Título: Eletropaulo mira o aquecimento solar
Autor: Capela , Maurício
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2008, Empresas, p. B1

Bastou a implementação de um punhado de leis e a aposta de algumas companhias para que o mercado de aquecedor solar de água crescesse a taxas chinesas no Brasil. Entre 2002 e 2007, por exemplo, essa indústria assistiu seu faturamento anual saltar de R$ 217 milhões para R$ 401,2 milhões só com a instalação de novos equipamentos, sendo que no acumulado deste período foram colocados em funcionamento dois milhões de metros quadrados (m2) de aquecedores solares. E a previsão para 2008 também é animadora: incremento de 30% nas vendas e no m2.

O negócio parece ser tão promissor que até a maior distribuidora de energia da América Latina, a AES Eletropaulo, embarcou. A companhia fechou um acordo com a brasileira e2solar e vai instalar em 20 casas da favela de Paraisópolis, localizada na zona sul da capital paulista, o equipamento. Por ora, a colocação, que já começa nesta semana, é experimental e atinge, principalmente, quem teve as ligações clandestinas legalizadas. Segundo a distribuidora, controlada pela holding Brasiliana que tem como sócia majoritária o grupo americano AES, os testes deverão durar seis meses em Paraisópolis.

Mas a meta da Eletropaulo é mais ambiciosa. A companhia pretende até o fim de 2010 instalar 10 mil equipamentos de energia solar em favelas, conjuntos habitacionais, entre outros, o que demandará investimentos de R$ 15 milhões.

Contudo, a decisão da distribuidora passa longe de qualquer pacote de boas ações. A empresa só mergulhou no projeto, porque sabe que é melhor receber menos pela conta de luz ao invés de ter um valor pouco maior no papel, porém de difícil recebimento. "O projeto tem como objetivo auxiliar na redução do consumo de energia dos clientes com baixo padrão aquisitivo e com consumo elevado - acima de 150 quilowatts/hora (KWh) - que tiveram as ligações legalizadas", afirma.

Nas contas da distribuidora, o aquecimento solar de água diminui o gasto do chuveiro elétrico, reduzindo a conta de energia. Para a Eletropaulo, há espaço para que o valor da conta de luz caia em até 50% com a adoção do aquecimento solar.

Aldo Batista, um dos sócios da e2solar, também aposta em uma economia próxima dos 50%. Dona de um faturamento próximo dos R$ 3 milhões, a companhia estuda investir perto de R$ 6 milhões na sua operação instalada em Barueri (SP) para triplicar sua capacidade produtiva, que é mantida em sigilo.

A voz discordante no potencial dessa redução é de Carlos Faria, diretor-executivo do Departamento de Aquecimento Solar (Dasol) da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava). Segundo Faria, dos 150 KWh consumidos mensalmente em uma residência, 50 KWh estão ligados ao aquecimento elétrico de água. Portanto, a adoção do aquecedor reduziria em 70% esses 50 KWh, o que na prática baixaria o consumo total desta hipotética residência dos 150 KWh para ao redor de 120 KWh.

"Nas contas da Dasol, essa residência pagaria o investimento em até um ano e seis meses. Já em hospitais, comércio, onde o consumo é maior, acredito que o gasto seria quitado em três anos", diz Faria.

O diretor do Dasol da Abrava sabe que a onda do aquecedor solar de água está só no começo no Brasil, principalmente porque há uma série de legislações em trânsito no país. Em junho deste ano, por exemplo, entra em vigor uma lei em São Paulo (SP) que obriga os edifícios novos com quatro banheiros por apartamento a adotarem o aquecedor solar de água.

"Uma legislação mais agressiva ajuda bastante. E também não há dúvida de que a lei paulistana deverá influenciar outras cidades do Brasil", afirma Amaurício Lúcio, diretor comercial da Tuma Industrial, uma das grandes fabricantes de aquecedores solares de água no país.

Uma das 13 companhias do grupo Tuma, a Tuma Industrial tem no aquecedor solar, no ar-condicionado para aplicações industriais e em filtros seu faturamento. O destaque, claro, é o aquecedor, que representa a maior parte da receita anual de R$ 18 milhões. Neste ano, a Tuma Industrial espera uma receita de R$ 22 milhões.

O diretor comercial da companhia conta ao Valor que a empresa aposta tanto no desenvolvimento do aquecedor solar de água que vai investir R$ 2,5 milhões para triplicar a capacidade produtiva da sua única fábrica instalada em Belo Horizonte (MG) neste ano. A empresa não revela o tamanho de sua produção, mas assegura que se o mercado no país deslanchar, a Tuma já estuda desativar a operação em Belo Horizonte e construir uma fábrica dez vezes maior em alguma cidade do Estado de Minas Gerais. A decisão ainda não foi tomada, mas a empresa já sabe que precisará desembolsar R$ 12 milhões se quiser levar o projeto adiante.

O fato é que a investida em aquecedores desse tipo não se restringe ao setor privado. O próprio setor público tem se movimentado nesta direção. Tanto que a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), ligada à Secretaria de Estado da Habitação do governo paulista, fechou um acordo com a Bandeirante, distribuidora da Energias do Brasil que atende 28 municípios paulistas, para instalar aquecedor solar em 4,8 mil apartamentos em quatro anos. E o objetivo do CDHU é o mesmo: reduzir o consumo de energia elétrica em conjuntos populares.