Título: Oposição manobra e consegue aprovar convocação de Dilma
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Fonte: Valor Econômico, 04/04/2008, Política, p. A7

Depois de uma sucessão de reveses, a oposição conseguiu ontem importante vitória sobre a base governista no Senado. A Comissão de Infra-Estrutura (CI), sob a presidência do tucano Marconi Perillo (GO), aprovou a convocação Dilma Rousseff (Casa Civil). Ela tem a prerrogativa de marcar a data, num prazo de 30 dias, sob pena de incorrer em crime de responsabilidade.

Oficialmente, a ministra prestará esclarecimentos sobre as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Mas a oposição pretende questioná-la sobre a suposta montagem, no âmbito da Casa Civil, de dossiê com dados sigilosos de gastos do governo Fernando Henrique Cardoso. Nem que seja para levá-la ao constrangimento de negar-se a falar sobre o assunto.

A CI já tinha aprovado em 2007 convocação de Dilma para falar sobre a obra da usina hidrelétrica de Belo Monte (PA). Mas Perillo não havia enviado a convocação, em atendimento à líder do PT, Ideli Salvatti (SC), que prometera levar a ministra espontaneamente. Como isso não aconteceu, o tucano enviou ontem mesmo a Dilma ofício com as duas convocações.

"Está claro que o governo não quer discutir a questão dos cartões corporativos, muito menos do dossiê. Na CPMI, não conseguimos aprovar, mas a convocação da comissão ela não poderá descumprir. Os senadores poderão perguntar livremente, caberá a ela responder ou não", disse Perillo.

O ministro da coordenação política, José Múcio Monteiro, afirmou que a base governista deve "zelar para que a ministra Dilma Rousseff não passe por constrangimentos" durante sua participação na comissão de Infra-estrutura. Múcio foi diplomático ao dizer que "não combina com o Senado misturar assuntos técnicos com o jogo político".

A convocação de Dilma foi aprovada em votação simbólica, numa comissão sem governistas. A aprovação do requerimento - de autoria de Flexa Ribeiro (PSDB-PA) - foi possível graças ao cochilo da base aliada do Palácio do Planalto e à mobilização dos senadores de PSDB e DEM. Os governistas foram pegos de surpresa. O líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), correu à CI, assim como outros integrantes da base, ao saber da aprovação do requerimento de Flexa.

Quando chegou, a comissão já tinha aprovado outro, de autoria de Perillo, incluindo o assunto dos cartões na convocação de Dilma. Jucá ameaçou recorrer ao plenário, alegando tratar-se de assunto estranho à CI, e Perillo retirou seu requerimento. Mas tucanos e democratas já estavam satisfeitos.

Bem-sucedida na CI, a oposição, por outro lado, levou nova surra na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos cartões corporativos. A base governista, majoritária, rejeitou 29 requerimentos de convocação de servidores. Foi aprovada - com os votos da base aliada - apenas a convocação do diretor do Banco do Brasil Alexandre Correa Abreu.

Esse resultado, que mostra a disposição do PT e aliados de barrar investigação ampla na comissão mista, levou os líderes do DEM, José Agripino (RN), e do PSDB, Arthur Virgílio (AM), a solicitar do presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), a leitura do requerimento que propõe a criação de CPI exclusiva do Senado para apurar as denúncias de abusos na utilização dos cartões por ministros e servidores do governo. Garibaldi pediu prazo para a leitura, na tentativa de buscar consenso entre os partidos.

O requerimento propondo a CPI exclusiva do Senado conta com as assinaturas necessárias (um terço dos integrantes da Casa). Já havia sido protocolado na Mesa Diretora, mas a criação da CPI estava suspensa. Para o governo, a desvantagem de uma CPI integrada apenas por senadores é o equilíbrio de forças com a oposição. E eventuais recursos contra as decisões do colegiado são feitos ao plenário do Senado (e não do Congresso, como ocorre no caso da CPI mista), onde a oposição é forte.

Durante a reunião da CPMI, a base governista explorou o envolvimento do senador Álvaro Dias (PSDB-PR) com a divulgação do dossiê com gastos da Presidência na gestão de FHC. Governistas cobraram de Dias a revelação de como teve acesso ao dossiê - fato que o próprio tucano admitiu na véspera.

"Não podemos votar nenhum requerimento enquanto o senador Álvaro Dias não der explicações. O senador (que integra a CPMI) saiu da condição de investigador para a de suspeito", disse o deputado Sílvio Costa (PMN-PE), integrante da tropa de choque do Planalto. O tucano acusou o governo de tentar desviar a responsabilidade pelo dossiê e recebeu a solidariedade de colegas. "O senador Álvaro foi transformado em bode expiatório por uma delinqüência do governo, que não quer investigar nada", afirmou o líder do PSDB.

Ao comentar as suspeitas de envolvimento de Dias no vazamento do dossiê para a imprensa, o ministro das Relações Institucionais disse que o episódio não deve ser comemorado como uma vitória do governo. "Para nós, seria melhor que o assunto já tivesse morrido. Se o Brasil for parar por cada fofoca que aparece, nós vamos viver sempre com soluço", afirmou Múcio.

A CPI rejeitou as convocações de Maria de La Soledad Catrillo e Erenice Alves Guerra, assessoras da ministra da Casa Civil. E de seis funcionários da Presidência da República: Anderson Pereira de Aguiar, Clever Pereira Fialho, Josafá Fernandes de Araújo, José Carlos Ferreira Fernandes, José Ivo de Souza Barbosa e José Roberto de Assis Possa. Os parlamentares governistas também negaram a convocação do presidente do Banco do Brasil, Antonio Francisco de Lima Neto.

A presidente da CPI, senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), anunciou que na terça-feira estão convocados a depor o ministro-chefe do gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Jorge Armando Félix, e o ministro do Esporte, Orlando Silva. (Colaborou Paulo de Tarso Lyra)