Título: Economia capixaba muda de perfil e cresce com o petróleo
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Fonte: Valor Econômico, 28/03/2008, Especial, p. A20

Honório Ramos Neves, da Flexibrás: empresa opera base de navios da Petrobras, que lançam tubos e cabos no mar Em 1978, o mecânico capixaba Salvador Turco resolveu abrir mão da tentadora tarefa de cuidar das tubulações por onde circulava o chocolate na fábrica da Garoto para arriscar um vôo próprio: montou uma pequena serralheria no mesmo município de Vila Velha (ES), conhecido por sediar a indústria de guloseimas. A União Engenharia vingou e progrediu, chegando ao começo de 2005 com cerca de 120 empregados. Foi então que, empurrada pelas obras do setor petróleo e da siderurgia no Estado, ganhou dimensões que seu fundador dificilmente imaginara algum dia - tem hoje 1,5 mil empregados e caminha para 2 mil ao longo deste ano. Produz bens de capital sob encomenda e faz montagens industriais.

A história da União tem o charme do "self made man", mas casos de expansão industrial, e mais diretamente na indústria pesada, não são incomuns na economia do Espírito Santo nos últimos três anos. Na base desse movimento estão as recentes expansões do setores siderúrgico, de mineração e, especialmente, de petróleo no Estado.

De sexto maior produtor de óleo do país em 2004 (cerca de 44 mil barris/dia), o Estado já está em segundo lugar, com 120 mil barris/dia, devendo chegar a 200 mil no final do primeiro semestre; a 220 mil no final deste ano e a 500 mil barris por dia em 2010, segundo o planejamento da Petrobras. Além disso, a produção de gás natural, que era de apenas 1,3 milhão de metros cúbicos (m3) por dia no ano passado, já está na casa dos 5 milhões de m3 e deve alcançar 20 milhões em dois anos.

A indústria extrativa mineral, empurrada pelo petróleo e gás, e a metalurgia básica, comandada pelo aumento de 50% na capacidade da usina da ArcelorMittal Tubarão, antiga CST (de 5 milhões para 7,5 milhões de toneladas de aço por ano), fizeram a indústria capixaba crescer 7,5% no ano passado, acima dos 6% da média brasileira medida pelo IBGE e abaixo apenas dos 8,6% de Minas Gerais.

Na semana passada, direto da China, Turco discutia, por telefone, com seu sócio Wagner Alves da Rocha, diretor industrial da empresa, as especificações de uma nova máquina que estava comprando para modernizar o parque fabril da União. A empresa tem contratos para pelo menos mais três anos no ritmo atual de atividade, inclusive para clientes importantes fora do Estado, como a Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA). A União vai fabricar e montar dois gasômetros completos para a usina que o grupo alemão ThyssenKrupp está construindo no Rio de Janeiro.

Foi também ao observar o desenvolvimento da produção de petróleo no Estado que a multinacional italiana Prysmian (antiga Pirelli) decidiu, em 2004, pela instalação da sua fábrica de cabos umbilicais (cabos gigantes para envio de facilidades, como energia elétrica, a poços submarinos) na área do porto de Vitória.

A empresa possui uma fábrica em Santo André (SP) que sofre limitações para o transporte até as bases portuárias das enormes bobinas com os cabos. "Tínhamos planos de fazer uma unidade à beira-mar para embarcar as bobinas direto nas embarcações (de apoio à indústria offshore). Decidimos por Vitória onde havia uma base da Petrobras e um embrionário desenvolvimento da produção de petróleo", disse Armando Comparato Júnior, presidente da Prysmian do Brasil.

A fábrica foi inaugurada em 2006, com investimento de R$ 80 milhões. É a única do grupo exclusiva para a fabricação de umbilicais para a indústria de petróleo e gás e tem capacidade para produzir até 400 quilômetros de cabos por ano. Idealizada para atender ao mercado interno, tem espaço suficiente também para exportar. São 140 empregados.

Segundo Comparato, quando a planta foi inaugurada, não houve problema para conseguir pessoal no mercado capixaba, mas em 2007, com o aquecimento da atividade na fábrica, houve dificuldades para reposição de empregados, um drama que exigirá do Estado e empresa crescentes investimentos em formação profissional nos próximos anos. Embora a planta da Prysmian seja nova, Comparato disse que o grupo já estuda sua ampliação.

Outra fabricante de tubos e cabos, a Flexibrás, do grupo francês Tecnip, já está concluindo a ampliação da sua fábrica, cuja primeira fase é de 1986. Com investimento de R$ 100 milhões a planta aumentou a capacidade de 250 para 400 quilômetros de tubos destinados, basicamente, à produção de petróleo e gás e à injeção de água nos poços. Este ano será concluída a obra com a construção de uma área para estocagem de bobinas de até 350 toneladas em um aterro na área do porto de Vitória.

"A expansão não pára nunca. Já estamos falando em novas máquinas. Os tubos são cada vez mais complexos, à medida que aumenta a lâmina d'água (distância da superfície ao fundo do mar). Começamos com 300 metros, estamos em 2.000 metros e já se fala em 3.000", explica Honório Ramos Neves, diretor-executivo da Flexibrás. Segundo ele, além da fábrica, a empresa opera também a base da Petrobras onde são carregados os navios que irão lançar os tubos e cabos no fundo do mar. Todo o conjunto empregava 800 pessoas, número que está subindo para 1.100 com a expansão da unidade.

O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), exercendo seu segundo mandato, avalia que, diferente do ocorrido em outras províncias petrolíferas do Brasil e do mundo, onde o petróleo passou praticamente sem deixar herança positiva, o seu Estado vai desfrutar melhor dessa riqueza passageira. "Tínhamos (quando começou o "boom" do petróleo) uma base econômica em processo de diversificação e o Estado estava organizado do ponto de vista fiscal", disse. Hartung é reconhecido hoje como responsável pela reorganização das finanças capixabas após um longo período marcado por uma crise aguda, pontuada por escândalos administrativos e denúncias de corrupção.