Título: Grupo chega a acordo sobre expansão de cotas agrícolas
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 04/04/2008, Brasil, p. A6

Um grupo de seis membros-chaves da Rodada Doha - Brasil, Estados Unidos, União Européia (UE), Japão, Austrália e Canadá - alcançou ontem um acordo sobre como assegurar aumento das exportações de produtos considerados sensíveis, um ponto essencial para tentar avançar a negociação na Organização Mundial do Comércio (OMC). O entendimento entre os seis foi seguido de um racha no Mercosul e resistência dos outros exportadores e importadores agrícolas que não participaram das discussões.

"É mais um passo no processo, mas falta ainda discutir de maneira aprofundada com os outros países", afirmou o principal negociador comercial brasileiro, embaixador Roberto Azevedo.

O entendimento envolve a metodologia para garantir a expansão de cotas (determinado volume com tarifa menor) para produtos a serem designados como sensíveis. É uma compensação pelo corte tarifário menor a que esses produtos serão sujeitos como parte de um acordo da Rodada Doha. O atual texto do mediador para um acordo agrícola, Crawford Falconer, sugere que os importadores aumentem os volumes das cotas tarifárias de produtos sensíveis entre 4% e 6%, medido pelo consumo doméstico desses produtos.

Diante do impasse entre exportadores e importadores sobre a metodologia, os seis misturaram opções na mesa para a expansão das cotas ser "ambiciosa, mas flexível", segundo um negociador. Com isso, fica garantido mais volume ao exportador, mas o importador terá mais flexibilidade para dividir a cota.

Na prática, haverá um contrapeso para o problema de "diluição" causada pela inclusão de produtos processados no cálculo do consumo doméstico. Exportadores argumentavam que a inclusão de processados - como chocolates na categoria de açúcar ou cereais para o café da manhã como trigo - reduziria o volume das cotas para commodities básicas de exportações.

Agora, serão excluídos certos produtos processados do cálculo, sobretudo os da categoria de cacau e produtos de chocolate para calcular a cota de açúcar. E a UE poderá fixar não mais só uma, como hoje, mas duas cotas para açúcar, uma para o produto refinado e demerara e outra para os produtos com alto conteúdo de açúcar. Esse modelo pega todos os principais produtos de interesse exportador do Brasil, como carnes bovina, de frango, de porco etc.

Em outra concessão para a UE, o acordo estabelece que uma ampla percentagem da expansão das cotas também para cereais seja reservada a produtos básicos em vez de produtos processados. Para o açúcar, o máximo permitido para produtos processados será 10%.

Negociadores estimam que o acerto, fechado às 4h30 da manhã de ontem, fica próximo do modelo defendido pelo Brasil. Já a Argentina, que não faz parte dos seis, foi uma das primeiras a reagir ontem cedo. "Em princípio é uma saída pragmática, mas só para alguns membros que já receberam compensação através dessa negociação", disse ao Valor o embaixador Alberto Dumont. "A Argentina não está sendo compensada."

Além da suspeita de que países como o Brasil já teriam garantido sua parte, Buenos Aires quer tempo para digerir o complexo texto. Dumont notou que produtos como frutas e verduras não estão cobertos, além de outros pontos considerados insatisfatórios. O Uruguai também reagiu e quer saber o que afinal vai levar no acordo. "Quem não participou está reclamando", confirmou um participante do restrito grupo.

Um compromisso sobre a expansão de cotas tarifárias para produtos sensíveis é visto como a porta para resolver outras questões da negociação agrícola, como os tamanhos dos cortes das alíquotas. E um acordo na agricultura pode facilitar um entendimento nas áreas industrial, de serviços e regras (antidumping, subsídios).

A movimentação em Genebra é grande. Ontem, um grupo de exportadores e importadores se reuniu até às 23 horas. Novas reuniões estão marcadas para até a próxima sexta-feira, para tentar fechar um acordo entre todos. O diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, admitiu ontem que uma miniministerial - com cerca de 30 ministros e não com os 151 países-membros - pode ocorrer em meados de maio, em vez do fim deste mês, como ele mesmo estimou inicialmente.

Mas a expectativa é de os ministros só virem a Genebra realmente para a barganha final dos acordos agrícola e industrial. Curiosamente, serão os mesmos ministros que insistem que falta decisão política e que a bola está com os presidentes e não com eles.