Título: Investimento menor deve frear a Índia
Autor: Range , Jackie
Fonte: Valor Econômico, 27/03/2008, Especial, p. A22

Uma provável recessão nos EUA, inflação em alta e aumento dos juros ameaçam derramar uma tempestade no crescimento da Índia. A grande economia que cresceu mais rápido no ano passado, depois da China pode, este ano, ver seu Produto Interno Bruto (PIB) desacelerar fortemente, embora para um nível com o qual outros países podem apenas sonhar.

A inflação, enquanto isso, rompeu o nível de tolerância mais alto fixado pelo Reserve Bank of India (RBI, o banco central do país), apesar dos juros altos. E os recentes números da produção industrial, inferiores aos que eram previstos, chocaram vários economistas, que agora têm ainda de levar em conta a piora do clima econômico mundial e o padecimento dos EUA.

"O crescimento ainda é satisfatório mas, apesar disso, acho que está em declínio", disse Dharma Kirti Joshi, principal economista do serviço de classificação de risco Crisil, com sede em Mumbai.

O governo indiano prevê crescimento de 8,7% no PIB este ano. O ministro da Fazenda, Palaniappan Chidambaram, disse este mês que o governo tomará todas as medidas fiscais e monetárias para controlar a inflação e manter a expansão próxima dos 9%.

Economistas do J.P. Morgan recentemente cortaram sua previsão de crescimento do PIB indiano no ano fiscal, que termina em 31 de março de 2009, de 7,5% para 7% e citaram o impacto de uma expectativa pior nos EUA.

Neste país de 1,1 bilhão de habitantes, muitos vivem na pobreza e são atingidos duramente pela mais leve inflação. A crescente classe média indiana também está sentindo o impacto. Tomando chá no Nehru Place, um movimentado shopping center de Nova Déli, os funcionários públicos Santosh e Poonam Kumar dizem que a inflação está tocando vários aspectos da vida deles, encarecendo até as viagens de riquixá. "Não dá para poupar muito atualmente. Às vezes nem consigo imaginar para onde vai o dinheiro", diz Kumar.

Alguns observadores esperavam que o forte consumo doméstico indiano pudesse isolar o país do mal-estar que está tomando conta de outros lugares, mas não foi o caso. "O que acontece globalmente afeta, sim, a Índia", diz G. Srivastava, chefe de política econômica da Confederação Indiana da Indústria. Ele salienta que mais de 41% do PIB da Índia está associado de alguma maneira ao exterior.

A Índia viu sua produção industrial nos três trimestres que terminaram em janeiro aumentar 8,7%, enquanto o índice foi de 11,2% no mesmo período um ano antes.

Alguns economistas dizem que o aumento dos juros determinado pelo banco central do país, para controlar a inflação, foi um grande fator de inibição na produção industrial. Na sua última reunião sobre política monetária, no fim de janeiro, o RBI manteve a taxa principal de juros em 7,75%.

Nos preços do atacado, a inflação está acima dos 5%, que é o limite mais alto no nível de conforto admitido pelo banco, e a expectativa é que suba mais por causa do aumento nos custos do petróleo e dos alimentos. "As chances de corte nas taxas estão diminuindo a cada dia", diz Joshi.

Um dos assessores da equipe econômica do primeiro-ministro disse recentemente que, como a inflação ultrapassou a zona de conforto, seria difícil para o RBI baixar os juros. O governo também já cortou algumas taxas de importação de alimentos para tentar reduzir a inflação.

Embora a medida traga um certo alívio para os consumidores no curto prazo, diz Joshi, não altera a probabilidade de o banco central manter os juros como estão. "No momento, é um exercício de apagar incêndio."

Com o crescimento começando a desacelerar, o investimento interno e estrangeiro na economia - que hoje está no nível mais alto já registrado - também deve diminuir, diz Joshi. "O cenário de expansão de investimentos não pode mais ser sustentado e, provalmente, atingirá seu pico em breve."

O mercado indiano de ações, que cresceu no ano passado, afundou com outros mercados da Ásia. O principal índice da Bolsa de Valores de Mumbai, o Sensitive 30 Index, ou Sensex, já caiu 24,66% este ano.

Os economistas estão na expectativa sobre o que o RBI vai dizer na sua próxima reunião de política monetária, em abril, e acompanham de perto o Índice de Produção Industrial, publicado mensalmente pelo governo.

Mas as empresas indianas ainda estão com saúde excelente. Ao analisar cerca de 4.000 delas, a Confederação da Indústria Indiana informa que o crescimento médio da receita no primeiro semestre do ano fiscal que termina em 31 de março foi de 16,2%. O lucro líquido cresceu na média de 30,2%. Esse fortalecimento vai provavelmente deixar as indústrias do país com dinheiro para investir.

Uma recessão nos EUA é uma boa oportunidade para elas, diz Ravi Venkatesan, presidente do conselho da Microsoft Corporation India, subsidiária da americana Microsoft. "A recessão, combinada com o dólar fraco, representa a melhor oportunidade para empresas da Índia estabelecerem uma presença forte nos EUA, comprando ativos a valores razoáveis."

Govind Negi, dono da Silicon Global Service, um centro de vendas e conserto de laptops, diz que ainda espera 30% de crescimento em suas vendas líquidas em 2008. Para tanto, espera que caiam os preços dos produtos que vende, como tecnologia da Dell, da IBM e da Toshiba. As vendas deste ano, no entanto, não têm sido boas até agora. Negi atribui parte disso ao mercado acionário, onde seus clientes perdem dinheiro. "Talvez agora eles estejam ficando mais cautelosos com seus gastos."