Título: OEA também vai ficando para trás
Autor: Marcos Strecker
Fonte: Valor Econômico, 11/02/2005, EU & FIN DE SEMANA, p. 10/15

Prisões, acusações de corrupção e mandatos interrompidos. Parece inconcebível um enredo como esse nas sérias entidades multilaterais internacionais, mas não na Organização dos Estados Americanos (OEA), que passou por todo tipo de turbulência nos últimos dois anos. O último secretário-geral da OEA, Miguel Angel Rodríguez, ex-presidente da Costa Rica, está preso no país por acusações de corrupção. Eleito em setembro de 2004, Rodríguez cortou salários e cargos de direção na organização, logo ao assumir, para ajustar os gastos da OEA ao orçamento. Um mês depois, um ex-integrante do governo de Rodríguez na Costa Rica, José Antonio Lobo, fez acusações de pagamento de propina ao presidente pela empresa francesa de equipamentos Alcatel. Rodríguez admite apenas ter recebido um empréstimo de US$ 140 mil de Lobo para o financiamento de sua campanha para a OEA. Foto: Magdalena Gutierrez/Valor

Na ONU, Kofi Annan lamenta-se por um ano caracterizado pela desagregação de princípios e ações, cenário que não sugere melhores dias à frente; na OEA, Miguel Angel Rodríguez (abaixo) não chegou a esquentar cadeira, retirado da secretaria-geral e preso sob a acusação de receber suborno A eleição do novo secretário ainda não tem data marcada, mas provavelmente ocorrerá em março. Três candidatos disputam o cargo: Francisco Flores, ex-presidente de El Salvador (que tem apoio dos EUA), e os ministros Luis Ernesto Derbez (México) e José Miguel Insulza (Chile). Em meio ao imbroglio administrativo, a OEA não foi lembrada como alternativa para mediação da crise recente entre a Venezuela e a Colômbia e praticamente não se envolveu na situação do Haiti após a derrubada do presidente Jean Bertrand Aristide. Criada para estimular a democracia, a OEA passou a ser vista com desconfiança por alguns países da região, especialmente o Brasil, desde o envolvimento do ex-secretário César Gavíria na crise política venezuelana. Pouco depois de uma tentativa de golpe para derrubar Hugo Chávez, Gavíria deu declarações favoráveis ao governo provisório, acompanhando os EUA. Chávez retomou o poder com apoio popular e desde então um grupo de países, que inclui o Brasil, vem intermediando a negociação entre o governo e a oposição. A OEA está incluída na mediação, mas a parcialidade do ex-secretário reduziu a confiança na organização. O ex-secretário João Baena Soares acha que a organização tem tido uma atuação "tímida" por causa da situação de troca de comando e interinidade do secretário atual, Luigi Eunadi, mas não acredita que a credibilidade da OEA tenha sido arranhada. Baena Soares lembra a importância da intervenção da OEA em guerras civis na América Central durante a década de 1980 e na consolidação de democracias no continente. Enquanto a reforma nas organizações internacionais mais políticas, como a ONU e a OEA, ocorre num ritmo mais lento, as instituições econômicas multilaterais criadas pelo acordo de Bretton Woods têm sido mais ágeis nas mudanças. O Fundo Monetário Internacional (FMI) nunca mudou as receitas de ortodoxia econômica que recomenda aos países em crises financeiras. Mas depois de fortes críticas sofridas durante o gerenciamento da crise da Ásia, em 1997, tornou-se mais aberto à discussão de soluções para as crises financeiras que considerem as características específicas das crises e das economias. O contágio de crises financeiras de um país emergente para outro forçou o Fundo a ser um pouco mais flexível na formatação dos pacotes de ajuda. A falta de transparência das discussões internas no FMI diminuiu muito com a criação do Internal Evaluation Office (IEO), que divulgou relatórios públicos sobre o gerenciamento de diversas crises pelo Fundo. Um dos primeiros comparou as políticas fiscais aplicadas por recomendação do Fundo em diversos países da Ásia e no Brasil. As mudanças no Banco Mundial são mais lentas, mas a gestão do presidente James Wolfehnson tornou a instituição mais aberta às críticas de entidades da sociedade civil. O banco também começou a adotar regras para incentivar a transparência, reduzir a corrupção e exigir padrões ambientais e de relações trabalhistas nos projetos que financia. O maior problema nas instituições de Bretton Woods é a representatividade dos países. Como controlam grandes volumes de recursos, o FMI e o Banco Mundial continuam concentrando poder de voto nas mãos de países desenvolvidos, refletindo a proporção das economias no pós-guerra. Só recentemente o poder de voto começou a ser rediscutido, após anos de pressões de países em desenvolvimento. Mas o que está provocando a revisão é a mudança de proporção entre economias de países ricos. O crescimento das economias dos EUA e da China, comparadas às européias, tornou as cotas desatualizadas. (T.B.)