Título: Receita tira Selic de devolução de tributo para exportador
Autor: Watanabe ,Marta
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2008, Brasil, p. A5

Daniel Lacasa Maya, do Machado Associados: assunto deve ir ao Judiciário Uma reversão nas decisões do Conselho de Contribuintes derrubando a atualização pela Selic em ressarcimento de tributos pega em cheio o setor exportador, principalmente a agroindústria e os segmentos que usam a industrialização por encomenda, como o calçadista, por exemplo.

Até o ano passado, a Câmara Superior de Recursos Fiscais - última instância do Conselho - decidia a favor das empresas garantindo a atualização pela Selic no ressarcimento do crédito presumido do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Apesar do nome, esse crédito nada mais é do que uma espécie de devolução do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) pagos no processo de produção pelo exportador. Foi idealizado pelo governo federal para garantir a desoneração total de tributos nas exportações.

O ressarcimento é feito após pedido à Receita Federal, num processo que costuma demorar até seis ou sete anos anos. O Conselho tinha entendimento pacífico pelo qual garantia a correção pela Selic a partir do pedido de devolução protocolado na Receita. No fim do ano passado, porém, a Câmara Superior deu as primeiras decisões derrubando a Selic por "falta de previsão legal". Não há legislação ou qualquer tipo de norma que garanta a correção para as empresas.

Além disso, as novas decisões têm concluído que a atualização pela Selic deve ser aplicada somente nos casos em que há pagamento indevido, o que não seria o caso do ressarcimento do PIS e da Cofins para exportação. Para os conselheiros, essa devolução decorre de um incentivo fiscal.

Os primeiros julgamentos derrubando a Selic causaram rebuliço. Os tributaristas se organizaram para reverter a decisão e os processos seguintes sobre o mesmo assunto na Câmara Superior do Conselho foram acompanhados de sustentações orais de juristas como Ricardo Mariz de Oliveira e Amador Outerelo Fernandez.

Os esforços foram em vão. Novos julgamentos da Câmara Superior em fevereiro e março consolidaram o fim da Selic na atualização dos créditos. A virada do assunto no Conselho é um resultado da formação da Receita Federal do Brasil, órgão que resultou da união da antiga Secretaria da Receita Federal com a de Receita Previdenciária. Com isso, o Conselho de Contribuintes também teve suas atribuições ampliadas e começou a decidir sobre as autuações relacionadas à contribuição previdenciária. Com a mudança, novos conselheiros vindos da antiga Secretaria de Receita Previdenciária foram agregados ao Segundo Conselho de Contribuintes, instância que decide não só sobre a contribuição previdenciária, mas também autuações de IOF e IPI, por exemplo.

Isso contribuiu para alterar seis dos atuais 14 conselheiros que compõem a Câmara Superior do Segundo Conselho, num indicativo de que muitas decisões deverão sofrer grande alteração. No caso do ressarcimento de crédito presumido de IPI, devem ser afetados principalmente segmentos da agroindústria - porque adquirem muitos insumos de pessoas físicas - e também setores exportadores que usam muito a industrialização por encomenda, como o calçadista. As novas decisões saíram para empresas como Citrosuco, exportadora de suco de laranja, a Bertol, de embalagens para soja, óleos etc, além da Reichert e Schmidt Calçados, uma das maiores fabricantes gaúchas de sapatos.

Para Hélcio Honda, assessor jurídico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), as decisões devem afetar ainda mais os exportadores, principalmente segmentos que já tiveram margens reduzidas em função do câmbio. Para ele, as decisões provocam, na prática, uma devolução apenas parcial do PIS e Cofins pagos. "Isso significa que a desoneração será prejudicada e haverá exportação de tributos."

O advogado Daniel Lacasa Maya, do Machado Associados, acredita que o novo entendimento do Conselho fará com que as empresas levem o assunto ao Judiciário, onde há, por enquanto, decisões favoráveis dos tribunais superiores. No caso do Superior Tribunal de Justiça (STJ), diz ele, há entendimento pacífico favorável às empresas especificamente em relação ao crédito presumido de IPI. A ida ao Judiciário, porém, tornará o percurso pela atualização da Selic mais longo, pois antes a correção era garantida já na esfera administrativa.

"É possível que esse entendimento se estenda a outros tipos de ressarcimento, como a dos saldos credores de PIS e Cofins, por exemplo", diz Maya. Essas duas contribuições, hoje calculadas de forma não-cumulativa, muitas vezes geram saldos credores nos casos em que as empresas possuem altos créditos de PIS e Cofins pagos na compra de insumos e serviços. Os saldos credores são comuns entre os exportadores, já que as vendas ao exterior não pagam as duas contribuições. Assim as empresas não tem débitos suficientes para abater os créditos de PIS/Cofins.

"Como esse ressarcimento de saldo credor de PIS e Cofins também não é resultado de pagamento indevido, é provável que o Conselho derrube a atualização pela Selic", concorda o advogado Maurício Barros, do escritório Braga & Marafon. Ele lembra, porém, que os conselheiros ainda estão muito divididos sobre o assunto. "Alguns julgamentos ficaram em sete contra sete. O resultado só foi definido contra o contribuinte porque em caso de empate o voto do presidente da Câmara vale por dois. E o presidente é sempre um representante da Fazenda", diz. "Ainda é possível uma nova mudança."

Antes da revisão do assunto, a Câmara Superior garantia a atualização pela Selic porque entendia que o ressarcimento do crédito presumido de IPI era uma espécie de restituição de tributos. Além disso, aplicava-se a isonomia, já que os créditos a favor da União são corrigidos pela Selic.