Título: Vaivém do juro
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 31/03/2008, EU & Investimentos, p. D1

O investidor que, com medo da volatilidade, tirou o pé das alternativas mais arriscadas neste começo do ano e migrou dos fundos de ações e multimercado para a renda fixa não conseguiu fugir da turbulência. Mais de 20 fundos concentrados em papéis de renda fixa prefixados ou ligados a índices de inflação deverão encerrar abril com prejuízos, como mostra o o Índice de Mercado Andima (IMA), referencial desses papéis . Essa perda ocorre porque o mercado passou a considerar como certa uma elevação dos juros em abril. Com isso, as taxas prefixadas subiram e os papéis antigos, com taxas mais baixas, perderam valor. Até a quarta-feira, alguns fundos de renda fixa chegavam a perder 2,68% em março, segundo dados do site Fortuna.

Durante o mês, aumentou no mercado a parcela de operadores que acredita na alta da taxa de juros já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, em meados de abril. A apreensão com o aumento disparou com a publicação do Relatório Trimestral de Inflação do BC. O texto diz que, para que a inflação continue abaixo da meta, de 4,5% neste ano, diante dos riscos que se apresentam, "cabe à autoridade monetária estar pronta para atuar de forma preventiva". Ou seja, subir os juros. A dúvida principal, portanto, é quanto a taxa Selic, hoje em 11,25% ao ano, deverá subir nos próximos meses.

O cenário de renda fixa ficou mais arriscado, ou seja, menos propício para a parcela mais conservadora dos investimentos, diz o diretor-executivo da BB DTVM, Arnaldo Vollet. "O mercado deverá oscilar mais com qualquer notícia, boa ou ruim." Segundo ele, várias incertezas foram adicionadas ao mercado, principalmente no que diz respeito à inflação. "Ninguém sabe se a alta vai acontecer ou não."

Como a rentabilidade dos fundos renda fixa e DI andavam bastante próximas, o investidor ficou com a impressão errada de que eles possuem o mesmo risco de mercado. Mas essa oscilação atual evidenciou que não, diz Marcelo Xandó, sócio da BCSul Verax Serviços Financeiros. O prêmio (taxa que os prefixados oferecem acima do juro futuro) estava cada vez menor até este mês. "Portanto, apostar nesses papéis já era arriscado."

No começo de março, a Letra do Tesouro Nacional (LTN), prefixada, com vencimento em janeiro de 2009, oferecia ao seu investidor um lucro anualizado de 11,82%. Na sexta-feira, esse mesmo título pagava 12,37%. Isso significa que o juro da Selic teria de subir para mais de 13% ao ano até janeiro para oferecer uma taxa média de 12,37% no período.

Claro que, se o cenário não engrossar de vez e o juro não subir nessa magnitude, esse papel e outros com vencimento mais curto estariam oferecendo hoje uma rentabilidade melhor em relação ao começo de março, observa David Cohen, operador de renda fixa do CR2. "Mas é claro também que essa alternativa também ficou mais arriscada." O investidor que apostar agora pode receber um juro maior, mas corre mais risco de o juro corrente subir além do que o projetado nessas taxas, alerta ele.

Assim, apostar hoje em uma taxa prefixada no curto prazo ou em um título atrelado à inflação (NTN-B, ligada ao IPCA, ou NTN-C, ligada ao IGP-M), beira a especulação. "O aplicador que se embrenhou nesse mercado já sofreu e poderá sofrer ainda mais", diz Ricardo Martins, da área de fundos de investimento da Concórdia. "A pressão inflacionária pode ser mais forte do que se acredita, o que pode levar o BC a subir ainda mais a taxa de juros."

Quem não suporta essa volatilidade no curto prazo deve agora tomar o rumo de um fundo DI ou curto prazo, comenta Vollet, da BB DTVM. Ele destaca que a captação nos fundos dessas categorias até cresceu mais do que a dos fundos de renda fixa e inflação no começo deste ano. Mas reconhece que, quem ficou no meio do caminho, entre o DI e o renda fixa, perdeu. Apesar da oscilação, Vollet diz que não houve muitos resgates nos prefixados ao longo de março.

Vollet acredita que, apesar de terem subido neste mês, os juros prefixados oferecidos pelos títulos que recheiam os fundos de renda fixa não subiram o suficiente a ponto de compensar o risco de alta maior do CDI, indicador do juro corrente e, portanto, superar o retorno dos fundos DI. Sem falar no risco, que aumento, lembra. "Para buscar um retorno acima do CDI, o gestor vai ter de correr mais riscos", diz.

Já Cohen, do CR2, acha que o mercado brasileiro reagiu com medo excessivo em março, tendo levado o juro futuro a um nível em que já valeria a pena especular. "O mercado foi muito além do que deveria", diz. "Mesmo que o BC suba os juros, de forma gradual, as taxas ainda são atraentes." Cohen acredita em uma alta na Selic de, no máximo, 1,5 ponto percentual até dezembro - que significaria o juro ficar abaixo dos 13% ao ano necessários para compensar a taxa atual pré.

Já nos títulos mais longos prefixados, há consenso de que o risco é alto demais. "Acima de 12 meses, o cenário externo começa a pesar mais na estimativa, o que torna o juro menos ponderável", comenta Cohen, do CR2.

O aplicador que optar pelo Tesouro Direto - sistema de negociação via internet de papéis federais - têm um cardápio variado de prazos e papéis prefixados e ligados a inflação. O governo oferece a possibilidade de pessoas físicas comprarem diretamente da Fazenda os títulos que recheiam os fundos. Por lá, era possível encontrar, na sexta-feira, uma LTN com rendimento de 13,45% com vencimento em 2010, uma NTN-C que renderia IGP-M mais 7,69% até 2011 e uma NTN-B, que entregaria IPCA mais 8,11% em maio de 2013.

Aplicando pelo Tesouro Direto, o investidor poderá sofrer com a mesma volatilidade que atinge os fundos se tentar vendê-lo antes do vencimento. Mas se mantiver o papel em carteira até a data do encerramento do título, não há risco de lucrar menos. O risco, nesse caso, seria de receber um retorno abaixo do juro médio do mercado até lá, ou corroído pela inflação se não for um papel atrelado a nenhum dos índices.

Para Martins, da Concórdia, para quem quiser arriscar, mais interessante seria investir em um fundo de renda fixa com gestão ativa, em que um profissional escolheria os melhores momentos para adquirir ou se livrar de cada papel e que iria renovando a carteira conforme os vencimentos. Nesse caso, porém, há o risco de o gestor errar os momentos de adquirir ou vender cada título. O investidor deve estar atento à estratégia adotada pelo gestor, no prospecto do fundo, além de verificar a taxa de administração cobrada, que pode comprometer o ganho extra.