Título: Copom promete um ciclo curto de elevação do juro
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 22/04/2008, Opinião, p. A14

A esperada, e em grande medida contestada, decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar a taxa básica de juros (Selic) não deverá provocar, como professaram alguns analistas, um "cavalo-de-pau" na economia brasileira em 2008. O comunicado emitido pelo Copom indica que o aperto da política monetária deverá ser forte e rápido. A intensidade do movimento, que aumentou a Selic de 11,25% para 11,75% ao ano, sugere que, tão logo as expectativas inflacionárias e a própria inflação corrente cedam, a taxa poderá voltar a cair.

A reação positiva dos mercados mostra que a decisão do BC foi bem digerida. As taxas de juros de curto prazo embutidas nos CDIs aumentaram. Já as de longo prazo declinaram. O mercado não espera, portanto, que a autoridade monetária promova um arrocho que aborte o atual ciclo de crescimento da economia. Não acredita também que a inflação saia do controle nos próximos meses.

O próprio BC elevou, no fim de março, sua expectativa de crescimento do Produto Interno Bruto para este ano - de 4,5% para 4,8%. O que está sendo feito agora é um movimento preventivo para evitar grandes deslocamentos de juros adiante, aí, sim, com uma possível interrupção abrupta da expansão do PIB. O propósito é ajustar a demanda a um nível compatível com a oferta.

A inflação, medida pelo IPCA, mostrou que está em alta mesmo quando se retiram os alimentos do seu cálculo. O indicador diminui, mas revela crescimento quando comparado ao que aconteceu nos dois últimos anos, depois de feitas as mesmas exclusões. O núcleo por exclusão do IPCA, que é calculado a partir da retirada dos alimentos e dos preços administrados, também está em alta desde meados de 2007.

Em junho passado, o núcleo por exclusão acumulado em 12 meses estava em 3,42%. Em dezembro, pulou para 4,11%. No mês passado, foi a 4,41%. Quando se anualizam os principais índices de preços apurados no primeiro trimestre do ano, o retrato da inflação é ainda mais preocupante - 6,2% no IPCA, 8,6% no IGP e 10% no IPA da indústria.

A demanda dá sinais evidentes de que está crescendo de forma insustentável. Em fevereiro, as vendas no comércio expandiram 12,2% quando comparadas a fevereiro de 2007. As fontes de estímulo ao consumo seguem atuando de forma intensa. O crédito livre para pessoa física cresceu, em termos reais, 19,6% em fevereiro, também na comparação com o mesmo mês do ano anterior. A massa salarial avançou, por sua vez, 6,2% naquele mês.

O mercado espera um arrefecimento do crédito na segunda metade do ano. Os juros e spreads bancários cobrados por bancos e financeiras vêm subindo desde o início do ano. Isso deve diminuir um pouco a atividade varejista, mas não a ponto de estrangular o bom momento vivido pela economia.

Uma das preocupações levantadas contra o aperto monetário diz respeito à possível redução do ímpeto dos investimentos. Há quase três anos eles vêm crescendo de forma espetacular - em geral, num ritmo 2,5 vezes superior à taxa de expansão do PIB. No último trimestre de 2007, avançou 16,03%. A alta da Selic, que, estima-se, chegará a dois pontos percentuais até o fim do ano, provavelmente afetará decisões de investimento, mas não na intensidade apregoada pelos críticos do Copom.

O Banco Central está fazendo a sua parte para controlar a demanda e, assim, manter a inflação sob controle. Falta, agora, o governo fazer a sua. O gasto público é parte relevante da absorção doméstica. Dos três componentes da demanda - os outros dois são o consumo das famílias e os investimentos -, é um dos que mais têm crescido (10%, em termos reais). Se não tem como controlar a demanda do governo, o Copom aplica um remédio mais amargo ao setor privado.

A ata da última reunião do Comitê, que será divulgada na quinta-feira, deve ajudar a elucidar as razões que justificam a alta da Selic. O ideal seria colocar o dedo na ferida, chamando atenção para a expansão desenfreada das despesas públicas. No entanto, dada a hostilidade que setores do governo, como o Ministério da Fazenda, devotam ao BC, dificilmente o Copom explicitará todas as suas razões.