Título: Bons sinais no recuo do uso da capacidade industrial
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2008, Opinião, p. A10

A indústria brasileira continua crescendo de forma robusta. No primeiro bimestre, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o faturamento aumentou impressionantes 10,9% em relação ao mesmo período de 2007, o melhor desempenho desde 2003, quando a série começou a ser apurada.

Outra boa notícia é que o uso da capacidade instalada recuou de 83,1% em janeiro para 82,9% em fevereiro. O pico da série histórica foi registrado em novembro, quando atingiu 83,3%. Os dados mostram, portanto, que vem ocorrendo uma persistente redução na ocupação da indústria.

Quando ocorrem, simultaneamente, aumento da atividade industrial e recuo do uso da capacidade instalada, é sinal de que os investimentos em capital fixo começam a mostrar maturação. É tudo o que se espera que aconteça na economia brasileira daqui em diante. O aumento dos investimentos amplia a capacidade de produção de bens e serviços, permitindo que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça sem provocar riscos inflacionários.

A taxa de investimento, medida pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), é um capítulo à parte na atual fase de crescimento da economia brasileira. Os investimentos vêm se expandindo há oito trimestres consecutivos num ritmo mais acelerado que o do PIB. Na medida em que eles amadurecem, o nível de utilização da capacidade recua, propiciando o aumento da oferta.

Nos últimos trimestres, o ritmo de expansão da FBCF tem superado o do PIB em mais de duas vezes. Outro indicador importante: nos 12 meses encerrados em fevereiro, o consumo aparente de bens de capital (máquinas e equipamentos), que é o resultado da soma da produção, subtraída a exportação e acrescida a importação, avançou 20,2%. A alta equivale a quase o triplo do crescimento da indústria no mesmo período - 6,5%, segundo o IBGE.

Há um claro descolamento entre produção industrial e o nível de utilização da capacidade. Em fevereiro, a indústria produziu 6,5% mais do que produziu, por exemplo, no fim de 2006. De lá para cá, no entanto, o uso do capacidade cresceu bem menos - apenas dois pontos percentuais. Tudo isso mostra que a economia brasileira pode estar passando por uma fase de transição extremamente positiva.

Nos últimos 14 anos, os ciclos de expansão econômica do país esbarraram na baixa capacidade da economia de alavancar a produção. O crescimento gerava pressões inflacionárias e, por isso, era abortado. Durante muitos anos, a economia ficou condenada a crescer a taxas medíocres, inferiores a 3% ao ano. Na fase atual, o patamar, resultado da mudança de metodologia de cálculo do PIB, mas também do forte ciclo de investimentos iniciado há três anos, evoluiu para algo entre 4% e 5%.

O economista Paulo Mol, da CNI, observou, durante a divulgação dos indicadores industriais, que metade dos setores industriais está, neste momento, com o uso da capacidade estável ou em queda. Em 2004, quando a economia acelerou, a situação era bem distinta, o que levou o Banco Central, preocupado com as pressões inflacionárias, a promover aperto monetário, frustrando o crescimento nos dois anos seguintes.

O economista lembra que, além do uso maior da capacidade, naquele ano os custos de financiamento das empresas eram bem superiores e o governo ainda não tinha desonerado alguns investimentos. Outra diferença: o real estava num patamar muito mais desvalorizado, o que inibia, na ocasião, o poder de substituição que as importações têm atualmente.

Apesar das boas notícias do setor industrial, dificilmente o Comitê de Política Monetária (Copom) deixará de aumentar a taxa básica de juros na próxima reunião, daqui a dez dias. A maioria dos agentes econômicos pesquisados pelo BC já esperam, para 2009, uma inflação superior à meta, o que deve levar o Comitê a agir. O quadro inflacionário não é de descontrole, muito pelo contrário, mas os sinais de que o BC vai agir de forma preventiva já foram dados. De toda forma, os bons resultados da produção industrial deverão ajudar a autoridade monetária a agir com cautela no aperto monetário aguardado.