Título: Investir 21% do PIB exige dobrar ritmo atual
Autor: Bouças , Cibelle
Fonte: Valor Econômico, 26/03/2008, Brasil, p. A4

A meta embutida na "Política de Desenvolvimento Produtivo" do governo - de elevar para 21% do Produto Interno Bruto (PIB) a taxa de investimento da economia, conforme antecipado ontem pelo Valor - vai exigir uma aceleração do ritmo já forte dos investimentos privados e uma participação mais expressiva de projetos de infra-estrutura na composição desta taxa, especialmente àqueles previstos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Nos últimos três anos, os desembolsos públicos e privados em máquinas, equipamentos e construção civil acumularam um crescimento de quase 30%, considerando a formação bruta de capital fixo (FBCF). Mesmo assim, em proporção do PIB, a taxa de investimento avançou apenas 1,7 ponto percentual, passando de 15,9% em 2005 para 17,6% no ano passado. Atingir a nova meta exige dobrar, no mesmo período de três anos, esse ritmo e evoluir 3,4 pontos do PIB.

Para David Kupfer, professor e coordenador do Grupo de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a elevação dos investimentos dependerá de sinais claros de que a economia manterá seu ritmo de expansão nos próximos anos. Dependerá também de aumento dos desembolsos para a expansão do setor de infra-estrutura e energia, combustíveis para que não haja risco de desabastecimento às demais indústrias de transformação. "Desde que o quadro macroeconômico permaneça favorável e as exportações não retrocedam muito em função do cenário internacional, as metas da política industrial tendem a ser atingidas."

Miguel Bruno, coordenador do grupo de análise e previsão da diretoria de estudos macroeconômicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), considera exeqüível a proposta de política de estímulo à produção industrial. Ele adverte, contudo, que a meta de elevação dos investimentos em formação bruta de capital fixo ao equivalente a 21% do Produto Interno Bruto (PIB) - em 2007 essa relação foi de 17,5% - dependerá da adoção de medidas que estimulem os investimentos privados.

Para o economista, a taxa de investimento deveria situar-se em torno de 25% do PIB para possibilitar ao país um crescimento sustentável sem pressões inflacionárias. Ele cita como alternativas para estimular os investimentos privados a definição de incentivos fiscais e a desoneração tributária para que bancos e investidores elevem a oferta de crédito às indústrias.

"O dilema atual do Brasil é a concorrência entre aplicações de curto prazo e investimentos em ativos produtivos", afirma Bruno. Para o economista, conspiram contra o avanço dos investimentos as incertezas sobre as taxas médias de câmbio e juros no longo prazo. "Hoje não se sabe nem qual será o câmbio do ano que vem. Mas o governo pode facilitar esse ambiente oferecendo mais garantias e vantagens ao investidor que decidir imobilizar seu capital", afirma.

Duas opções, segundo o economista, seriam criar taxas diferenciadas para operações de investimentos em formação de capital fixo e implantar parcerias público-privadas. "Os liberais são contrários, mas acredito que o governo deveria ter uma atuação mais efetiva para estimular a expansão econômica. É o que é feito na China, na Índia e em outros países que crescem a taxas altas."

Júlio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), considerou modestas as metas estabelecidas pelo governo para a produção industrial até 2010. De acordo com o economista, a alta dos investimentos em 3,5 pontos percentuais dentro de três anos exigiria um crescimento da economia de 11% no período. "Crescer 11% é ser o aluno nota seis. Dá para passar, mas está longe da glória."

Para Almeida, a proposta de política industrial soa mais como uma sinalização do governo ao mercado de que está interessado em atrair mais investimentos. Ele considerou positiva a decisão do governo em desonerar os investimentos em capital, e a reunião de recursos do BNDES e do Ministério do Desenvolvimento em uma política sistematizada.

Fernando Sarti, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) também recebeu com otimismo a proposta do governo federal. Ele defende, no entanto, a definição de uma política mais próxima entre Banco Central e BNDES. "O investidor privado só apostará na formação bruta de capital fixo se houver a percepção de que a demanda no mercado interno permanecerá em ascensão. Uma elevação na taxa de juros, por exemplo, pode desestimular o avanço da demanda e ter um efeito contrário ao que se pretende com a política industrial", avalia.

O ex-secretário da Fazenda paulista Yoshiaki Nakano mostra ceticismo quanto à eficiência de uma política industrial no país. Ele evita comentar as medidas em discussão no governo, por não conhecê-las, mas diz que seria "infinitamente mais eficiente" ter uma taxa de câmbio competitiva, que estimule todos os segmentos da economia. (Colaboraram Denise Neumann e Sergio Lamucci, de São Paulo)