Título: Fazenda vê inflação perto da meta
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Fonte: Valor Econômico, 26/03/2008, Brasil, p. A3

Barbosa: ritmo de crescimento é compatível com meta de inflação O secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, traçou ontem um quadro positivo para a trajetória de crescimento e inflação da economia brasileira neste ano. Para ele, uma expansão de 4,5% a 5% do Produto Interno Bruto (PIB) é compatível com a trajetória de metas inflacionárias perseguidas pelo Banco Central (BC). Barbosa não vê necessidade de reduções adicionais dos juros para estimular a demanda, mas considera que o cenário atual também recomenda cautela quanto a um eventual aumento das taxas. "As expectativas do mercado apontam para uma inflação ligeiramente abaixo do centro da meta [de 4,5%] para 2008 e 2009, apesar da aceleração do crescimento", disse ele, atribuindo a alta de preços em 2007 a um choque de alimentos.

"Em alguns círculos, parece que o país está na iminência da hiperinflação", ironizou Barbosa, que participou ontem do seminário "Estratégias de Política Macroeconômica", promovido pela Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (EESP-FGV). O economista fez uma análise das perspectivas para a inflação, na qual destacou que a alta de preços de alimentos deve perder força no segundo semestre, fechando o ano na casa de 5% a 6% - nos 12 meses até fevereiro, eles subiram 11,3%. "A inflação dos preços administrados, por sua vez, deve continuar favorável, na casa de 3,5% a 4% ."

Os dois segmentos que exigem mais cautela, segundo ele, são o de produtos industriais e de serviços pessoais. No primeiro, a situação parece comportada, com a perspectiva de um câmbio estável e de forte penetração de importações, ainda que o crédito siga forte. A preocupação que existe aí é de alguma pressão de custos, como a que deve sofrer a indústria automobilística, devido a uma provável elevação das cotações do aço, avalia Barbosa. De qualquer modo, os preços de produtos industriais seguem abaixo da meta de inflação ou mesmo em terreno negativo.

No caso dos serviços pessoais (como cabeleireiro e empregada doméstica), o quadro é um pouco menos róseo, reconheceu Barbosa. O grupo, que havia subido 8,9% nos 12 meses até junho de 2007, perdeu força e caiu para 6,6% em outubro, na mesma base de comparação. O problema é que voltou a se acelerar, atingindo 7,9% em fevereiro. A alta pode refletir pressões de demanda, mas também mudanças estruturais na economia. "É uma mudança de preços relativos, que ocorre à medida que o país se desenvolve." Ele admite que é algo a ser monitorado, mas considera um fenômeno "perfeitamente administrável" se a inflação de alimentos se desacelerar.

O aumento do nível de utilização da capacidade instalada (Nuci) tampouco assusta Barbosa. "Em períodos de aceleração do crescimento, o Nuci aumenta e, à medida que a taxa de expansão se acomodar em um nível mais alto, a utilização de capacidade também de estabilizará em um patamar mais elevado."

Para ele, um fator que "recomenda cautela para um aumento do juro" é que as taxas estão em queda no exterior. Se os juros subirem aqui, o diferencial entre as taxas internas e externas aumentará mais. Os fluxos de capital tenderiam a crescer, "o que poderia provocar uma bolha especulativa com o real". Se rompida, a bolha poderia "eventualmente prejudicar o combate da inflação mais à frente", devido a uma eventual alta abrupta do dólar.

Barbosa, porém, fez questão de dizer que a Fazenda opera em sintonia com o BC, "apesar do clima de Fla-Flu que alguns analistas na imprensa criam entre as duas instituições". "Há divergências de opinião, mas há um clima de cooperação entre a Fazenda e o BC", disse, destacando que cabe à autoridade monetária definir se o crescimento é compatível com a meta de inflação. Na ata da reunião mais recente do Comitê de Política Monetária (Copom), o BC informou que cogitou elevar a Selic.

O secretário descartou que haja uma bolha no mercado de crédito. Os níveis comportados de inadimplência mostrariam isso. Barbosa disse que os prazos de financiamento devem ser decididos pelos consumidores e pelo mercado.

O diretor da EESP-FGV, Yoshiaki Nakano, também disse não ver uma bolha no mercado de crédito. "Há uma demanda reprimida por financiamentos no país", afirmou ele, que também participou do seminário. Nakano afirmou não ver necessidade para um aumento os juros, mesmo com a demanda aquecida. "O consumo cresce rápido, mas os investimentos também. Em algum momento, eles vão maturar." Uma alta dos juros tenderia a valorizar ainda mais o câmbio, ressaltou. O câmbio valorizado e suas conseqüências para as contas externas são o grande alvo das críticas de Nakano. Para ele, a rápida deterioração da conta corrente, que deve passar de um superávit de 0,3% do PIB em 2007 para um déficit de mais de 1% do PIB neste ano, é um sinal preocupante. Barbosa vê o atual déficit com mais tranqüilidade, acreditando que o fluxo de investimentos estrangeiros diretos pode financiá-lo.