Título: Governo diz que chegou ao limite em oferta para renegociar dívidas
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Fonte: Valor Econômico, 04/04/2008, Agronegócios, p. B14

Após ceder em alguns pontos da nova renegociação das dívidas rurais, o governo avisou aos produtores já ter chegado "ao limite" em sua oferta para a repactuação de até R$ 66 bilhões do passivo do setor. Lideranças e parlamentares ruralistas insistem, entretanto, na rolagem de todas as operações de custeio prorrogado e dos programas de investimento até 2025, na fixação das taxas de juros em 4% ao ano e na adoção de um período de carência de um ano.

O Ministério da Fazenda resiste ao lobby ruralista, mas admite dar alguns "últimos retoques" na proposta que será avaliada por ministros e parlamentares na próxima semana. Estão em análise "soluções parciais" ao passivo de investimentos no Centro-Oeste e Rio Grande do Sul, como a concessão de mais um ano de prazo para quitação das parcelas, além dos oito anos já oferecidos ao setor. As taxas de juros não devem sofrer reduções generalizadas. E conceder prazo de carência estaria "fora de cogitação", segundo fontes do governo.

Dados obtidos pelo Valor mostram que os produtores rurais têm dívidas totais de R$ 10,54 bilhões a vencer neste ano. Em média, os produtores comprometeriam 8% a 10% de suas receitas com o pagamento de dívidas neste ano, calcula o Ministério da Fazenda. Por isso, o governo avalia que, em um momento de "boa liquidez" no setor, a concessão de carência estimularia a compra de novas máquinas e equipamentos.

Isso poderia levar novamente a um acúmulo no vencimento das dívidas nos próximos três ou quatro anos. E o governo teme uma "retomada explosiva" desses investimentos no campo, a exemplo do ocorrido antes da forte crise de renda vivida em 2004.

Pelos dados oficiais, os investimentos respondem por 66% das dívidas totais do setor a vencer até 2011 - ou R$ 22,7 bilhões. Mesmo assim, a maior parte dos produtores estaria, segundo o governo, em condições de quitar suas dívidas em razão da bom desempenho das principais commodities. Conceder carência, agora, seria um "incentivo" à aquisição de novas máquinas, justamente o principal foco de endividamento do setor rural. Alguns dados da indústria já apontam forte retomada nas compras neste ano.

Em 2008, vencem nada menos do que R$ 7,2 bilhões em investimentos. Para comparar: as dívidas de custeios prorrogados somam R$ 2,37 bilhões e o passivo de débitos antigos, R$ 967 milhões. "O peso dos investimentos sobre as parcelas da dívida total é muito significativo", diz uma fonte.

O grupo de especialistas nas dívidas do setor, coordenados pela Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) e a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), tem outra avaliação. "Os tratores que têm sido vendidos são, na maioria, para produtores de cana", diz a economista Rosemeire dos Santos, da CNA. "Ainda há falta de liquidez no campo e quem compra são apenas os mais capitalizados". A concessão de um período de carência seria fundamental para garantir fôlego aos produtores menos capitalizados. "Nem que fosse por oito ou nove meses", afirma.

A insatisfação com o andamento das negociações para uma nova repactuação das dívidas também atinge os produtores familiares. Movimentos sociais pressionam o governo a "melhorar" sua oferta. Querem tratamento "diferenciado", com mais descontos sobre aos débitos e juros mais baixos.

O próprio ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, já deixou clara sua insatisfação com as propostas da Fazenda. Em 2008, vencem R$ 1,8 bilhão do Pronaf. Sem contar o passivo com os fundos constitucionais, em boa medida ligados à agricultura familiar, mas ainda sem solução definitiva à vista.