Título: Appy discute proposta com deputados
Autor: Izaguirre , Mônica
Fonte: Valor Econômico, 18/04/2008, Política, p. A8

Bernard Appy: a proposta não torna o sistema menos regressivo, mas é necessária para que se chegue a isso A reforma tributária vai remover, se aprovada, um dos principais obstáculos políticos à criação de um sistema de impostos federais socialmente mais justo, que dê mais ênfase à tributação sobre a renda do que à tributação sobre o consumo e a produção. A avaliação foi feita ontem pelo secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, durante audiência na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) da Câmara dos Deputados.

Ao substituir contribuições sociais pelo futuro Imposto sobre Valor Adicionado Federal (IVA-F) e por um novo Imposto de Renda, a reforma incluirá na base de partilha com Estados e municípios todos os tributos federais, com exceção dos regulatórios e contribuições específicas da Previdência. Na opinião de Appy, "isso abre enorme espaço para reduzir a regressividade do sistema", cujo debate "deixa ser contaminado" pelas preocupações com o impacto sobre a partilha. Em outras palavras, admitiu, ficaria mais fácil para o governo federal, na hipótese de ser essa a opção, transferir para as mais diferentes formas de renda (lucros, juros de aplicações financeiras, ganhos com ações, aluguéis, salários, por exemplo) parte da tributação hoje incidente sobre produção e consumo de bens e serviços.

Os impostos indiretos, que incidem sobre o preço de bens e serviços, são socialmente regressivos, reconheceu Appy, porque tributam proporcionalmente mais quem tem menos. Quanto menor a renda de quem adquire esses produtos e serviços ao final da cadeia, maior o peso relativo dos impostos sobre ela. Já a tributação que atinge a renda diretamente é considerada socialmente mais justa, porque tira mais de quem pode mais.

O governo não precisa de uma reforma em nível constitucional para aumentar a participação de impostos diretos e reduzir o peso dos indiretos em sua arrecadação. Bastaria calibrar alíquotas, com elevações de um lado e reduções de outro, o que pode ser feito por legislação infraconstitucional. O problema é que o atual sistema de partilha é um desestímulo fiscal e político a esse tipo de iniciativa. Dependendo dos tributos envolvidos, as perdas e ganhos decorrentes da calibragem de alíquotas não são proporcionalmente distribuídas de forma igual entre União, Estados e municípios.

Combinar aumento de Imposto de Renda (IR, já partilhado) com redução da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins, não partilhada), por exemplo, representaria ganho para Estados e municípios mas geraria perda para a União, na hipótese de buscar-se efeito neutro sobre a arrecadação total. Já um aumento da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL, não partilhada) combinado com redução de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI, partilhado) seria perda certa para Estados e municípios e possível ganho para a União. Com a reforma, a conta da redução da regressividade afetará todos da mesma forma.

Bernard Appy entrou na discussão sobre regressividade ao responder a críticas contra a proposta de reforma. Também convidado como palestrante, o economista Fernardo Gaiger Silveira, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), destacou que a "reforma não mexe na regressividade do sistema tributário", o que foi reforçado pelo deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE).

O representante do Ministério da Fazenda concordou. De fato, disse Appy, a proposta de emenda constitucional, em si, não torna o sistema menos regressivo. Mas, em seguida, destacou que ela é um passo necessário para que se faça isso por intermédio de leis, posteriormente.

Durante a audiência na CAS, o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS) distribuiu nota técnica do Instituto de Estudos Sócio-Econômicos (Inesc) mostrando que a tributação sobre consumo e produção responde, em 2008, por 51,41% da estimativa de arrecadação federal. Já a tributação sobre a renda representa 39,05%.

Perondi criticou o fato de o governo não ter levado em conta a extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), ao definir a parcela do IVA-F, do IR e do IPI a ser vinculada a despesas com seguridade social. Se a parte dos gastos que era financiada pela CPMF fosse considerada, a vinculação teria que ser de 44,6% e não de 38,8%, pelos cálculos de Elias Antônio Jorge, representante do Ministério da Saúde na audiência pública da CAS.

Bernard Appy explicou que a opção do governo foi manter o mesmo nível de vinculação proporcionado pelas contribuições a serem substituídas pelo IVA-F (Cofins) e pelo IR (CSLL).