Título: Oportunidades da crise nos Estados Unidos
Autor: Ribeiro , Hugo F. Silvestre
Fonte: Valor Econômico, 25/03/2008, Legislação & Tributos, p. E2

A queda do dólar e a grave situação da economia dos Estados Unidos, agravada pela crise hipotecária, podem parecer, à primeira vista, um verdadeiro caos financeiro. Contudo, tais indicadores também podem significar bons ventos para os investidores estrangeiros que desejem investir no mercado imobiliário americano. Sob a perspectiva da tributação nos Estados Unidos, há diversos caminhos pelos quais o investidor brasileiro pode tirar máximo proveito deste momento.

Primeiramente, o investidor brasileiro deve ter em mente a existência de três principais impostos relacionados à propriedade de imóvel nos Estados Unidos: o imposto sobre sucessão causa mortis (herança), o imposto de renda e o imposto de renda na fonte. Os dois últimos incidem quando da venda do imóvel ou da empresa que detém o imóvel.

O imposto sobre herança apenas representará alguma preocupação para o investidor brasileiro se ele mantiver a titularidade da propriedade em seu próprio nome. Neste caso, o espólio do investidor brasileiro estará sujeito à incidência do imposto a uma alíquota de até 45% sobre o valor do imóvel na data da morte do investidor. Assim, a melhor forma de reduzir - ou até mesmo de evitar - a incidência do imposto sobre herança é adquirir e manter a titularidade do imóvel através de uma empresa ou de um trust. O trust é uma entidade criada e existente sob os princípios do direito anglo-saxão, muito utilizado em estruturas de planejamento tributário e sucessão familiar.

Em geral, quando um investidor estrangeiro vende um imóvel nos Estados Unidos, ele está sujeito ao imposto de renda americano, a uma alíquota de até 35%. Entretanto, se o investidor brasileiro retiver a propriedade por mais de um ano e a venda de imóvel não for sua principal atividade, o ganho de capital auferido na venda da propriedade ficará sujeito à tributação favorecida para ganhos de capital a uma alíquota máxima de 15%. No entanto, o investidor brasileiro deverá escolher cuidadosamente a estrutura societária para investir no mercado imobiliário americano, posto que apenas certas estruturas gozam da alíquota favorecida de 15% para ganhos de capital.

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No que pertine ao imposto de renda na fonte, geralmente o comprador residente nos Estados Unidos deverá reter 10% do valor pago ao investidor estrangeiro e remetê-lo ao Internal Revenue Service, a Receita Federal americana. Este valor, contudo, poderá ser abatido do valor a ser pago pelo investidor brasileiro a título de imposto de renda quando da futura venda do imóvel. Dependendo da estrutura societária adotada para tal investimento, o imposto de renda na fonte também poderá ser evitado.

Além do investimento direto no mercado imobiliário americano, o investidor brasileiro também conta com outras duas importantes ferramentas tributárias: o trust de investimento imobiliário - Real Estate Investment Trust (REIT) - e a isenção para juros recebidos de investimento nos Estados Unidos - "portfolio interest exemption".

O REIT é uma empresa, fechada ou aberta, que investe diretamente no mercado imobiliário. O investidor brasileiro pode investir nos REITs de duas formas: comprando diretamente participações societárias ou através de investimento em fundos especializados no mercado imobiliário. Investir em um REIT é uma excelente forma de gerar dividendos e investir no mercado imobiliário com maior liquidez. Normalmente, REITs investem em shoppings, edifícios comerciais e residenciais, condomínios e hotéis.

Outra importante característica do REIT é o tratamento tributário favorecido, uma vez que terá isenção do imposto sobre a renda se distribuir a totalidade dos lucros aos seus acionistas, evitando, assim, uma dupla tributação do imposto de renda. Por outro lado, o acionista brasileiro estará sujeito a um imposto de renda na fonte a uma alíquota de 35%, cujo valor poderá ser compensado com o imposto de renda devido no Brasil em face da reciprocidade de tratamento existente entre o Brasil e os Estados Unidos. Além deste benefício fiscal, caso o REIT tenha mais de 50% da sua participação societária controlada por residente nos Estados Unidos ("Domestically Controlled REIT") e se o investidor brasileiro não possuir mais de 5% de participação societária em nenhum momento durante o ano em que o dividendo foi distribuído, o investidor brasileiro não será tributado na venda de sua participação no REIT.

Por fim, o "portfolio interest exemption" também se mostra uma ferramenta tributária bastante eficiente para o investidor brasileiro que queira investir nos Estados Unidos. Em geral, o investidor brasileiro está sujeito ao imposto de renda retido na fonte, a uma alíquota de 30%, sobre os rendimentos fixos, determináveis, anuais ou periódicos ("FDAP income"), tais como dividendos, juros, royalties, aluguéis, etc. Entretanto, com o propósito de atrair investimentos estrangeiros e permitir que residentes dos Estados Unidos pudessem obter empréstimos estrangeiros, o governo americano concedeu isenção do imposto de renda na fonte aos investidores estrangeiros que cumpram determinados requisitos, como, por exemplo, no caso em que o investidor brasileiro não possua mais do que 10% de participação societária na empresa que tome o empréstimo. Assim, o "portfolio interest exemption" também surge como uma excelente alternativa para o investidor brasileiro e para os fundos de investimento que queiram oferecer investimentos nos Estados Unidos.

Hugo Fleischman Silvestre Ribeiro é mestre em direito tributário pela Georgetown University e advogado do escritório Veirano Advogados atuando como associado estrangeiro da banca Greenberg Traurig em Miami

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