Título: Bloqueios são revertidos no Judiciário
Autor: Carvalho , Luiza
Fonte: Valor Econômico, 11/04/2008, Legislação & Tributos, p. E2
O advogado Otávio Pinto e Silva afirma que não tem sido possível reaver valores bloqueados em aplicações A Justiça do Trabalho tem se mostrado flexível diante de alguns recursos judiciais que contestam bloqueios de contas bancárias pelo sistema de penhora on-line feitos por juízes para o pagamento de débitos trabalhistas em ações judiciais. Isto tem acontecido, no entanto, apenas nos casos em que é possível comprovar que foi bloqueada parte dos salários de devedores ou ainda contas de terceiros que nada tinham a ver com a dívida trabalhista em questão. O bloqueio de contas salariais passou a ser questionado de maneira mais intensa desde uma recente decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), pela qual a penhora on-line pode ocorrer em uma conta parcialmente salarial.
A penhora on-line tem sido utilizada amplamente pela Justiça do Trabalho desde 2002 por meio do sistema do Banco Central chamado Bacen-Jud. Neste ano, o sistema entrou em sua segunda fase, passando a permitir a consulta on-line de saldos e extratos bancários pelos juízes, o que possibilita o bloqueio do valor da condenação - e não mais de toda a conta bancária, como vinha ocorrendo. De acordo com o artigo 649 do Código de Processo Civil (CPC), são impenhoráveis, dentre outros bens, salários e aposentadorias, a não ser no caso de pagamento de pensões alimentícias. Mas, como os juízes não sabem a natureza da conta que estão bloqueando, cabe ao executado fazer a sua defesa.
Em fevereiro, o TST confirmou uma decisão da 2ª Vara do Trabalho de Belém que determinou a penhora da conta salarial de uma curadora que possuía dívidas trabalhistas com um enfermeiro. Os ministros concluíram que, em virtude de as despesas da curadora serem superiores aos seus vencimentos, ela possuía outras fontes de renda. Para alguns advogados, a decisão fortaleceu a possibilidade de penhora de contas salariais. "A decisão foi um precedente para tornar a penhora salarial comum", diz o advogado Bruno de Almeida Rocha, do escritório Fernando Quércia e Advogados Associados.
Mas, apesar do aumento deste tipo de penhora, tem sido possível, segundo advogados, obter o desbloqueio de contas bancárias. A banca Fernando Quércia conseguiu reverter uma decisão judicial que bloqueou a conta salarial de dois diretores de uma empresa condenada na Justiça trabalhista a pagar uma indenização de R$ 45 mil a uma ex-funcionária. Segundo Rocha, o juiz de primeira instância determinou o desbloqueio por considerar que todo o valor das contas era proveniente dos salários dos diretores. O advogado Eduardo Luiz Brock , do escritório Dantas, Lee, Brock e Camargo Advogados, afirma que também obteve desbloqueios em vários casos na primeira instância ao provar a existência de depósitos constantes na conta penhorada que caracterizariam salários. Segundo o advogado Sólon Cunha, do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, em muitos casos foi possível reverter não apenas decisões judiciais de penhora de salários como também de fundos de previdência privada.
O bloqueio de contas bancárias de terceiros também tem sido alvo de contestações judiciais. Foi o caso de um estudante universitário que teve sua conta bloqueada por causa de dívidas trabalhistas de seu professor. Por exigência da agência de fomento à pesquisa, ambos mantinham uma conta conjunta para receber depósitos referentes ao custeio de uma bolsa estudantil destinada somente ao aluno. Segundo o advogado Otávio Pinto e Silva, do Siqueira Castro Advogados, foi possível provar que aquela conta não pertencia ao professor - e o juiz efetuou o desbloqueio. Já o advogado Sérgio Schwartsman, da banca Lopes da Silva & Associados, conseguiu desbloquear cerca de R$ 8 mil da conta da filha do sócio de uma empresa executado na Justiça do Trabalho com a apresentação de um recurso junto a uma vara trabalhista. O desembargador Valdir Florindo, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, conta que tem feito alguns desbloqueios nestes casos, mas que, por vezes, há abusos nos recursos. "Esta é ainda uma área cinzenta nos TRTs", diz Florindo.
Apesar da possibilidade de desbloqueios, nem sempre isto acontece. Para Otávio Pinto e Silva, do Siqueira Castro, não tem sido possível reaver valores bloqueados em aplicações financeiras. Já para a advogada Virgilia Falcão, da banca Machado Neto, Bolognesi, Azevedo e Falcão, não é fácil comprovar que a conta penhorada já possuía um destino específico como, por exemplo, o dinheiro para o pagamento de salários. "Nas pequenas empresas, por vezes a conta não contém apenas os pagamentos, mas outros valores", diz.
A morosidade dos juízes ao fazer o desbloqueio é uma queixa freqüente entre os especialistas. Isto aconteceu, por exemplo, no desbloqueio da conta de um ex-diretor de uma empresa, autorizado após a comprovação de que a reclamação trabalhista teve origem quando ele não trabalhava mais no local. Segundo Schwartsman, do Lopes da Silva, que atuou no caso, por ordem da penhora, o dinheiro havia sido transferido para o Banco Central. "Há seis meses tentamos recuperar o valor, mas ainda não conseguimos obter o comprovante da transferência", diz Schwartsman. Na opinião da ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), um "absurdo que vem acontecendo" são juízes que bloqueiam valores de contas bancárias via sistema on-line mas desbloqueiam pelo papéis tradicionais.