Título: Novo procurador deve combater crime
Autor: Juliano Basile e Thiago Jayme Vitale
Fonte: Valor Econômico, 15/02/2005, Especial, p. A20

O governo Lula definiu os critérios para a escolha do sucessor do procurador-geral da República, Claudio Fonteles. O novo comandante do Ministério Público Federal deverá ser uma pessoa comprometida com a política de combate ao crime organizado e à lavagem de dinheiro, articulada pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, como faz o atual ocupante do cargo. Fonteles deixará o posto em 30 de julho deste ano. Foi considerado, tanto pelo presidente Lula como pelo ministro da Justiça, segundo informam autoridades do governo, um procurador-geral independente, sendo algumas vezes até contrário à política oficial. Fonteles ingressou com ações no Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar o foro privilegiado do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e tentou derrubar a medida provisória que autorizou o plantio de produtos transgênicos - dois temas caros ao Planalto. Em conversas informais com subprocuradores e com o próprio Fonteles, no Palácio do Planalto, Lula sempre disse não se opor a esse estilo mais independente do chefe do Ministério Público. "Ministério Público tem que ser assim, há maior credibilidade", disse o presidente a integrantes da Procuradoria Geral. Para Lula, a atuação independente de Fonteles dá mais credibilidade aos pareceres do próprio procurador quando favoráveis ao Planalto. O governo também considera positiva a atuação de Fonteles no combate ao crime organizado. A Procuradoria Geral atua em sintonia com o Departamento de Recuperação de Ativos do Ministério da Justiça, criado por Bastos para promover o combate à lavagem de dinheiro, com o diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, e tem contribuído para a realização de ações integradas dentro do MP, caso da operação do Banestado. Nessa ação, procuradores de diferentes Estados conseguiram denunciar mais de 200 envolvidos e recuperar mais de R$ 200 milhões desviados ilegalmente para fora do país. É esse perfil de atuação que o governo quer manter na sucessão do procurador geral. Os principais candidatos à sucessão de Fonteles são os subprocuradores Antonio Fernando Barros e Silva, hoje vice-procurador geral, Wagner Gonçalves, corregedor-geral do MPF, além de Ela Wiecko de Castilho. Antonio Fernando e Gonçalves são companheiros de longa data de Fonteles. Sempre fizeram, junto ao atual procurador-geral, oposição à linha do ex-ocupante do cargo, Geraldo Brindeiro. Os dois têm a simpatia da classe, notadamente Antonio Fernando. Ele liderou, ao lado de Fonteles, algumas listas de eleições internas organizadas pelas associação de procuradores quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso insistia em reconduzir Brindeiro. Fernando perdeu a disputa com Fonteles para chegar ao cargo em 2003. Teve o apoio do ministro José Dirceu (Casa Civil) e de Bastos. Fonteles contava com o apoio do chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, e do então assessor especial da Presidência, Frei Betto. A Igreja Católica deu forte apoio ao atual procurador-geral. Ela Wiecko de Castilho corre por fora. Ela contou com o apoio das senadoras petistas Ideli Salvati (SC) e Serys Shlessarenko (MT) na disputa pela chefia do MPF em 2003. Pesa a seu favor o fato de uma mulher nunca ter ocupado o posto. A tendência é que o governo indique uma pessoa próxima do atual procurador-geral. Apesar de existirem resistências dentro do Planalto à escolha de um comandante do MPF independente do governo. No início de 2003, quando era o momento de nomear o sucessor de Brindeiro, surgiu a tese de que seria eficaz a indicação de uma pessoa com perfil semelhante a ele, no sentido de não criar problemas para o Planalto. Brindeiro foi reconduzido três vezes por Fernando Henrique e passou oito anos sem criar qualquer problema para o governo tucano. Quando começou o governo Lula e Brindeiro ainda ocupava a chefia do MPF, ele ajudou a fomentar essa tese ao proferir pareceres amplamente favoráveis ao governo petista. O secretário de Comunicação do Planalto, Luiz Gushiken, teria sido um dos defensores da continuidade de Brindeiro. Mas essa tese não prevaleceu. Bastos endossou a vertente que propunha um Ministério Público independente do governo e alinhado com a política de combate ao crime organizado. O presidente Lula preferiu essa corrente e deverá privilegiá-la na escolha do sucessor de Fonteles. Em conversa com o Valor, Claudio Fonteles fez uma análise histórica do papel de comando do MPF. Segundo ele, o chefe da instituição deve articular todos os setores na promoção das investigações. Acabou o tempo em que o procurador-geral vivia de fazer pareceres para os processos que são julgados pelos ministros do STF. "Outrora, o procurador-geral era o homem, dentro do gabinete, que produzia pareceres jurídicos para o Supremo. Isso existe? Existe. É importante? É. Mas, ao lado disto e tão importante quanto, é que abriram-se outras searas, outros caminhos, sem se desvencilhar deste, que é o da articulação. Criou-se essa nova visão de procurador-geral: o articulador", definiu Fonteles.