Título: Desenvolvimento econômico e Previdência Social
Autor: Marinho , Luiz
Fonte: Valor Econômico, 14/04/2008, Opinião, p. A14

Em fevereiro, a necessidade de financiamento da Previdência Social caiu 31,2% em relação ao mesmo mês de 2007. A tendência de aumento das receitas em taxas superiores ao das despesas, registrada desde o ano passado, se manteve. A arrecadação cresceu 8,4% e a despesa ficou estável. Isso confirma nossa tese de que o crescimento econômico, com controle de inflação e redução das taxas de juros, aliado a investimentos públicos e privados, principalmente nas áreas de infra-estrutura e logística do país, resulta na recuperação e fortalecimento do mercado de trabalho e, consequentemente, na melhoria da arrecadação. A soma desses fatores levará, no curto prazo, ao equilíbrio das contas da previdência urbana e, no médio prazo, na significativa redução do déficit total do Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

O ciclo de crescimento econômico dos últimos anos tem permitido uma elevação sistemática e homogênea do emprego, tanto setorialmente quanto geograficamente, e a formalização vem batendo sucessivos recordes, com impactos positivos tanto no percentual de cobertura quanto de arrecadação do RGPS. Os dados do Caged/MTE mostram que, em 2007, foi registrado o melhor ano de toda a série histórica, com criação de 1,6 milhão de postos de trabalho com carteira assinada. Em fevereiro, foram 204.963 vagas, ou 38,4% a mais do que no mesmo mês de 2007.

Em números correntes, o déficit total na contabilidade tradicional, no ano passado, foi de R$ 44,8 bilhões - a previsão oficial era de mais de R$ 47 bilhões. E se não fosse a antecipação, para dezembro, de metade dos benefícios dos segurados que ganham até 1 SM, o que representou um gasto extra de R$ 2,7 bilhões no ano, teríamos fechado com queda no déficit, fato inédito desde meados da década de 90. Mesmo com a antecipação, o déficit do RGPS caiu de 1,8% do Produto Interno Bruto (PIB) para 1,75%.

As primeiras projeções para 2008 indicaram queda para R$ 43,9 bilhões na necessidade de financiamento. O resultado do primeiro bimestre nos levou a refazer estimativas e reduzi-las em quase R$ 1 bilhão, ou seja, o equivalente a 1,52% do PIB. A confirmarem-se nossas projeções - e vamos trabalhar para isso - poderemos ter, neste ano, uma redução de R$ 3 bilhões no déficit previdenciário.

A melhora dos resultados, no entanto, não é motivo para acomodação. Isso nos anima e impulsiona, mas também impõe sobre todos nós - que temos a missão de administrar a Previdência Social - um desafio ainda maior: o de consolidar o caminho para o equilíbrio das contas. Está claro que é necessário pensar o longo prazo. A entrada de milhares de novos segurados no sistema aumenta a arrecadação atual, mas representa, no futuro, um número maior de beneficiários. Os que contribuem hoje ajudam a manter os pagamentos dos aposentados e pensionistas atuais com a certeza de que a futura geração de trabalhadores, que ainda nem entrou no mercado de trabalho, manterá os deles. Este é o chamado pacto entre as gerações que só será cumprido se o sistema se mantiver sólido. Além disso, não podemos ignorar a influência da evolução demográfica nas contas da Previdência.

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O aumento da expectativa de vida, especialmente a partir do momento em que a pessoa se aposenta, amplia o número de anos em que o segurado recebe o benefício. A conta não fecha. O Censo Previdenciário, realizado entre outubro de 2005 e dezembro de 2007, recenseou 538.345 segurados com idades entre 90 e 128 anos, sendo que 1.368 têm mais de 108 anos. Por outro lado, a redução da taxa de natalidade decorrente do planejamento familiar diminui expressivamente a quantidade de jovens contribuintes.

Esse quadro nos coloca diante de questões fundamentais, entre elas, qual o tempo de contribuição e o de manutenção do benefício que garante a sustentabilidade do sistema? A sociedade precisa enfrentar esse debate agora. Caso contrário, o ajuste do sistema previdenciário passará inevitavelmente pelo aumento do tempo de contribuição e/ou idade mínima para os trabalhadores que estão na ativa. Precisamos pensar a longo prazo para preservar os direitos dos atuais trabalhadores. Hoje a Previdência está sob controle, o problema será daqui a 30 ou 40 anos.

Outro desafio que perseguimos com afinco é a melhor transparência das contas. A sociedade tem direito a dados precisos sobre este sistema. Durante décadas, os números foram usados por pretensos especialistas de forma maliciosa, com o único intuito de fundamentar o discurso em defesa da privatização. A análise criteriosa dos dados joga por terra todos os mitos de que um suposto "rombo" nas contas previdenciárias impedia o crescimento econômico do Brasil. Entretanto, se retirarmos da contabilidade de 2007 as renúncias em favor de entidades filantrópicas, de empresas optantes do Simples e da exportação rural, que têm fontes próprias de financiamento, garantidas pelo Tesouro Nacional, os cofres da Previdência teriam cerca de R$ 14 bilhões a mais. Além disso, temos de tirar desta conta a aposentadoria rural que, como em todos os países do mundo, é subsidiada. E a Constituição Cidadã de 1988 prevê formas de custeio da previdência do trabalhador rural. No mês passado, por exemplo, a previdência rural teve déficit de R$ 2,433 bilhões. Já a urbana, mantida com a contribuição mensal de trabalhadores e empresas, foi superavitária em R$ 405 milhões.

A trajetória exige a continuidade das medidas para melhorar a gestão na administração dos benefícios e no combate às fraudes. Atuamos com determinação para conceder com rapidez e eficiência os benefícios àqueles que têm efetivamente direito. E agimos com todo rigor contra os que tentam fraudar a Previdência. Não podemos prescindir também do excelente trabalho da Receita Federal na cobrança das contribuições.

A gestão eficiente é, acima de tudo, questão de justiça, um imperativo na preservação dos direitos dos que trabalharam na construção deste país e que contribuíram, com sacrifício, para a formação do sistema previdenciário brasileiro. Isso nos leva a perseguir com obsessão a melhoria da administração pública.