Título: FAO ataca especulação nas commodities
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 11/04/2008, Agronegócios, p. B14

O diretor regional da ONU para a Agricultura e Alimentação (FAO), José Graziano, afirmou ontem que um "ataque especulativo" contra a segurança alimentar mundial tem provocado uma crise de desabastecimento de alimentos básicos, localizada sobretudo em países mais pobres, como o Haiti. "Vivemos um ataque especulativo que depende de uma solução para a crise do dólar, que tem obrigado fundos de investimento a optar pela aplicação em commodities", afirmou.

Ex-ministro de Segurança Alimentar e Combate à Fome do governo Lula, Graziano acusou a busca por maior rentabilidade dos ativos por fundos de investimentos como o principal problema. "É o mercado capitalista. Aí estão desde as velhinhas de Iowa [EUA] até eu, que tenho aplicações em fundos de commodities do Banco do Brasil. Todos estamos ajudando nesse ataque especulativo atrás de melhores retornos dos ativos". Graziano lembrou que os fundos têm usado as bolsas de mercadorias para especular com a antecipação da compra de safras futuras em busca de melhor rentabilidade.

Para o diretor da FAO, que elogiou o governo Lula e o Bolsa Família, o cenário negativo deriva dos baixos estoques de grãos e cereais, defasagem entre oferta e demanda, falta de confiança no dólar como lastro financeiro e da ausência de políticas públicas governamentais. Ele previu que a situação "vai durar" algum tempo. "Depois dessa bolha, que atinge os mais pobres, virá a demanda por recuperação dos estoques mundiais, o que manterá a pressão sobre os preços".

O ex-ministro Graziano avaliou que parte da solução para o atual cenário passa pela atuação de organismos multilaterais, como o FMI, o Banco Mundial e a própria FAO. E recomendou foco no apoio aos produtores familiares via crédito a juros baixos e de longo prazo, além de assistência técnica, recomposição dos estoques, subsídios ao frete e transparência de preços. "Além disso, temos que evitar medidas unilaterais de restrição às exportações com um grande acordo entre os países", disse, em referência à proibição das vendas de trigo argentino e arroz vietnamita. "O crescimento do dragão inflacionário tem obrigado os países a proteger seus mercados".

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, concordou com o diagnóstico de Graziano e pediu uma mudança de modelo agrícola como solução. "Há uma crise no modelo exportador em países que têm capacidade de produzir alimentos, mas que não conseguem prover alimentos aos mais pobres".

Na próxima semana, a FAO realiza em Brasília sua conferência bienal para debater a situação do setor rural em 33 países da América Latina e do Caribe.