Título: Guilhotina no chefe da polícia no Rio
Autor: Leite, Larissa
Fonte: Correio Braziliense, 16/02/2011, Brasil, p. 9

Ao longo dos últimos quatro anos, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho, sustentou boa parte da sua popularidade escorado na bandeira da segurança pública. Durante as eleições de outubro, especialmente, o aliado do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez campanha com a cartilha das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) ¿ que tem a proposta de retirar o controle armado de traficantes nas favelas ¿ debaixo do braço. Resultado: acabou reeleito com folga e encerrou o ano comemorando a ocupação do Complexo do Alemão e da Vila Cruzeiro.

Mas se a alardeada segurança protagonizou o primeiro mandato sem dramas, as cenas do segundo certamente não estavam no roteiro imaginado por Cabral. A começar pela ação policial contra integrantes das próprias polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro, acusados de proteger traficantes e a máfia dos caça-níqueis na Operação Guilhotina, deflagrada na semana passada. O caso expôs as fragilidades da segurança pública no Rio, provocou 39 prisões e mudança na chefia da Polícia Civil. Mais que isso: revelou também que era de conhecimento das autoridades de segurança a participação de agentes corruptos na ocupação do complexo, em novembro do ano passado. Denúncias apontam abusos contra moradores das duas favelas.

Na manhã de ontem, o então chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, Allan Turnowski, teve uma longa reunião com o secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, e deixou o cargo. Por meio de uma nota, a secretaria agradeceu a dedicação e a fidelidade de Turnowski durante sua gestão, afirmando que ¿Allan implantou projetos que contribuíram para a redução da criminalidade no estado¿. Ainda segundo a secretaria, a saída do cargo ¿seria a decisão mais adequada para preservar o bom funcionamento das instituições¿. Turnowski também divulgou uma nota logo em seguida, na qual afirmou: ¿Deixei o cargo de chefe de polícia após uma conversa franca e aberta com o secretário Beltrame. Deixo para meu sucessor uma série de iniciativas estruturantes que podem elevar a Polícia Civil a outro patamar¿.

Após quatro dias sem se pronunciar sobre a nova ação policial no Rio, o governador Sérgio Cabral ressurgiu. Agradeceu as contribuições de Turnowski, na tarde de ontem, e comentou sobre a sucessão do cargo: ¿A política de segurança pública é traçada pelo secretário de Segurança, com o aval do governador. Portanto, na escolha de comandantes de batalhão, de delegados, na promoção por mérito de policiais e na escolha do comandante da PM e do chefe da Polícia Civil, a decisão é do secretário José Mariano Beltrame. Ele tem o meu aval para tomar a decisão¿.

Toda a confusão envolvendo a cúpula policial culmina com a saída de Turnowski, mas tem início com as investigações após um vazamento de informações sobre uma captura que seria feita na Rocinha (leia quadro ao lado). A demissão ocorre depois do início da Operação Guilhotina e dois dias após o então chefe da Polícia Civil ter conduzido uma ação na Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Draco).

A ação na Draco não foi feita no âmbito da Operação Guilhotina, mas o delegado da Draco, Cláudio Ferraz, cooperou com a operação e com a prisão do delegado Carlos Oliveira, ex-braço direito de Turnowski. Segundo o ex-chefe da Polícia Civil, a denúncia do suposto esquema de corrupção na delegacia de repressão chegou por uma carta anônima, deixada na portaria do seu prédio. Um dia antes da Operação Guilhotina, a Draco, que estava sob o comando da Polícia Civil, voltou a ser subordinada à Secretaria de Segurança Pública. Na mesma ocasião, o delegado Cláudio Ferraz foi nomeado subsecretário da Contra Inteligência.

À noite, a secretaria anunciou a delegada Marta Rocha, que ocupava atualmente a direção-geral da Divisão de Polícias de Atendimento à Mulher (Dpam), como a nova chefe de Polícia Civil. Marta já foi subchefe da Polícia Civil, em 1999. Com isso, Cabral certamente espera virar a página nesse começo de ano turbulento. Se vai obter sucesso, só as próximas cenas do suspense policial vão dizer.

Operações polêmicas Policial civil há 15 anos, o delegado Allan Turnowski estava à frente da corporação desde abril de 2009. Antes de assumir o cargo, era responsável pelo Departamento de Polícia Especializada e coordenou operações polêmicas, que prenderam importantes traficantes do Rio de Janeiro, entre elas, uma ação na Favela da Coreia em outubro de 2007, quando 12 pessoas ¿ 10 supostos traficantes ¿ morreram.

Freixo defende PF » Ex-presidente da CPI que investigou a ação das milícias no Rio, o deputado estadual Marcelo Freixo disse que o trabalho das corregedorias policiais é insuficiente para esclarecer as suspeitas de conivência dos oficiais com o crime organizado. "Nós precisamos da ação da Polícia Federal. Pelo menos relativamente ao controle interno, temos gravíssimos problemas", afirmou o parlamentar do Psol, em pronunciamento na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). O deputado citou o delegado Cláudio Ferraz, da Draco, dizendo que ele foi estratégico nas informações levantadas pela CPI das Milícias. Outra CPI proposta por Freixo, para investigar o tráfico de armas, foi aprovada na semana passada. O deputado inspirou o personagem Diogo Fraga, militante dos direitos humanos no filme Tropa de Elite 2.