Título: Associação entre Petrobras e PDVSA tem baixo interesse comercial
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Fonte: Valor Econômico, 28/03/2008, Brasil, p. A9

O projeto de associação entre Petrobras e a PDVSA na refinaria de Pernambuco e no campo venezuelano Carabobo, tem uma série de perguntas ainda sem resposta pronta. Entre elas, a motivação que a Petrobras teria, hoje, para investir minoritariamente na exploração de petróleo ultra-pesado na Venezuela em troca de uma participação relevante da PDVSA em uma refinaria no Brasil para onde irão 100 mil barris/dia de petróleo venezuelano que correspondem a 50% da capacidade de processamento da planta de Pernambuco.

Para a Venezuela os ganhos são óbvios já que ela precisa de mercados que absorvam suas grandes reservas de petróleo. E como ainda depende em grande parte do mercado americano, a companhia vem fazendo esforços para ganhar consumidores mais ao sul, investindo em projetos de construção, ampliação e mesmo reativando refinarias na Nicarágua, Dominica, Equador, Jamaica e Cuba. A estratégia é mencionada em uma nota divulgada pela PDVSA, em conjunto com o governo Bolivariano da Venezuela e o Ministério Popular de Energia e Petróleo, como uma mudança importante. "Nunca um barco com petróleo venezuelano virou para o Sul, éramos colônia sujeita aos grandes interesses do Norte e a Venezuela se converteu em monoprodutor", diz a nota, atribuindo as palavras ao presidente Hugo Chávez.

Outro ponto intrigante da associação - que ainda não foi concretizada - é que ela permitirá o acesso da Venezuela ao mercado brasileiro de combustíveis logo depois de movimentos da Petrobras, via aquisições, como da Ipiranga e quem sabe, da Esso, para aumentar sua presença na distribuição e barrar justamente a entrada da PDVSA nesse rico mercado.

A Petrobras se esforça em público para dar um tom meramente comercial às negociações. Em comunicado, informa que "prosseguirá com seus estudos sobre a opção de participação societária de até 10% no projeto de exploração e produção de petróleo pesado no campo de Carabobo 1, na Faixa do Orinoco, no qual a PDVSA terá participação acionária não inferior a 60%". Paralelamente, a estatal venezuelana aproveitou o encontro entre os presidentes Lula e Chávez para dar um tom fortemente político à construção da refinaria.

Originalmente, a associação das duas estatais teriam participações semelhantes nos dois projetos, a empresa anfitriã com 60% e a outra com 40%. Ao longo das discussões, a Petrobras fez várias descobertas de óleo pesado e leve no Brasil e ampliou projetos relacionados à industrialização de óleo pesado nacional, como é o caso do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) e da futura refinaria "premium", de 500 mil barris/dia, que será construída até 2015 em local ainda a definir.

Do ponto de vista só empresarial, a evolução dos fatos levou a Petrobras, nos bastidores, a tratar Carabobo e a associação em Pernambuco como não mais prioritários. Tanto é que os investimentos feitos até agora na refinaria são exclusivamente da estatal brasileira.

Foi então que a questão política passou a falar mais alto. Para o Brasil, o projeto de petróleo Brasil-Venezuela passou a ser mais do interesse estratégico dos dois países do que da Petrobras. A integração sul-americana, mote principal de Hugo Chavez no plano internacional, é também uma prioridade do governo brasileiro. Neste sentido, uma associação entre as duas maiores empresas do continente sul-americano traz uma simbologia dessa integração que até o momento parece transcender o interesse puramente comercial e estratégico da Petrobras.

Basta ler os comunicados do governo venezuelano, via PDVSA, sobre a parceria com a Petrobras para perceber que os interesses comerciais passam longe. A ênfase é política. O comunicado de quarta-feira, traz "pérolas". Diz que a visita de Chávez pode ser considerada "um novo impulso nas relações bilaterais para que os dois países e os demais da região possam construir um pólo de poder mundial para conseguir o equilíbrio do Universo, como almejava Bolívar".

Em outro comunicado divulgado também na quarta, a Venezuela afirma que a refinaria Abreu e Lima é parte de sua proposta de aliança para impulsionar a formação de um pólo energético sul-americano. Em outro documento, dizem que "durante séculos, todos os governantes do continente ficaram de costas uns para os outros e ficaram admirando o mundo rico", enfatizando em seguida a importância da integração continental.