Título: Brasil prepara ações contra subsídios dos Estados Unidos se Doha fracassar
Autor: Moreira , Assis
Fonte: Valor Econômico, 15/04/2008, Brasil, p. A2

Se não houver um acordo agrícola nas próximas semanas na Rodada Doha, uma das primeiras atitudes do Brasil será "retomar" na Organização Mundial do Comércio (OMC) a disputa contra 88 programas de subsídios agrícolas dados pelos Estados Unidos. Foi o que indicou ontem o chefe da divisão de contenciosos do Itamaraty, ministro Flávio Marega, reconhecendo que o painel (comitê de especialistas) aberto pelo Brasil e Canadá contra os americanos ficou em "banho-maria" desde o fim do ano passado, esperando os rumos da negociação global.

Os Estados Unidos tinham reclamado que o Brasil e o Canadá denunciavam excesso de subsídios em programas que teriam deixado de existir há mais de cinco anos. Já os brasileiros defendiam o contencioso para pressionar em plena negociação. Na prática, o contencioso ficou no ponto morto. Nem os três juízes do caso foram escolhidos até hoje. Marega afirma que, em todo caso, com ou sem rodada, outras disputas poderão ser abertas pelo Brasil, mirando sobretudo barreiras sanitárias e técnicas, que aparecem como último bastião do protecionismo agrícola.

De outro lado, o país aguarda se a União Européia voltará à OMC na briga dos pneus. Os europeus queriam que o Brasil reabrisse o mercado para a entrada de pneus remoldados, o que Brasília recusou. Já no Mercosul, um acordo deve levar os quatro sócios a não mais importarem pneus usados de fora do bloco, mas poderão fazer uma "gestão regional" desses produtos, ou seja, a exportação entre eles continuaria - algo que a UE considera discriminatório.

O Brasil mantém a expectativa de um acordo agrícola e industrial em maio. Para isso, o Mercosul, por iniciativa do Brasil, fez uma pequena concessão na negociação industrial ontem, abrindo mão de exceção ilimitada em termos de valor de importação para proteger setores industriais sensíveis. Os europeus e europeus diziam não aceitar isso de toda maneira.

Já a China, o país que mais vai ganhar na área industrial, pediu entre três a cinco anos de prazo a mais que outros emergentes para abrir mais o próprio mercado, provocando a imediata rejeição de Washington e Bruxelas.

Além da dramática crise de alimentos que se seguiu à grave crise financeira internacional, a atitude do Congresso americano de engavetar a aprovação do acordo comercial EUA-Colômbia preocupa negociadores em Genebra. O freio ocorreu mesmo depois de o acordo ter sido reaberto por exigência dos democratas para incluir cláusulas ambientais e trabalhistas. A democrata Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Deputados, argumentou que não era tempo para o acordo, visto a deterioração da situação econômica. A questão é como será diferente com Doha.

Também há expectativa sobre a capacidade de os emergentes conseguirem fechar um acordo comercial Sul-Sul, para reduzir tarifas entre países em desenvolvimento. A decisão será tomada à margem da grande reunião da Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad), na semana que vem em Acra (Gana). O problema é a Índia, que quer excluir 30% de suas linhas tarifárias de reduções. A Malásia e a Tailândia, porém, consideram isso inaceitável e resistem até à proposta modesta do Mercosul, de exclusão de 5% dos produtos.