Título: Doha não trouxe ganhos, diz Camargo Neto
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2008, Brasil, p. A6

O acordo agrícola na Rodada Doha, que o Brasil e outros países querem fechar no mês que vem em Genebra, é contestado por setores do agronegócio do país. Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação Brasileira dos Exportadores de Carne Suíça, denuncia que será "triste" o país aceitar o acordo "pífio, entre modesto e medíocre" que está na mesa de negociação.

Ele refuta avaliação do Itamaraty de que o o setor agrícola já "embolsou" os ganhos da Rodada Doha. "O que o setor embolsou não tem nada ver com Doha", afirmou, insistindo que que a liderança do Brasil na negociação na Organização Mundial do Comércio (OMC) trouxe na prática poucos ganhos. "Ao longo de duas rodadas de negociações em vinte anos, o Brasil se transformou em potência agrícola, é o líder exportador de inúmeros produtos, e nada disto ocorreu em função de negociação comercial", afirmou.

"Foi o Itamaraty que precisou da agricultura para ser líder. A única mesa G-4 (com os EUA, UE e Austrália) que o Brasil senta é uma de negociação agrícola como resultado da pujança do agricultor brasileiro e não da diplomacia. Felizmente, a agricultura brasileira não precisou ou precisa da negociação da OMC", disse.

Para Camargo Neto, "faltou ousadia ao Brasil em Doha. A prioridade do Itamaraty não foi comércio, muito menos agrícola. A agricultura brasileira, líder de fato no comércio, abriu espaço político para eles", argumenta. Ele avalia que a agricultura brasileira terá "na melhor das hipóteses um pequeno avanço" na abertura dos mercados dos países desenvolvidos, em particular da União Européia. Ganhará aumentos de cotas para alguns produtos que representarão preços melhores, porém dentro do mesmo volume já exportado.

Na briga contra os subsídios, onde o confronto é com os Estados Unidos, ele reclama que o Tesouro norte-americano continuará com pouca restrição para apoiar seu agricultor, maior concorrente brasileiro nos mercados asiáticos em expansão.

Sua conclusão é de que "conseguimos, com clareza, apenas o fim dos subsídios à exportação, proibidos há 30 anos no setor industrial, eliminados há 10 anos das políticas norte-americanas, e com fim anunciado há 5 anos pela União Européia, e que deve ser ratificado em Doha".

Camargo Neto critica o posicionamento -"no mínimo tímido" - do país no debate global sobre a alta dos preços agrícolas. "O único discurso que mostramos nos fóruns internacionais é o de defesa do etanol, certamente por decisão pessoal do presidente Lula, e não estratégia da diplomacia comercial", afirma.

"O Brasil, o país que deve apresentar maior resposta em volume para o crescimento da demanda de alimentos, ao invés de utilizar o momento para propor alternativas e soluções para a fome no mundo, parece estar mais preocupado com o fim da Rodada mesmo com resultado pífio", completou.