Título: Vicunha consegue sair do prejuízo, mas ainda tem desafios
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Fonte: Valor Econômico, 01/04/2008, Empresas, p. B6

Ana Elwing, diretora financeira da Vicunha: "Nossa estratégia de consolidação deverá passar pela América do Sul" Foi com alívio que a direção da Vicunha Têxtil percebeu que conseguiu, em 2007, zerar as perdas acumulados nos dois anos anteriores. Afinal, o pequeno lucro de R$ 38 mil era o resultado de um profundo processo de reestruturação iniciado há pouco menos de dois anos. No período, a empresa saneou as finanças, modernizou a gestão, buscou novos nichos de mercado e fechou unidades de produção. E em meio à mudança, a fabricante teve que enfrentar a invasão de têxteis asiáticos mundo afora.

Apesar de se livrar do prejuízo de R$ 400 milhões, amargado em 2006, houve pouco tempo para comemoração. A empresa precisa se concentrar para resolver enormes desafios este ano: combater a concorrência asiática, que considera desleal, perseguir o lucro e se preparar para a consolidação global do setor têxtil, principalmente na produção de tecidos para moda jeans. "Queremos figurar entre os líderes mundiais", afirmou ao Valor Ana Elwing, diretora financeira e de relações com investidores da Vicunha Têxtil.

Desde meados da década de 90, os balanços da Vicunha alternavam prejuízos consideráveis e lucros modestos. O último resultado positivo da companhia foi em 2004, quando lucrou R$ 11 milhões. A venda da participação da família Rabinovich aos sócios pertencentes ao clã Steinbruch engatilhou a mudança de rumo da companhia. No fim de 2006, os sócios injetaram R$ 300 milhões na companhia, que também emitiu outros R$ 250 milhões em debêntures. Assim, conseguiu abater dívidas e ganhou forças para reestruturar as operações fabris, com o objetivo de baixar os custos de produção e fechar unidades. A última fábrica a ter sua atividade encerrada, na virada de 2007 para 2008, foi a de Simões Filho (BA), que produzia fios de algodão e polímeros têxteis.

A Vicunha já havia fechado as unidades de Paulista, em Pernambuco (confecção de vestuário de malha para exportação) e Americana, em São Paulo (fibra de viscose). Em comum, essas unidades eram as mais penalizadas com a concorrência dos produtos importados da Ásia, sobretudo da Indonésia, Tailândia e China. A empresa também partiu para novos nichos de mercados, como o desenvolvimento de tecidos de maior valor agregado e a produção de tecidos para estofamento de automóveis.

De acordo com Ana, a invasão asiática penalizou a Vicunha ao conquistar espaço no exterior - um quarto da produção da companhia é exportada - e também no mercado brasileiro. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), o déficit da balança comercial do setor salto de US$ 33 milhões em 2006 para US$ 644 milhões no ano passado. "Não conseguimos aproveitar o aquecimento do mercado interno", afirmou a executiva.

Além da valorização do real perante o dólar, Ana afirma que a indústria têxtil brasileira observa a prática de dumping em vários segmentos, como na fibra de viscose, no índigo, fios e nas confecções. A Vicunha, junto com outros fabricantes, já fez reclamações formais junto ao governo brasileiro para tentar conter a prática desleal. De acordo com informações do Ministério da Indústria e Comércio, as importações de fibras de viscose subiram de 1,8 mil toneladas, em 2004, para 18,1 mil toneladas no ano passado. A Vicunha é hoje a única produtora de fios de viscose das Américas.

Enquanto enfrenta a concorrência asiática, a Vicunha Têxtil está se preparando para dar corpo ao seu processo de internacionalização, iniciado no ano passado com a compra da fabricante equatoriana de denim La Internacional (por meio da holding Textilia) por US$ 30 milhões. Por enquanto, a fábrica tem como objetivo somente atender ao Pacto Andino (Colômbia, Peru, Venezuela, Equador, Bolívia e Chile), ainda sem utilizar a unidade como plataforma de exportação para outros países. "Nossa estratégia de consolidação deverá passar pela América do Sul", afirmou Ana. A direção da Vicunha já teria mapeado as companhias da região, de olho em oportunidades.

O setor têxtil mundial é bastante fragmentado, sem grupos de grande porte. A diretora da Vicunha aposta num forte movimento de fusões e aquisições a partir deste ano. Alguns passos já foram dados nesse sentido. É o caso da fusão da espanhola Tavex com a brasileira Santista Têxtil, que hoje é uma das maiores fabricantes de denim do mundo. A Vicunha, segundo Ana, é também considerada uma das maiores fabricantes globais de tecido para jeanswear, com uma produção de cerca de 150 milhões de metros de tecido por ano. Fica atrás apenas da chinesa Wequiao e da Izko, da Turquia. Com a consolidação do setor, as companhias devem ganhar poder de barganha".

Hoje, a Vicunha possui nove unidades fabris (quatro no Ceará, uma no Rio Grande do Norte e quatro em São Paulo). A sede da empresa fica na zona leste da capital paulista, onde funcionava uma das fábricas e também serve de showroom. Até o fim do ano, os escritórios serão transferidos para uma área nobre da cidade por que o local se transformará em condomínio residencial.