Título: Terra de samba, pandeiro e lucro
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 11/04/2008, EU & Investimentos, p. D1

O Brasil continua muito atrativo, apesar das altas recentes da bolsa e do cenário internacional conturbado, e os investidores internacionais procuram cada vez mais conhecer o país do samba e do futebol para aplicar aqui. A avaliação é de Gregory Johnson, presidente mundial da americana Franklin Templeton, uma das maiores gestoras de recursos do mundo e especialista em ações e mercados emergentes. A companhia tem sob gestão US$ 645 bilhões, dos quais 40% estão fora dos EUA, sendo US$ 10 bilhões no Brasil. A Templeton foi pioneira na criação de fundos voltados para mercados emergentes, área hoje sob o comando de Mark Mobius, autoridade mundial do setor. Está presente no Brasil desde os anos 90, quando fez parceria com o Bradesco.

Em visita ao país nesta semana, Johnson avalia que o pior da crise internacional já passou, mas ainda haverá muita turbulência nas bolsas até que os bancos americanos e europeus ajustem suas carteiras às perdas com as hipotecas de risco ("subprime"). A vinda do executivo ao Brasil reforça o projeto de ampliação da atuação da Franklin Templeton no mercado local. Hoje centrada em fundos de ações para clientes de alta renda e fundos de pensão, a gestora está criando uma área de renda fixa para montar fundos multimercados ainda neste ano. Além disso, negocia com bancos para distribuir carteiras de ações diferenciadas no varejo. Começa também a fazer a gestão de fundos de ações de empresas brasileiras para serem vendidos em outros países, como Coréia.

Para Johnson, o Brasil é menos dependente dos EUA e está em melhor posição que outros emergentes, como o México, país diretamente ligado ao mercado americano. Ele destaca a boa forma da economia brasileira. "Quando se analisa o Brasil e, em especial o mercado acionário, logo se pensa em commodities, cujas empresas representam 50% das ações em bolsa e que estão indo bem por conta do mercado internacional, mas estão sujeitas ao risco de queda de preços", diz. "Mas ao falar com as empresas aqui, o que noto é que o crescimento é mais amplo, não se limita a essas companhias, há uma economia mais equilibrada". Para Johnson, isso torna a economia daqui mais sólida e o país menos vulnerável à crise externa.

E, quando se olha o mercado acionário, ainda há oportunidades. "Em termos da relação Preço/Lucro, o valor das ações no Brasil pode estar já num nível justo, mas, olhando para o potencial de crescimento das empresas no médio prazo, comparado com outros países, posso dizer que os papéis aqui estão baratos", diz. Para ele, o cenário político estável, com o governo mantendo o controle fiscal, torna o mercado brasileiro bastante atrativo. "Por isso o Brasil teve uma das melhores performances do mundo em meio à toda onda de vendas de ativos dos últimos meses ao redor do mundo." A boa notícia, acrescenta, é que, mesmo tendo perdido menos, as ações aqui continuam atrativas.

A criação da categoria de investimentos BRIC - que reúne Brasil, Rússia, Índia e China - ajudou a atrair a atenção dos investidores internacionais, mas especialmente para China e Índia, avalia Johnson. "Todos falam sobre os mercados indiano e chinês, por seus bilhões de habitantes e as mudanças que suas economias vivem, mas agora os investidores passaram a falar sobre o Brasil", diz. "No passado, o Brasil era mais um país emergente, mas agora, com a economia crescendo e a bolsa indo bem, todos querem entender o que acontece aqui e conhecer melhor o país."

Com escritórios em 30 países, mas presente em 150 com equipes de análise, a Franklin Templeton tem observado interesse por investimentos no Brasil em vários mercados. "Na Coréia, por exemplo, lançamos este ano um fundo de varejo que aplica em ações brasileiras e que, em poucas semanas, já tem mais de US$ 10 milhões de patrimônio", diz Johnson. Ele tem notado também interesse de investidores americanos em aplicar em ações brasileiras, incluindo investidores mais sofisticados.

Para Johnson, aparentemente a crise de liquidez dos mercados internacionais já chegou ao fundo do poço. "Mas ainda haverá impacto em algumas empresas e bancos, pois a alavancagem era grande e o processo de desmonte dessas operações será complexo", explica. Por isso, ele espera várias decepções com algumas instituições. "Mas o risco de quebra, que era o grande receio do mercado, parece ter ficado para trás com a ação decisiva do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) oferecendo liquidez." Para ele, haverá um processo de desalavancagem dos grandes bancos americanos como nunca se viu antes. "É difícil prever o que acontecerá, mas significa que teremos mais destruição de valor nos mercados acionários mundiais."

Mas Johnson deixa claro também que não há prazo para a crise acabar. "Ouço analistas falando que tudo voltará ao normal no segundo trimestre, mas não acredito, porque isso depende da liquidez e, como diz o ditado, ela está onde você não precisa dela, e isso faz coisas malucas acontecerem ", diz. Como exemplo, ele cita o fato de papéis de boa qualidade não encontrarem compradores, pelo receio de novas quedas de preços, o que dificulta a avaliação dos ativos dos bancos e congela os negócios. Johnson considera o conceito de descolamento das economias emergentes da crise americana muito discutível. Mas destaca que a visão dos investidores externos sobre os emergentes mudou. "Há muito mais saúde nas economias, mais equilíbrio fiscal, as moedas estão estáveis, a inflação sob controle, e isso reduz a percepção de risco".