Título: Novo seguro pode reduzir risco
Autor: Izaguirre , Mônica
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2008, Finanfas, p. C12

Bernard Appy, secretário de Política Econômica: objetivo é ampliar o acesso das pessoas ao crédito imobiliário O Ministério da Fazenda e a Superintendência de Seguros Privados (Susep) dão início, essa semana, a uma série de reuniões com representantes de bancos e seguradoras, com objetivo de definir e regulamentar novas modalidades de seguro imobiliário. A idéia é criar produtos que permitam aos bancos transferir ao mercado segurador parte do risco de crédito dos financiamentos à construção e à aquisição de imóveis, anunciou, em entrevista ao Valor, o secretário de Política Econômica do ministério, Bernard Appy.

O secretário explica que esse tipo de seguro - conforme ele, ainda não oferecido no Brasil por falta de conforto regulatório das seguradoras - possibilitaria às instituições bancárias financiar parcela maior do valor total de cada imóvel. O efeito final pretendido pelo governo é a ampliação do acesso das pessoas ao crédito imobiliário, já que, consequentemente, cairia a necessidade de recursos próprios do comprador.

A demanda pelos estudos nesse sentido partiu da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). O presidente da entidade, Paulo Safady Simão, está convencido de que existe no país muita gente com renda suficiente para pagar prestações de um financiamento imobiliário, mas que, ao mesmo tempo, tem dificuldade de juntar o dinheiro da entrada. Para esse público, diz, o aumento do valor financiado em relação ao valor total do imóvel "faz toda a diferença" , pois pode viabilizar uma aquisição que, do contrário, não ocorreria ou ocorreria bem mais tarde.

Atualmente, a maioria dos bancos limita o financiamento a 70% ou 80% do valor do imóvel, percentuais já superiores aos praticados no passado, informa José Pereira Gonçalves, superintendente geral da Associação Brasileira de Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip, que representa os bancos com carteira imobiliária). Mecanismos que permitam elevar esse percentual sem imputar aumento de risco aos bancos "certamente tornariam mais dinâmico e acessível o mercado de crédito imobiliário no Brasil", diz ele.

Paulo Safady Simão torce para que as novas modalidades de seguro permitam ao sistema financeiro elevar a parcela financiada a 90% ou 95%. Esses percentuais são praticados na Europa e nos Estados Unidos, destaca ele, justamente porque, nesses mercados, as seguradoras oferecem aos bancos uma diversidade de coberturas relacionadas ao risco de inadimplência de compradores de imóveis financiados.

Já no Brasil, hoje, somente dois tipos de seguro são acoplados às operações de financiamento imobiliário e nenhum deles cobre o risco de crédito propriamente dito, diz Bernard Appy e confirma José Pereira Gonçalves. Um cobre riscos relacionados a eventuais danos ao imóvel, ou mesmo perda, em função de sinistros como, por exemplo, incêndios ou defeitos de construção. O outro garante ao banco o pagamento da dívida ou parte dela em caso de morte ou invalidez permanente do tomador do crédito.

Bernard Appy ressalta que, no Brasil, o mercado ainda não oferece, por exemplo, um seguro que ressarça o banco caso o tomador do crédito fique inadimplente a ponto de o imóvel ir a leilão e essa execução de garantia não ser suficiente para cobrir todo o saldo devedor. Embora seja menos comum do que era em tempos de juros mais altos, esse tipo de situação pode ocorrer por causa do acúmulo de juros, quando as prestações deixam de ser pagas.

O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda lembra que tampouco existe no país, atualmente, uma modalidade de seguro que garanta às instituições financeiras a continuidade do fluxo de pagamento de prestações, em caso de impossibilidade temporária do tomador do crédito. Ele explica que, embora caiba ao mercado desenhar os novos produtos, o governo precisa participar da discussão, porque serão necessários normativos da Susep, órgão regulador do mercado de seguros.

O Conselho Monetário Nacional - colegiado presidido pelo Ministério da Fazenda e composto, ainda, pelo Planejamento e pelo Banco Central - também deverá entrar na normatização, no que diz respeito à exigência de capital próprio para créditos imobiliários acoplados a seguro contra risco de inadimplência. Se o banco financiar 90% do imóvel, mas o seguro fizer com que o risco da instituição corresponda ao de um financiamento de 70% ou 80% apenas, essa operação deverá ser enquadrada como tal, para efeitos do Índice de Basiléia, antecipa Bernard Appy. Essa equiparação será importante para a decisão de cada banco. Sem ela, o capital próprio exigido para riscos de crédito relacionados a financiamentos superiores a 80% do valor do imóvel seria o dobro. Justamente por causa da maior exigência de capitalização é que hoje as instituições só vão até 80%, embora não sejam proibidas de ir além.

Nem Bernard Appy nem José Pereira Gonçalves enxergam qualquer possibilidade de que as mudanças em estudo e seu efeito sobre a ampliação do crédito imobiliário resultem em problema de inadimplência semelhante ao que ocorreu nos Estados Unidos. Ambos reconhecem que a crise começada nos EUA e que se espalhou pelo mundo foi tão forte que atingiu inclusive seguradoras. Mas lembram que os critérios de análise de risco de crédito imobiliário no Brasil são muito mais rigorosos do que os praticados na concessão dos financiamentos conhecidos como "subprime", cuja inadimplência provocou a crise. "O que houve lá foi uma irresponsabilidade generalizada... Não temos aqui nada parecido", assegura José Pereira Gonçalves.

Ele e Paulo Safady Simão argumentam ainda que, como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), o saldo das operações de crédito imobiliário brasileiras é um dos mais baixos do mundo. Dados do Banco Central mostram que, no final de fevereiro, incluindo operações com outras fontes além da poupança, o estoque era de R$ 44,5 bilhões, apenas 1,6% do PIB nominal estimado para 12 meses. O presidente da CBIC lembra que a relação com o respectivo PIB passa de 60% nos Estados Unidos e de 70% na Inglaterra, por exemplo.

Bernard Appy não conta quais são, mas diz que já há grupos seguradores internacionais interessados em investir no mercado brasileiro para oferecer as futuras modalidades de seguro imobiliário. Paulo Simão acredita que a abertura do mercado de resseguros a empresas estrangeiras, no ano passado, será um impulso a esse processo.