Título: Nova opção de captação externa
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Fonte: Valor Econômico, 22/04/2008, Finanças, p. C1

A febre de emissões públicas inicias de ações (IPOs) diminuiu. Mas, o volume de negócios no mercado secundário na Bolsa de Valores de São Paulo continua forte, em torno de R$ 6 bilhões por dia, criando as condições ideais para o lançamento de um novo tipo de título das empresas e bancos brasileiros no exterior: os eurobônus conversíveis em ações. Inúmeras transações desse tipo estão no forno, em um momento no qual uma maior criatividade é necessária para obter recursos por um prazo mais longo a custo menor.

Ao lançar esses papéis, os emissores podem pagar juros menores do que em um eurobônus tradicional. A razão: quando adquire os títulos, o investidor leva junto o direito de compra das ações do emissor. A opção de compra tem um preço que eleva o preço total do título, reduzindo seu rendimento, que se move no sentido contrário.

Por enquanto, a Vale e o português Banco Espírito Santo surfaram a nova onda e lançaram eurobônus conversíveis em ações de empresas brasileiras em grandes emissões públicas, de valores de US$ 1,88 bilhão e de US$ 1 bilhão, respectivamente. A Infinity Bio-Energy, do empresário brasileiro Sergio Thompson-Flores, também lançou US$ 129 milhões desses títulos no exterior.

"Agora que um número maior de empresas e bancos brasileiros passaram a ter ações negociadas em bolsa e de maior liquidez, os bônus conversíveis se tornam uma alternativa viável de captação externa", diz Roberto Vianna, sócio da Lefosse Advogados, que atua no Brasil em cooperação com a Linklaters Internacional. Segundo ele, o investidor "mais sofisticado" que compra os papéis conversíveis - como bancos de investimento, fundos de pensão ou de hedge- quer títulos que possam ser trocados por ações líquidas, que possam ser vendidas facilmente.

São naturais candidatas a lançar esses papéis empresas do setor imobiliário, de commodities agrícolas e energias alternativas. "Os bônus conversíveis são uma forma de baratear as operações de renda fixa para empresas que abriram capital na bolsa", concorda Fábio Solferini, presidente do Banco Standard de Investimento, que também vê potencial nesse novo tipo de produto. "É um mercado ainda não atendido, carente de ofertas", diz José Olympio Pereira, responsável pelo banco de investimento do Credit Suisse no Brasil.

Alexei Remizov, responsável pela área de mercado de capitais do HSBC, acredita que os bônus conversíveis em ações podem se tornar uma importante fonte de captação para empresas brasileiras. "Mas, como em todo o mercado novo, há ainda muitas questões legais não resolvidas", diz. A principal dúvida é com relação ao direito de preferência dos acionistas minoritários. A empresa tem de oferecer a eles primeiro as novas ações de forma a não diluir sua participação no capital. Isso só não precisaria acontecer se o estatuto social da empresa tiver uma cláusula explícita que permita a emissão de ações, bônus de subscrição ou debêntures conversíveis em ações sem gerar direito de preferência até um determinado limite de capital social autorizado.

Segundo Vianna, ao emitir um bônus conversível em ação, a empresa terá também de oferecer uma debênture conversível para seus acionistas atuais. Poderá fazer isso antes da emissão do título conversível ou lidar com a questão no momento no qual a conversão do papel em ação se tornar possível. Os bancos consideram que todo o processo de obtenção de autorizações na CVM é moroso e acaba dificultando emissões que precisam ser feitas repentinamente, aproveitando janelas de oportunidade no mercado externo que hoje duram poucos dias senão horas.

Nos títulos obrigatoriamente conversíveis emitidos pela Vale do Rio Doce em junho do ano passado, a empresa resolveu a questão do direito de preferência conseguindo autorização da CVM para usar na conversão as ações de posse de sua tesouraria. Não se tratava, portanto, de emissão nova. Já na transação do Banco Espírito Santo que aconteceu em janeiro deste ano foram usadas ações do Bradesco que o banco português tinha em carteira. Não houve emissão, também. Os papéis do BES têm vencimento em 2011 e a operação foi liderada pelo Goldman Sachs, pelo Morgan Stanley e pelo próprio BES. Já os papéis da Vale, de conversão obrigatória em ações no dia 15 de junho de 2010, foram vendidos com juros de 5,50% ao ano, sob a liderança do Citigroup e do JP Morgan.

No caso da Infinity Bio-Energy, com sede em Bermudas e listada em Londres, são usadas ações no exterior, mas que seriam "espelho" das lançadas no Novo Mercado da Bolsa de Valores de São Paulo por meio de emissão pública inicial de ações, que ainda não aconteceu, no entanto. Uma ação poderia ser convertida na outra. Os títulos da Infinity vencem em novembro de 2011 e vão pagar juros de 11% ao ano. Os títulos foram vendidos para um grupo de 12 fundos estrangeiros, sob a liderança da americana BCP Securities.

A Vale e o BES não usaram as ações negociadas na Bovespa, mas sim os ADRs, recibos representativos de ações de empresas não-americanas emitidos e negociados nos Estados Unidos. Isso facilita o processo de conversão para o investidor externo. Mas, tem um custo e estrutura complexa para a empresa emissora. Ações negociadas na Bovespa também poderão ser usadas, explica Vianna. Nesse caso, se o investidor quiser converter os papéis em ação, terá de ingressar com os recursos no país. Poderá fazer isso de forma simples, por meio do Registro Declaratório Eletrônico de Investimento Externo Direto, mas terá de pagar 15% sobre os ganhos de capital (25% se vier de paraíso fiscal). Pode entrar também por meio da resolução 2689, que regulamenta os investimentos em Bolsa, sem pagar Imposto de Renda. Mas, terá de abrir uma conta no país e ter uma corretora local. "A burocracia é maior por meio da 2689, mas muitos investidores estrangeiros já tem essa estrutura montada para operar na Bolsa de Valores de São Paulo", diz Vianna.