Título: Negociações garantem até 2% de ganho real em 2008
Autor: Jurgenfeld , Vanessa ; Bueno , Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2008, Brasil, p. A3

José Silvestre do Prado, do Dieese: "O PIB começa a aparecer como um complemento nas negociações salariais" O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) acima da inflação em 2007 estimulou sindicatos à inclusão do indicador, pela primeira vez, como uma das referências para a negociação de reajuste salarial. Os acordos das categorias que têm data-base no primeiro trimestre do ano, no entanto, mantiveram a mesma média de ganho real verificada em 2007, de até 2 pontos percentuais acima da inflação - abaixo do reajuste do salário minimo, de 9,2% em março, para R$ 415, com ganho real de 4,74%.

Os pedidos de ganho real com base no PIB - a exemplo da regra para o salário mínimo têm sido rechaçados pelos empresários e os aumentos reais pagos são semelhantes aos de 2007. A maioria varia de 1% até 2%, e estão, ainda, abaixo dos ganhos de produtividade que tem sido alcançados pela indústria, sinalizando baixo risco dos salários afetarem a inflação futura.

Os trabalhadores das indústrias de cerâmica de Criciúma, principal pólo de Santa Catarina, negociaram aumento de 7,06%, mantendo também a tendência de ganhos reais. O sindicato defendeu um reajuste de 5% acima da inflação, mas o ganho ficou em 1,9%. No ano passado foi de 1,7%. O economista do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) de Santa Catarina, José Álvaro Cardoso, acredita que outros setores da economia catarinense também conseguirão ganhos reais nas negociações.

Para Cardoso, os resultados dos ceramistas só não foram melhores porque a inflação registrou uma alta mais acelerada no segundo semestre, atrapalhando as negociações, feitas com base no crescimento do PIB e na taxa de inflação. Ele também observa que não houve decisão oficial dos sindicatos em incluir o PIB como referência para os reajustes, mas o indicador foi incluído nas negociações salariais por sugestão da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fetiesc). Para Cardoso, a medida tem "fundamento lógico, já que o PIB representa a produtividade do país como um todo".

O Sindicato da Indústria de Mármores, Granitos e Rochas Afins do Estado do Rio de Janeiro, que representa 4 mil trabalhadores, também acertou um percentual de 7,5%. Já os trabalhadores da Indústria de Papel, Papelão e Cortiça, com data-base em janeiro, negociaram 6% de reajuste, menos de um ponto percentual acima do INPC de 5,16% de janeiro a dezembro de 2007. Para Mauro Feijó Guimarães, presidente do sindicato da categoria, o acordo representou um avanço em relação ao passado. "Há muito tempo não conseguíamos nada acima da inflação."

Mesmo em setores que cresceram abaixo da média o ano passado, as negociações caminham para ganhos reais próximos a 2%. Apesar das queixas das indústrias calçadistas contra os efeitos da valorização do real sobre a rentabilidade das exportações, os trabalhadores do setor em Sapiranga (RS) conseguiram, na convenção coletiva, aumento real de 1,3% a partir de fevereiro, além do INPC de 5,36% acumulado nos 12 meses anteriores. O ganho real foi o dobro do obtido no ano passado, de 0,67%, comparou o secretário de imprensa do sindicato, Adelino Frank.

Conforme o sindicalista, o bom desempenho das empresas no mercado interno permitiu o acordo e a estabilidade do nível de emprego. As negociações também foram mais rápidas: duraram duas semanas, em vez dos habituais dois meses. O piso salarial da categoria, de R$ 2,08 a hora ou R$ 457,60 por mês, também será reajustado pelo índice aplicado no salário mínimo regional, em maio, explicou Frank. De acordo com o supervisor-técnico do Dieese, Ricardo Franzoi, o reajuste ficará em torno de 10%.

Em São Paulo, o Sindicato da Indústria de Calçados de Franca (Sindifranca), acordou com as empresas reajuste de 7% nos salários e no piso da categoria, que passou a R$ 520, com aumento de 2,54% acima da inflação, que foi de 4,46% no acumulado de 2007 conforme o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). "Nos anos anteriores o ganho também foi similar, próximo de 2,2%", comparou Jorge Félix Donadelli, presidente do Sindifranca. A negociação não considerou o PIB de 2007.

Outras categorias que fecham negociação até maio, contudo, colocaram o indicador na mesa de negociações. A Federação dos Trabalhadores na Indústria da Alimentação, que fecha acordo no dia 24, pede às empresas reajuste de 10%, que inclui a inflação (4,46%) e o crescimento do PIB (5,4%). "A tendência é que outras categorias sigam na mesma direção. E é justo, é uma maneira de distribuir os ganhos da economia", afirmou Artur Bueno de Camargo, vice-presidente da Federação.

A Federação dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas e Farmacêuticas do Estado de São Paulo (Fequimfar), que reúne 11 sindicatos, negocia reposição da inflação medida pelo INPC (5,16%) mais 5% de ganho real. O índice, diz Sérgio Luiz Leite, secretário-geral da Fequimfar, teve como inspiração o aumento do PIB em 2007. "As indústrias estão numa choradeira generalizada porque o reajuste de preços no ano passado ficou abaixo da inflação. Mas acredito que, mesmo que os 5% não sejam atendidos, vamos fechar um acordo com ganho real", afirmou Leite. Em 2007, a federação pediu os mesmos 5% reais e obteve 1,87%.

De acordo com José Silvestre Prado de Oliveira, supervisor do Dieese, o desempenho do PIB setorial ganhou peso nas rodadas de negociações de reajuste salarial. "Claro que o comportamento da inflação continua sendo a principal referência para ganhos e será assim por muitos anos. Mas o PIB começa a aparecer como um complemento nas negociações." (Colaborou Chico Santos, do Rio)