R$ 3,6 milhões. Os números são significativos até mesmo para o BES, que tem um patrimônio ligeiramente superior a 3 bilhões de euros e ativos totais de 46 bilhões de euros. Na apresentação dos resultados anuais do banco português, no início do mês, Espírito Santo Salgado já anunciou o aumento de participação no Bradesco ao mercado local, somente divulgada no Brasil na sexta-feira. Lembrou que a participação é cruzada porque o banco brasileiro tem 3% do capital do português, onde todas as ações são ordinárias. Além disso, os dois são sócios em um banco de investimento no Brasil, onde a participação portuguesa é majoritária, com 80% e a brasileira, de 20%. A participação cruzada do BES e do Bradesco nasceu em 2000, quando o banco brasileiro comprou o Boavista, cujo controle era dividido entre o banco português, o francês Crédit Agricole e o grupo Monteiro Aranha. O BES preferiu o pagamento em participação acionária para continuar com um pé no Brasil. Com o aumento da participação no capital votante, agora tem fatia maior do que a do espanhol Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (BBVA) que tem 5,03% do capital ordinário (e 5,02% do capital total), em uma operação semelhante, assumida quando o banco espanhol vendeu as operações brasileiras ao Bradesco, em 2003. Mas o controle do Bradesco continua detido firmemente pela Fundação Bradesco e pelo grupo de executivos e familiares do fundador, Amador Aguiar, reunidos na companhia de participações Cidade de Deus. O BES foi criado em 1920 mas tem origem em uma casa de câmbio fundada em 1869 pela família Espírito Santo. O controle saiu da família em 1975 quando o sistema financeiro português foi nacionalizado. Mas, quando foi reprivatizado, a família acabou comprando o controle de volta em leilão, em 1991.