Título: PAC ajuda setor de bens de capital, mas importação preocupa
Autor: Galvão , Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2008, Brasil, p. A5

A produção industrial de bens de capital não-seriados cresceu 13,9% no primeiro bimestre, comparada ao mesmo período do ano passado. Esse desempenho decorre da maior aceleração dos investimentos públicos em infra-estrutura. Exemplos desse aquecimento são os desembolsos para as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que tiveram, no primeiro trimestre, média diária de R$ 15,4 milhões - mais que o dobro da média diária nos primeiros três meses de 2007.

Apesar do aumento da produção doméstica, o presidente da Associação Brasileira da Infra-estrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, vê com preocupação o forte aumento das importações, principalmente da China.

Nesse cenário, os dois maiores desafios para o setor são, segundo Godoy, ter ritmo crescente dos investimentos em infra-estrutura e recuperar a competitividade que as indústrias do país tinham há dez anos. Os fabricantes estrangeiros estão ganhando espaço. A Abdib informa que, de janeiro a julho de 2007, as importações de bens de capital não-seriados representaram 86% das compras realizadas entre janeiro e dezembro de 2006.

Para todos os bens de capital, inclusive os seriados, a importação saltou 32,74% em 2007, na comparação com 2006. O valor total das compras no ano passado foi de US$ 25,12 bilhões. Neste ano, no primeiro trimestre, o crescimento acelerou para 60%. "A importação preocupa bastante. Não queremos barreiras contra concorrentes estrangeiros, mas competitividade nas áreas tributária, financeira e logística", diz Godoy.

Como exemplo das enormes dificuldades em concorrer com a China, ele cita o mercado dos grandes guindastes, equipamentos que movimentam até 60 toneladas. Apenas uma indústria chinesa produz 30 unidades por dia. No Brasil, toda a produção anual não chega a 200 guindastes.

O forte ritmo de crescimento da produção de bens de capital não-seriados no primeiro bimestre de 2008 é confirmado por outras comparações feitas pela Abdib. Em fevereiro, a produção cresceu 17,3% em relação ao mesmo mês de 2007. No acumulado em 12 meses - março de 2007 a fevereiro de 2008 -, o aumento foi de 8,7% sobre igual período. A curva está ascendente desde novembro do ano passado, quando a variação foi de 7,1%. O pico foi verificado em julho do ano passado (11,9%).

Godoy revela que, no momento, os desempenhos mais dinâmicos ocorrem nos segmentos de agroindústria, transporte, mineração, siderurgia, cimento, papel/celulose, petróleo/gás e energia elétrica. O crescimento da produção desses bens de capital é impulsionado pelo expressivo aumento do investimento público em infra-estrutura.

De acordo com a ONG Contas Abertas, os órgãos públicos federais, nos três poderes (excluindo estatais), desembolsaram R$ 3,4 bilhões no primeiro trimestre, maior valor dos últimos oito anos com a execução de obras e compra de equipamentos para o período.

Outra comparação feita pela ONG explica a elevação da produção de bens de capital não-seriados. No dois primeiros meses deste ano, os investimentos das estatais alcançaram R$ 5,9 bilhões. É o maior volume dos últimos dez anos para o período. A Petrobras é responsável por 91% do total.

A perspectiva, apesar dos bons números da produção de bens de capital não-seriados, pode não ser das mais promissoras. O professor de economia na FGV, em São Paulo, e na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Frederico Turello, adverte que há expressivo aumento das despesas correntes, sustentado pelo forte crescimento da arrecadação. Turello avalia que pode ser interrompido o atual ciclo de elevação de receitas com base no maior lucro das empresas. Nesse cenário, seria reduzido o espaço para investimento.

Turello afirma que, se o motor público não é tão potente, o Brasil também precisa dar mais estabilidade regulatória na infra-estrutura. Como exemplo, cita a iminente compra da Brasil Telecom pela Oi , que pode provocar insegurança jurídica nos investidores privados.

Na análise de outro professor da FGV, Arthur Barrionuevo Filho, a indústria representada pela Abdib depende de acesso competitivo ao capital porque nesse mercado, em todo o mundo, o vendedor financia o comprador. Ele aponta que essa é uma das crônicas dificuldades no Brasil. "Quando eles vão bem, o país vai bem, porque avança em sua infra-estrutura", diz.

O presidente da Abdib reconhece que as 29 propostas levadas pela associação ao governo coincidem com os conceitos de política industrial. Seu otimismo está concentrado em três reivindicações. A primeira é a desoneração de investimentos em infra-estrutura por meio da depreciação acelerada, o que reduzirá o peso do IR das empresas. Ainda no âmbito tributário, o Godoy espera redução do prazo para recuperação dos créditos de PIS/ Cofins obtidos na compra de bens de capital. E aguarda a criação de um "banco de projetos" no BNDES, que diz ser essencial para o planejamento de longo prazo.