Título: Greve deixa 8 mil de férias em Manaus
Autor: Góes , Francisco
Fonte: Valor Econômico, 11/04/2008, Brasil, p. A3

As empresas do Pólo Industrial de Manaus (PIM) estão adotando diferentes medidas para contornar prejuízos decorrentes da greve dos auditores fiscais da Receita Federal. Enquanto algumas companhias gerenciam estoques de peças e tentam compensar a falta de insumos importados, outras concederam férias coletivas e algumas começam a falar em demissões.

A Proview Eletrônica do Brasil, empresa do que começou a produzir em março conversores de sinais para TV digital, preparava ontem uma lista de demissão de 120 funcionários. "Além disto, deixamos de contratar a maior parte das 200 pessoas que iriam trabalhar na linha de produção do conversor digital, que está parada em função da greve dos auditores-fiscais (da Receita Federal)", disse ao Valor o presidente da empresa no país, Tseng Ling Yun. A empresa, explicou ele, já vinha sentindo necessidade de ajustar o número de contratados e optou pelas demissões agora. Dos 120, informou, entre 70 e 80 são terceirizados.

De origem taiwanesa, a Proview está instalada há nove anos no PIM onde produz monitores para computadores, televisores de cristal líquido e tubo e DVDs, entre outros produtos. No momento, porém, todas as linhas de produção da empresa em Manaus estão paradas por falta de peças e componentes para fazer a montagem, com exceção do DVD, cujos estoques de insumos são suficientes para manter a produção até meados deste mês.

Cerca de 50% dos componentes eletrônicos usados pela Proview na montagem dos seus produtos em Manaus são importados da Ásia. A empresa tem 1,3 mil empregados no PIM. Outras 19 empresas do pólo enfrentam situação semelhante à da Proview com fábricas ou linhas de produção paradas, segundo o Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam).

Maurício Loureiro, presidente do Cieam, estima que há cerca de US$ 80 milhões em mercadorias paradas nos portos, aeroporto e porto seco de Manaus, o que provocou redução do ritmo de atividade nas fábricas do pólo e, por conseqüência, no número de trabalhadores ocupados. O Cieam calcula que entre 7 e 8 mil trabalhadores, entre mais de 100 mil empregados no PIM, estão em casa em licença remunerada.

Em Manaus, o clima é de expectativa com os rumos da paralisação, que afeta o comércio exterior brasileiro, já que o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Unafisco) mostrou-se disposto, ontem, a continuar com a greve apesar da derrota sofrida, na terça-feira, no Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro Gilmar Mendes, do Supremo, autorizou o corte no ponto de grevistas da Advocacia Geral da União e da Receita Federal. Os auditores da Receita estão em greve desde 18 de março.

Na Philips da Amazônia, o trabalho no momento concentra-se em gerenciar a falta de material causada pela greve. "Trabalhamos de acordo com a disponibilidade de matérias-primas", disse Julio Pacini Neto, vice-presidente de operações industriais da empresa. A Philips não parou a fábrica de Manaus, que produz linhas de TV, áudio, vídeo e caixas de transmissão de dados, mas a greve afeta os indicadores de performance da unidade, reconheceu Pacini.

O superintendente-adjunto de projetos da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), Oldemar Ianck, mostrou preocupação: "A nossa posição é de apreensão [com a greve] porque nós temos um trabalho difícil de atração de investimento [para o PIM] e as empresas têm também um trabalho árduo para vender produtos e fazer contratos. "O sentimento entre os industriais em Manaus é que as seguidas greves do serviço público prejudicam a imagem do Brasil perante investidores externos e podem contribuir, em alguns casos, para transferências de linhas de produção para outros países.

Levantamento do Cieam mostra que entre 2005 e 2008 Manaus enfrentou 433 dias de greve de diferentes categorias do funcionalismo público federal, com efeitos diretos sobre o pólo industrial. O Cieam entrou com mandado de segurança na Justiça Federal de Manaus para conseguir liminares que liberem as cargas retidas dos associados, mas até ontem não havia decisão sobre o tema. Em São Paulo, uma liminar foi concedida e tem sido aproveitada por exportadores e importadores.

Loureiro avalia que a decisão do STF contrária à greve dos auditores abre várias possibilidades para as empresas afetadas pela paralisação. Uma delas seria buscar na Justiça o ressarcimento dos prejuízos causados.

Ele entende que a continuação da greve será um "desrespeito" à ordem jurídica e que, nesse caso, o governo teria de tomar atitudes mais enérgicas. "Existe a prerrogativa constitucional de que os militares poderiam assumir postos nessas áreas (em greve)", disse.

Outra saída, segundo ele, seria permitir que as cargas que estão paradas transitem pelo "canal verde" (sem verificação) sendo liberadas por inspetores das alfândegas. Loureiro afirma que há uma "orquestração" de greves para forçar aumentos salariais junto ao governo federal.

Valdemir de Souza Santana, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas e de Eletroeletrônicos do Amazonas, previu que se a greve continuar até segunda-feira 60% das linhas de produção de Manaus serão afetadas. Ele disse que a greve dos auditores-fiscais fez com que 6 mil novas vagas deixassem de ser criadas no PIM.