Título: Mantega defende ajuste de R$ 20 bi
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Fonte: Valor Econômico, 02/04/2008, Brasil, p. A4

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, defendeu ontem um corte de R$ 20 bilhões nos gastos do orçamento da União para este ano porque quer dar um sinal aos mercados de que o governo não pretende negligenciar na questão fiscal justamente agora, quando há indicações de forte aquecimento da demanda na economia e esta pode trazer pressões inflacionárias. Mantega acredita que um aceno dessa natureza poderia ajudar o Banco Central na sua tarefa de manter a inflação no centro da meta de 4,5% (com 2 pontos percentuais de margem de tolerância para cima ou para baixo) este ano sem ter que necessariamente subir os juros básicos, hoje em 11,25% ao ano.

Essa questão precisa ser definida rapidamente para que o Ministério do Planejamento prepare o decreto de programação financeira, onde estarão previstos os cortes de gastos para o ano. O Planejamento levou propostas que falam de um corte que pode variar de R$ 14 bilhões a R$ 20 bilhões. O valor exato ficou para Lula decidir.

Os técnicos do Ministério da Fazenda mencionam o fato de Paulo Bernardo - que é muito "habilidoso" na relação com o presidente - não estar se empenhando junto a Lula por um corte mais substancioso; e se ressentem do que consideram uma posição muito flexível do ministro do Planejamento em relação aos reajustes salariais no setor público. Mantega, salientam, estaria disposto, inclusive, a endurecer no jogo com os auditores fiscais, que estão em greve por um aumento de 42% diante de uma contra-oferta, por parte do governo, de 17%.

Por trás da discussão fiscal está o temor do ministro da Fazenda com os efeitos de um aumento dos juros básicos na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Ele receia que, ao aumentar a taxa Selic, o Banco Central estará criando o pior dos mundos: ao elevar o diferencial da taxa de juros interna e externa o BC atrairá mais dólares para o país, estes iriam valorizar ainda mais a moeda doméstica, o que resultará num estímulo adicional às importações, que já crescem de forma acelerada, e em um desincentivo às exportações que crescem moderadamente. Ou seja, a decisão do BC vai piorar o cenário de déficit em conta corrente do balanço de pagamentos, que já é de US$ 4,8 bilhões no período de 12 meses acumulados até fevereiro.

Há uma diferença importante no diagnóstico que a Fazenda faz em relação à leitura do Banco Central. Enquanto este enxerga excesso de demanda e tem como função se antecipar a eventuais pressões inflacionárias, técnicos da Fazenda avaliam que o momento ainda é de grandes incertezas e melhor seria não mexer nos juros já neste mês.

Ontem, Mantega disse que os índices de preços estão se comportando bem e que o Produto Interno Bruto (PIB) cresce de forma equilibrada porque o aumento da demanda interna está sendo acompanhado do lado da oferta. "Os ortodoxos costumam ter medo do crescimento, acham que o crescimento traz desequilíbrios econômicos e nós estamos provando que não é verdade", disse o ministro durante sua apresentação na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.

Embora a diferença máxima de corte de gasto em discussão no governo seja de R$ 6 bilhões e isso o Ministério da Fazenda pode produzir administrando os gastos na "boca do caixa do Tesouro Nacional", acredita-se que este seja um sinal, uma mensagem importante na formação de expectativas.