Título: Luz no fim do túnel
Autor: Ragazzi , Ana Paul ; Camba , Daniele
Fonte: Valor Econômico, 07/04/2008, EU & Investimentos, p. D1

Com o fracasso do leilão de privatização da Companhia Energética de São Paulo (Cesp) no fim do mês passado, as ações do setor elétrico tiveram dias difíceis, com quedas bem acentuadas. A dúvida sobre a renovação ou não das concessões das usinas hidrelétricas pesou e, junto com a Cesp, as ações de empresas como Cemig, Copel e Eletrobrás também sofreram, já que elas possuem concessões a serem renovadas nos próximos anos. No entanto, segundo analistas, o setor possui boas perspectivas para o investidor que mantiver os olhos no longo prazo. Isso significa que as recentes quedas podem ter provocado boas oportunidades de compra dessas ações, a preços mais convidativos. Sem falar que as elétricas são tradicionalmente boas pagadoras de dividendos.

Analistas avaliam que o setor tem boas perspectivas por conta do elevado crescimento econômico, que impulsiona o consumo de energia elétrica tanto da indústria quanto do consumidor comum. Além disso, conta a favor o sucesso dos recentes leilões de energia nova. Porém, os riscos passam por questões regulatórias, seja pela renovação das concessões, seja pelas revisões tarifárias.

Uma saída para quem deseja investir no setor, com menos risco, pode ser escolher ações de empresas privadas, que não serão afetadas pela necessidade de renovação de concessões no curto prazo. Nesse caso, aponta a Corretora Unibanco em relatório, as opções seriam as ordinárias (ON, com direito a voto) da Tractebel, eleitas como preferidas pelos analistas. Outra opção está nas preferenciais (PN, sem voto) da AES Tietê. A ordinária da Tractebel também é indicada pela Ativa Corretora.

Analistas destacam a oportunidade para se tirar proveito de eventuais exageros do mercado, que reduziu com força os papéis no ano. A ação ON da Cemig, por exemplo, sofreu mais do que deveria, dizem os especialistas. No ano, o papel cai 12,58%.

Em relatório assinado pelos analistas Pedro Batista e Eduardo Haiama, o UBS Pactual avalia que o mercado cometeu exageros na interpretação do tema renovação de concessões e, como conseqüência, criou oportunidades de compra. O banco pondera que apenas 9% da capacidade de geração da Cemig, por exemplo, se encontra na mesma situação das usinas da Cesp, ou seja, com fim da concessão em 2015 e uma renovação já concedida.

O banco destaca ainda que, no caso das usinas da Cemig de São Simão e de Jaguara, cujas concessões vencem em 2013 e 2015, as permissões foram dadas nos anos 60 por 50 anos e ainda não foram renovadas. Portanto, de acordo com a lei, a empresa ainda têm direito a uma renovação automática. A capacidade da usina de São Simão é de 1.281 megawatt (MW) médios, ou seja, 32% do total da Cemig. No caso da de Jaguara, a capacidade é de 336 MW, o que representa 8% do total da companhia mineira.

Ao final de março, as ações preferenciais da Cemig apresentavam um desempenho 21% inferior ao do Índice Bovespa desde dezembro e, na visão do UBS Pactual, configuravam-se uma boa oportunidade de investimento. O banco também comenta que, após o processo de revisão tarifária, a companhia está investindo na eficiência operacional.

As próximas revisões tarifárias podem surpreender positivamente, com menores quedas nas tarifas do que se imagina, avalia o gerente de renda variável da Modal Asset Management, Eduardo Roche. Essa expectativa faz sentido, já que as últimas revisões realmente vieram melhores para a empresa. As próximas companhias que passarão por revisões tarifárias são a Cemig, a CPFL e a Energias do Brasil. "O mercado está de olho nessas revisões e vai saber valorizar, no caso de elas serem menos negativas do que se projeta", diz Roche.

O gerente da Modal lembra que, no setor, há empresas cujas ações estão bem mais depreciadas do que outras. Entre elas, Roche cita a Copel, que possui relação entre o valor da empresa e a sua geração de caixa operacional projetada para este ano - que dá uma medida do prazo de retorno do investimento (o EV/Ebitda) - de 4,9 vezes, enquanto o EV/Ebitda estimado para Cemig é de 6 vezes. Quanto menor o índice, melhor para o acionista. Outra opção, segundo Roche, é o papel da Energias do Brasil, que possui EV/Ebitda projetado para este ano de 5,1 vezes ante 9,4 vezes da CPFL. Entre as distribuidoras, ele acredita que a ação da Light está entre as mais atraentes.

Outro fator é que as elétricas são excelentes distribuidoras de dividendos, diz o chefe de análise da Corretora Concórdia, Eduardo Kondo. "É preciso, no entanto, ter em mente que as elétricas são bons investimentos para o longo prazo, diferentemente de setores muito mais imediatistas, como varejo e consumo", diz.

Já para Cesp, em princípio, a geradora paulista ficou na berlinda, pois 67% de sua capacidade instalada, referente às concessões das usinas de Jupiá e Ilha Solteira, vencem daqui a sete anos. O governo paulista colocou a empresa à venda sem nenhuma sinalização de que as licenças seriam renovadas, o que afastou os compradores.

Mas, no mercado, a avaliação é de que todas as empresas com concessões a vencer em período relativamente curto, a partir de 2015, conseguirão renová-las e seguir adiante. Estão nesse grupo Eletrobrás, Cemig e Copel. Na Cesp, o governo levou a empresa a leilão e não há como deixar de levar essa questão muito em conta quando se trata de bilhões de reais, afirma André Segadilha, gerente de análise da Prosper Corretora. Ele avalia que o governo paulista foi inábil na condução do processo ao confiar que poderia vender a empresa sem garantir renovações.

"A ação caiu depois do insucesso do leilão na mesma proporção em que subiu por conta da expectativa criada para a realização do evento, e não por uma razão operacional", diz Segadilha. Para ele, a frustração se concretizou no pior dos cenários. "Se o governo tivesse dito que não iria privatizar, o papel não teria sofrido tanto."

Na avaliação do analista da Prosper, no momento, a discussão atinge diretamente apenas a Cesp, sem contaminar as análises mais precisas de outros papéis do setor. "A Cesp foi o patinho feio nessa história toda, mas as perspectivas para o setor permanecem positivas."

O papel da Cesp acumulava fortes altas desde novembro do ano passado, quando o Estado comunicou a intenção de vendê-la. A expectativa da privatização puxou as ações desde então, com analistas revendo preços alvos e estimativas em função da nova realidade futura que se desenhava para a empresa. Como o evento não se confirmou, o papel passou, imediatamente, a devolver as altas.

A Corretora Socopa retirou as ações preferenciais série B (PNB) da Cesp da carteira de favoritas, embora tenha mantido na carteira recomendada, com peso reduzido. No horizonte, ficaram agora os fundamentos da empresa, os riscos regulatórios e a expectativa de que o governo divulgue novos planos para a companhia.

Monica Araújo, chefe da área de estratégia e análise da Ativa Corretora, acredita que o acionista da Cesp deverá ficar atento ao noticiário. "O acompanhamento é necessário para se posicionar a partir das próximas sinalizações sobre o destino da empresa."