Título: Pimentel arregimenta apoio para enfrentar PT
Autor: Moreira , Ivana
Fonte: Valor Econômico, 26/03/2008, Política, p. A11

Emplacar uma aliança com o PSDB do governador Aécio Neves está dando mais trabalho do que previa o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT). O prefeito não esperava que a direção do partido fosse convocá-lo para justificar a aliança com os tucanos para a disputa na capital mineira. Pimentel, apesar do susto, segue confiante de que conseguirá, no fim das contas, sair vitorioso.

Contribuem para o raciocínio do prefeito vários fatores, inclusive a falta de um nome do PT realmente forte para sucedê-lo. As conversas com Aécio Neves só começaram a evoluir, no ano passado, depois que o nome do ministro Patrus Ananias - petista considerado imbatível em BH - foi descartado pelo próprio ministro, que tem ambições maiores do que voltar à prefeitura da capital. E só depois que o assunto foi discutido com o presidente Lula.

Pimentel sabia das resistências que enfrentaria no PT e procurou avaliar, junto com o presidente, até onde poderia avançar. Lula avisou que não se envolveria pessoalmente na defesa de uma aliança com Aécio mas deu carta branca ao prefeito para abrir negociações. Lula conversou sobre o assunto também com Aécio.

A avaliação de Pimentel, com a qual concorda a maior parte do diretório municipal, é de que o PT corria o risco de sair derrotado nessas eleições apesar dos 16 anos à frente da administração e da gestão bem avaliada de Pimentel. Não há outro nome, além de Patrus, realmente forte no PT - ou na base aliada - que possa garantir a vitória. Do outro lado, o do PSDB e seus aliados, também não há um nome poderoso. Mas há um cabo eleitoral de peso, que é o governador Aécio Neves.

Qualquer politico mineiro, de qualquer legenda, sabe o quanto é difícil emplacar no Estado uma campanha que vá contra o "projeto Minas", o movimento para recolocar o Estado no centro das decisões nacionais personificado por Aécio Neves. A alternativa apontada por Aécio, com apoio dos dois a um nome de um terceiro partido, o PSB, surgiu como a melhor saída. Pesquisas qualitativas encomendadas por Aécio mostraram que a população aprovaria candidatura que contasse com o apoio do prefeito e do governador.

Para Pimentel, é melhor dividir os louros de uma campanha vitoriosa com Aécio do que ser derrotado por ele. Uma eventual derrota jogaria por terra suas chances de disputar o governo do Estado em 2010. Por isso, a aliança com Aécio neste momento - implique ou não num compromisso de apoio mútuo em 2010 - é estratégica. Patrus Ananias compreende bem esse cenário e sabe do risco real para o PT. Em conversas reservadas com Aécio, o ministro deixou claro que não discorda da tese de convergência e sim da forma como foi conduzido o processo - que excluiu ele próprio, outro possível candidato ao governo do Estado pelo PT, e fortaleceu Pimentel.

Tivesse Patrus aparecido como um dos protagonistas da negociação, ao lado de Pimentel, o assunto talvez já estivesse superado no PT. É o que pensam políticos envolvidos nas negociações. Para justificar sua resistência, o ministro tem dito que o problema é a escolha do nome do secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Márcio Lacerda, recém filiado ao PSB. "É pura picuinha, fosse qualquer outro nome ele estaria reclamando", diz um político que participa das articulações.

Embora exista a possibilidade de o nome acabar sendo outro, numa manobra para aplacar os ânimos, Pimentel e Aécio deverão lutar contra isso. Em Lacerda, o governador tem um nome de sua confiança, com fama de bom administrador. Pesa ainda o fato de que Lacerda é o nome de apoiado pelo ex-ministro Ciro Gomes, aliado estratégico para os dois políticos mineiros. Ciro não vê outro nome apropriado no PSB de Minas.

Ontem, Pimentel preferiu não falar com a imprensa sobre o resultado da reunião em Brasília. Por meio da assessoria, distribuiu uma nota na qual declara ter recebido com naturalidade e respeito a decisão da direção. "Entendo que não houve qualquer proibição ou impedimento à tese que defendo em Belo Horizonte, de uma aliança liderada pelo PSB e que inclui no arco de apoio o PSDB, partido do governador Aécio Neves, que compartilha comigo esta idéia", afirmou o prefeito.

Segundo Pimentel, a cautela adotada pela direção, ao solicitar que as alianças em municípios maiores sejam examinadas pelas instâncias estaduais e nacional é perfeitamente "compreensível". Convocado, informou, atenderá prontamente. "Nossa construção política em BH é totalmente compatível com a orientação nacional do PT", disse. "Estou confiante que nossa tese será vitoriosa."

Questionado sobre a decisão da direção do PT, Aécio Neves se esquivou da polêmica. Disse que não lhe cabe comentar decisões internas de outros partidos. Reservadamente, porém, demonstrou continuar otimista. "É uma relação ganha-ganha", tem dito o governador para argumentar que o PT mineiro colherá frutos da aliança tanto quanto ele.

A articulação de uma aliança com o PT para a sucessão de Pimentel, em torno de uma candidatura de um terceiro partido, garantiu a visibilidade esperada por Aécio. Seu maior objetivo era projetar-se nacionalmente com um discurso novo, de convergência, numa direção contrária à que costuma tomar o governador de São Paulo, José Serra. E não tem dúvida de que conseguiu.

O mineiro entendeu que precisava ser mais agressivo no jogo presidencial depois que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) deu como certa a candidatura de Serra em 2010. Pressionado pelo risco real de ser atropelado, Aécio viu na articulação uma forma de mostrar ao PSDB que continua sim no páreo, com um discurso que não pode ser desprezado. O mineiro está convencido de que será muito difícil vencer em 2010 sendo o "anti-Lula". Se Serra é claramente esse "anti-Lula", ele poderá ser o que vem chamando de "pós-Lula", o nome capaz de construir algo melhor a partir da herança deixada pelo presidente.

Se a aliança em BH for aceita pelo PT, tanto melhor. Mas a possibilidade de derrota não tira o sono do governador. O tucano já fez seus cálculos e concluiu que não tem o que perder. Pelo contrário. Para ele, terá valido a pena. Aécio não precisou enfrentar desgaste no PSDB. Muitos sentiram-se incomodados com sua movimentação - incluindo Serra - mas mantiveram-se calados.

Além da projeção na mídia, Aécio conseguiu aproximar-se de lideranças com as quais não tinha muito contato, inclusive no PT. O que lhe é útil na construção da identidade que almeja, a de grande conciliador, capaz de reunir leque de apoios mais amplo do que faria Serra.

É Pimentel que tem mais a perder caso a aliança seja vetada. Depois do desgaste com lideranças do PT, certamente teria seu prestígio enfraquecido na legenda. Até segunda-feira, quando terá de se justificar perante a Executiva, o prefeito terá muito trabalho de bastidor. Pretende colocar todos seus aliados em campo para a defender a aliança. Entre os petistas com quem espera contar está até o ex-ministro José Dirceu.