Título: Diretor da ANP anuncia megacampo e cria confusão
Autor: Schüffner ,Cláudia ;Rosas*, Rafael
Fonte: Valor Econômico, 15/04/2008, Brasil, p. A3

O diretor geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Haroldo Lima, surpreendeu o mercado ontem com a informação de que o campo Carioca, localizado no bloco BM-S-9 da bacia de Santos e uma das grandes descobertas da Petrobras no pré-sal, teria reservas de 33 bilhões de barris de óleo. Esse volume é cinco vezes mais do que a estatal estima para o campo gigante de Tupi (5 a 8 bilhões de barris de petróleo e gás), também na bacia de Santos, e três vezes maior que as atuais reservas provadas de petróleo do país, que fecharam 2007 em 11,41 bilhões de barris de óleo, sem incluir o gás.

Lima atribuiu as informações a fontes "oficiosas" da Petrobras. Em um fato inédito, a estatal não confirmou as informações do presidente da agência e informou, em nota, que a confirmação do tamanho da descoberta depende ainda da perfuração de novos poços, de testes de longa duração, e de novos estudos geológicos.

Logo depois do anúncio, as ações da Petrobras começaram a subir, tendo as ordinárias encerrado o dia com valorização de 7,68%, e as preferenciais com alta de 5,63%. Com a alta, o valor de mercado da Petrobras aumentou R$ 26,7 bilhões ontem, em relação ao fechamento de sexta-feira.

As declarações do diretor-geral da ANP causaram confusão porque deram dimensões (na forma de bilhões de barris) para as enormes especulações que já existem no mercado sobre as reservas descobertas nos campos adjacentes a Tupi. Contudo, técnicos e especialistas ouvidos pelo Valor são unânimes ao afirmar que é cedo para estimativas de números, já que as áreas ainda estão sendo perfuradas. Carioca só teve duas perfurações até agora, segundo a Petrobras. O bloco é operado pela estatal, com 45%, tendo como sócias a BG (30%) e a Repsol YPF (25%).

Carioca está situado na bacia de Santos, junto a outros campos, alguns licitados, outros não. Uma das maiores confusões envolvendo a área é o nome Pão de Açúcar (Sugar Loaf em inglês), uma acumulação gigantesca no pré-sal sobre a qual foram licitados os blocos BM-S-8 (batizado de Bem-te-Vi), BM-S-9 (Carioca), BM-S-21 (Caramba) e BM-S-22. Os três primeiros são operados pela Petrobras e o último pela Exxon junto com a Hess, tendo a estatal como minoritária. Lima falou como se Carioca e Pão de Açúcar fossem a mesma coisa, e não são. Carioca é uma parte do que está sendo chamado de Pão de Açúcar.

O analista Emerson Leite, do banco Credit Suisse, estima que apenas 60% da estrutura do Pão de Açúcar foi licenciada, estando o resto ainda sob controle da União. Leite estima em 15 bilhões de barris de petróleo as reservas já licenciadas do Pão de Açúcar, o que aumenta para 25 bilhões de barris se forem incluídas as áreas ainda não leiloadas. As duas estimativas são bem menores do que a anunciada ontem pelo dirigente da ANP.

Na polêmica, Lima mencionou Carioca, Pão de Açúcar e o BM-S-9 como sendo a mesma coisa. "Estamos sabendo por canais não-oficiais, oriundos evidentemente da operadora, que o prospecto de Carioca, que também é chamado internacionalmente de Pão de Açúcar, apontaria para reservas de petróleo cinco vezes maiores do que as reservas de Tupi. Como as reservas de Tupi vão de 5 a 8 bilhões de barris, Carioca seria em torno de 33 bilhões", concluiu Lima, que em seguida lembrou que essa pode ser a maior descoberta feita no mundo nos últimos 30 anos.

A indiscrição do presidente da ANP, a quem não cabe falar sobre o assunto, provocou reação imediata da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A autarquia divulgou uma nota dizendo que "considera prejudicial a divulgação de informações sobre companhias abertas por pessoas que não façam parte da sua administração ou que não sejam seus porta-vozes".

O comunicado continua dizendo que a regra vale "especialmente se forem informações com potencial de influenciar os preços das ações negociadas no mercado e a decisão dos investidores de comprar ou vender", ensina o xerife do mercado de capitais brasileiro. A CVM finalizou a nota informando que ainda iria analisar "mais detidamente se haverá providências a adotar", sinalizando a possibilidade de interpelar o próprio Lima.

Após a repercussão das declarações de Lima, a ANP divulgou nota esclarecendo que os comentários foram "de caráter oficioso" e que ao invés de partirem da Petrobras, que é concessionária da ANP, eram "de conhecimento público, tendo, inclusive, sido publicadas na edição de fevereiro da revista 'World Oil', na coluna 'What´s New in Exploration'". Trata-se de publicação desconhecida.

O autor do artigo, Arthur Berman, menciona Carioca como tendo reservas de 33 bilhões de barris, informação atribuída por ele a fonte não-oficial, mas qualificada. Após citar trechos de relatório do UBS Pactual, a própria "World Oil" cita como fonte outra publicação, a "Next Energy News", que atribui, por sua vez, a "fontes oficiais da Petrobras" a informação de que Carioca tem possibilidade de produzir até 40 bilhões de barris.

A "World Oil" também divulgou ranking, onde Carioca aparece como o terceiro maior campo do mundo, atrás apenas de Ghawar (Saudita) e Greater Burgan (Kuwait). Em fato relevante enviado ao mercado, a Petrobras não confirmou qualquer previsão, sobretudo sobre reservas. Ela informou que "dados mais conclusivos sobre a potencialidade do BM-S-9 (Carioca) só serão conhecidos depois da conclusão das demais fases do processo de avaliação". Segundo a estatal, a confirmação do tamanho da descoberta depende da perfuração de novos poços, de teste de longa duração e de novos estudos geológicos. No momento, disse a estatal, a única informação sobre o BM-S-9 é que ali foi encontrado óleo leve, de 27º API, a 273 quilômetros da costa paulista, através da perfuração do poço 1-BRSA-491-SPS. O segundo poço na área foi perfurado dia 22 de março e até o momento "não atingiu a camada do pré-sal".